Vencedor da Palma de Ouro no prestigiado Festival de Cannes deste ano, Azul é a Cor Mais Quente (2013) é um dos destaques entre os filmes em cartaz no Brasil. Baseado livremente na história em quadrinhos de Julie Maroh (roteiro e desenhos), o filme narra o amadurecimento sentimental de Adèle, menina do colegial que logo se vê apaixonada por Emma, mulher de cabelos azuis e estudante de Belas Artes. Muito tem se falando das fortes cenas de sexo, e elas são realmente bastante explícitas. Mas, para além da polêmica (esta senhora intrometida que teima em se fazer mais vistosa que os demais), o longa do franco-tunisiano Abdellatif Kechiche, em seus expressivos 179 minutos, se impõe pela forma como registra o crescimento de Adèle mediado por um grande amor. Azul é a Cor Mais Quente assumiu o posto de filme-blindado da temporada, ou seja, aquele que angaria muito mais elogios do que críticas negativas. Como toda unanimidade é burra, saudável que se relativizem alguns superlativos utilizados por aí para definir o filme. Para enriquecer o debate, no Confronto da semana, Robledo Milani faz às vezes de advogado do diabo, enquanto Willian Silveira defende a realização de Kechice. E você, o que acha de Azul é a Cor Mais Quente? Confira e comente.
A FAVOR :: “O filme providencia-nos o restauro da experiência e a amplitude máxima do que se pode transmitir sem contaminação”, por Willian Silveira
Este é um parágrafo desnecessário e desinteressante – inútil – nascido junto às críticas previstas de antemão. Nada tem a dizer sobre a duração do filme; nada tem a dizer sobre as cenas de nudez e seus supostos excessos; nada tem a dizer sobre a diluição do clímax; nada tem a dizer sobre a construção dos personagens; nada tem a dizer sobre o rosto de Adèle. Nada tem a dizer além da singela afirmação – proferida quase em tom de súplica [desta vez, pelo menos desta vez, implora, acreditem] – de que tudo está em seu lugar. O cinema em Azul é a Cor Mais Quente providencia-nos o restauro da experiência e a amplitude máxima do que se pode transmitir sem contaminação. O acontecimento é mínimo. Na tentativa de realizar o que sucede, inflacionamos e distorcemos. Não o filme, que se permite encontrar, por um ínfimo momento, aquilo que as coisas realmente são quando não nos intrometemos – parte íntima do mistério. Quem sente com sinceridade, já compreendeu; quem muito quer compreender, esqueceu-se de Adèle.
CONTRA :: “Sem novidades, a sessão termina com mais bocejos do que revelações”, por Robledo Milani
Uma coisa é preciso concordar: o título nacional é mais apropriado do que o original. Afinal, a trama só esquenta quando a ótima Léa Seydoux – a tal garota de cabelos azuis – está em cena. Durante o resto do tempo – e ele é enorme, visto que estamos falando de um longa de três horas – tudo o que temos é a insossa Adèle Exarchopoulos fazendo o que toda garota de sua idade faz – vai a escola, come massa à bolognesa, namora, come chocolates, sai com amigos, come mais um pouco. O que conhecemos de cor e salteado, sem nada de relevante. O excesso de planos fechados do diretor Abdellatif Kechiche força uma intimidade artificial que não se sustenta, ao mesmo tempo em que outros exageros – como a sequência de dez minutos de sexo lésbico explícito – provocam mais estranhamento do que encanto. O choque é gratuito, assim como quase tudo que se desenrola em cena. Os gêneros não fazem mais sentido, hoje em dia todo mundo gosta de todo mundo – mas ainda há espaço para homofobia, preconceito, avaliações precipitadas. Assim é, desde que o mundo existe, e muito provavelmente continuará sendo. E sem novidades, a sessão termina com mais bocejos do que revelações.
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