Paralelo à Mostra Competitiva de Curtas-Metragens, o Close – Festival Nacional de Cinema da Diversidade Sexual apresentou também uma seleção paralela, a Panorama, com alguns destaques do circuito internacional. Percebe-se aqui uma diferença de qualidade, não apenas técnica, mas também narrativa nas produções.
Um dos grandes destaques é o documentário americano What Do You Know? Six to twelve year olds talk about gays and lesbians, de Ellen Brodsky. Como o próprio título já revela, a temática aqui é uma entrevista com crianças de seis a doze anos sobre o que elas sabem do mundo gay. O trabalho foi realizado em escolas de ensino fundamental do Alabama e de Massachusetts, nos EUA. A estrutura é convencional, com perguntas feitas aos pequenos e suas respostas, sem grandes recursos estéticos. E, neste caso, menos é muito mais. A profundidade das respostas dos jovens é de deixar qualquer adulto perplexo. De uma bela forma, diga-se. Os pequenos contam como ouviram pela primeira vez palavras como “gay”, “homo”, “lésbica”, “bicha” e afins e como adultos e outros colegas falavam – e o pior, porém sejamos realistas – ainda falam nos termos com conotação negativa.
O interessante deste trabalho é que a maior parte dos entrevistados tem algum homossexual na família ou conhece alguém de “sexualidade diferente” na sua comunidade. Desde a garota com dois pais como o menino com um par de mães, ao rapaz que quer tratar o casamento de sua prima com a namorada da forma mais natural possível, ou ainda a alusão a celebridades assumidas, como Ellen DeGeneres. Todas estas crianças conhecem alguém, de forma direta ou indireta, e sabe como o preconceito pode afetar estas pessoas.
Apesar da maturidade dos pequenos entrevistados, é triste constatar que o papel dos professores parece ser quase nulo na questão de como tratar a sexualidade em salas de aula. Pelo relato dos pequenos fica claro que os docentes, de forma geral, não tem a menor ideia de como abordar o assunto. Não vamos muito longe se pensarmos no ridículo escândalo com o qual o “kit gay” foi tratado – e rechaçado – nas escolas do Brasil.
Provavelmente o filme mais arrebatador dessa mostra seja o menor deles. It’s Consuming Me é uma produção alemã de Kai Stãnicke com duração de apenas três minutos e que tem uma estrutura que mais parece um videoclipe. A edição atemporal é marcada por palavras ao som de uma batida eletrônica. A união com as imagens remete a uma relação que já acabou e, como sugere o título, está consumindo um dos rapazes, que não para de pensar no ex. Porém, nos últimos segundos começamos a questionar se aquele relacionamento realmente existiu, se o garoto lacrimoso foi traído ou se a menção de uma terceira pessoa no final sugere que, na verdade, tudo não passa de um amor platônico em que tudo foi imaginado.
A bela fotografia com a sugestão de símbolos, como um pássaro morto e um telefone antigo no meio da floresta, podem embasar ainda mais esta teoria da paixão obcecada. Afinal, um objeto de comunicação praticamente inexistente nos dias de hoje (um aparelho telefônico dos mais convencionais, em que era necessário “rolar” a discagem) pode revelar que o rapaz nem conhecesse sua paixão e sequer tenha alguma vez dado um simples “oi” para ela. O mesmo pode ser dito do pássaro morto com a asa quebrada, que mais parece remeter ao vôo frustrado deste amor que nunca bateu asas. Se estivesse na competição, certamente minha torcida iria para esta produção. É um curta com personagens gays, mas que não perderia sua força se fosse hetero, bi, trans, ou qualquer outro “sexual” que seja. O que interessa aqui é a perda do amor, não interessa qual forma ele assuma.
Um amor que pode ser trágico, como é o caso da ficção americana Teens Like Phil, de Dominic e David Rosler. Se não bastasse o constante bullying por qual o personagem-título passa todos os dias na escola, ele ainda é apaixonado por um dos jogadores de futebol americano da instituição. O detalhe é que esta paixão é correspondida, mesmo que escondida num parque e com uma rejeição do próprio Phil.
Ao levar o “amigo” para este local, conhecemos um pouco do tio gay de Phil, que está sempre atirado na grama, drogado, ressentido pelo seu passado escondido e condenado pela família. O problema é que a história parece querer se repetir com Phil, já que o fardo de lidar com uma homossexualidade não desejada parece ser demais para ele. Detalhe para a menção que sua professora faz ao deus greco-romano de duas faces Janus. Enquanto uma olha para o passado, outra vira os olhos para o futuro. E é no presente que o personagem principal não sabe o que fazer com sua vida.
Outras relações complicadas são tratadas no sueco Alle Werden, de Piet Baumgartner. Em uma festa, Samuel conhece e se apaixona pelo jogador de badminton Philippe, que parece (querer) ter tido algo no passado com Andreas, o melhor amigo de Samuel. Apesar de não ser muito bem estruturada, a história revela um olhar sincero sobre paixões jovens e fugazes.
Sob a mesma vertente temos o americano Out Of Bounds, de Nicholas Paul Ybarra. É no subúrbio onde se passa a história de Rose, uma garota que não consegue se assumir para a mãe preconceituosa (uma legítima housewive dos anos 1950) e quer ir embora com a namorada Samy, vendedora de uma loja de discos. Aqui temos a velha história da mãe que rejeita a filha por conta de sua sexualidade, mas tratada de uma forma realista, apesar de não fugir do lugar-comum.