Natural que, após a aclamação internacional de Drive (2001), a parceria seguinte entre o diretor Nicolas Winding Refn e o ator Ryan Gosling fosse cercada de expectativas. Apenas Deus Perdoa (2013) estreou em Cannes, provavelmente o mais prestigiado dos festivais de cinema, e teve recepção fria, para não dizer completamente negativa. Acusado por uns de mero exercício estilístico, sem maiores méritos, o filme foi bem mais apedrejado do que celebrado, verdade seja dita. Contudo, há (ainda bem, sempre há) o outro extremo, os que percebem, sobretudo na violência de Apenas Deus Perdoa, um trunfo poderoso com o qual Refn cria outra obra interessante, mescla de gêneros, homenagem cheia de personalidade ao próprio cinema. Aqui no Papo de Cinema não foi diferente, o longa polarizou opiniões, dividiu críticos entre os que gostam e os que desgostam, mostrando o quão difícil é vê-lo indiferente. Então, para ampliar a conversa, convidamos Conrado Heoli e Robledo Milani para uma discussão. O primeiro se incumbe de apontar os pontos falhos e, assim, junta-se à maioria descontente. Já o segundo delineia o lado positivo, ou seja, vai contra a maré. Confira!
A FAVOR :: “Uma legítima obra de arte, em que cada vislumbre permite encanto absoluto”, por Robledo Milani
Em muitos casos, é difícil encontrar equilíbrio entre forma e conteúdo. São inúmeros os exemplos em que um exagero na estética significa também um desprezo por um roteiro mais elaborado. Felizmente, não é o caso de Apenas Deus Perdoa, o segundo e poderoso encontro entre o diretor Nicolas Winding Refn e o astro Ryan Gosling. Após o muito bem sucedido Drive (2011), longa sem concessões que atingiu uma parcela significativa do público, os dois se reúnem novamente investindo no radicalismo, em uma história de vingança com elementos clássicos. Estamos no submundo do crime de uma Bangkok que evoca um estilo de confusa decadência. Após o assassinato do irmão, Julian (Gosling) é enviado pela mãe, Crystal (uma assustadora e hipnotizante Kristin Scott Thomas), para limpar o nome da família e encontrar o assassino – ainda a morte tenha sido justa e o verdadeiro culpado seja a própria vítima! E se o texto tem energia suficiente para prender a atenção do espectador, está na magnetizante e econômica atuação do protagonista, que faz uso de menos de 50 palavras em todo o filme, o grande diferencial da produção. Apenas Deus Perdoa é uma legítima obra de arte, daquelas de se olhar com admiração, pois cada vislumbre permite uma maior profundidade de entendimento e, consequentemente, encanto absoluto.
CONTRA :: “Violência gratuita, narrativa rasa e elenco zumbificado”, por Conrado Heoli
Depois do cultuado Drive (2011) as expectativas eram altas quanto ao novo trabalho do cineasta dinamarquês Nicolas Winding Refn, ainda mais para aqueles que já sabiam do que o diretor de Bronson (2008) e da visceral trilogia Pusher (1996 – 2005) era capaz. Com Ryan Gosling mais uma vez como protagonista, Apenas Deus Perdoa foi esnobado por crítica e público, que em geral não se deixaram levar pela sanguinolência gratuita, trilha eletrônica insistente e performances zumbificadas de um elenco desperdiçado. Não bastassem tais inconsistências, Refn ainda aposta numa narrativa rasa para uma jornada de vingança, apresentada a partir de uma errática estética que sequer funciona como exercício de estilo. Por fim, o que se sobressai em Apenas Deus Perdoa não é choque ou imoralidade, mas o tédio e a decepção de uma produção que descarta qualquer oportunidade de ser transformada numa obra excepcional. Nem deus perdoa Refn, Gosling ou este enfadonho filme.
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