Baseado em fatos de repercussão internacional, Capitão Phillips (2013) narra o sequestro do navio Maersk Alabama por quatro piratas na costa da Somália em 2009. É dirigido por Paul Greengrass, britânico cujo trabalho se caracteriza pela utilização incessante da câmera na mão e por ampliar a tensão através da montagem. Curioso perceber, três dos últimos filmes do diretor, Voo United 93 (2006), Zona Verde (2010), e agora Capitão Phillips, se preocupam não apenas com fatos isolados, mas, de alguma maneira, com a intervenção política/bélica americana no mundo e suas consequências (o 11 de setembro, a atividade militar no Iraque e a revolta das nações oprimidas por Tio Sam, respectivamente). O longa em cartaz foca o rapto de Phillips, personagem interpretado por Tom Hanks, e, sobretudo seu embate com Muse (Barkhad Abdi), isso enquanto a Marinha intervém para resolver o incidente de proporções midiáticas e, por que não, geopolíticas. Para debater sobre Capitão Phillips, chamamos à proa Dimas Tadeu e Robledo Milani, cada qual com seus argumentos de o porquê a nova realização de Greengrass merece ou não nossa atenção. Confira, e não deixe de comentar.
A FAVOR :: “Tom Hanks é perfeito para viver o homem comum forçado a tomar atitudes inesperadas”, por Robledo Milani
Tom Hanks foi um dos maiores astros do final do século XX. Não bastasse os dois Oscar conquistados, estrelou campeões de bilheteria e sucessos de crítica. Essa boa fase se encerrou há exatos dez anos, e desde então tem marcado presença em trabalhos subestimados, thrillers populares, porém vazios de boas ideias, e se envolvido em projetos mais autorais. Por isso que é muito bom revê-lo, finalmente, depois de uma grande estiagem, à frente de um filme bem sucedido em todos os aspectos, tanto junto ao público como também na repercussão entre os especialistas. Como o protagonista de Capitão Phillips, o eterno Forrest Gump mostra-se novamente perfeito para viver o herói inesperado, o homem comum forçado a tomar atitudes extraordinárias. Sua entrega é tamanha que facilita a identificação com o espectador, num processo tão impressionante de sublimação de seu status de estrela que chegamos a esquecer quem está ali diante das câmeras. A partir de então, tudo o que fazemos é embarcar nessa história muito bem construída por Paul Greengrass, um cineasta acima da média. O fato de ser baseado numa história real é apenas um detalhe a mais que serve para tornar essa obra realmente inesquecível.
CONTRA :: “É um filme sem propósito”, por Dimas Tadeu
Seria injusto caçar defeitos técnicos em Capitão Philips. Embora não seja um vigoroso destaque em nenhum quesito, fotografia, montagem, direção e roteiro são redondinhos e bem feitos. Tem inclusive a melhor atuação de Tom Hanks em muito tempo, talvez de sua carreira (Oscar à vista, o que faz do filme A Dama de Ferro, de 2011, desta nova temporada). Mas Capitão Philips não pode se safar de um fato cabal: é um filme e, como tal, deveria ter um propósito. Exceto se o propósito for fazer o espectador odiar (fortemente) somalis e desejar a sua morte, é difícil achar outra razão pra essa história ser contada. Aliás, é difícil entender porque os produtores consideram que a história seja interessante para qualquer público que não seja homem, branco, americano e heterossexual. Greengrass até tenta dar uma humanizada nos seus antagonistas em certa altura, mas soa mais como mea culpa do que como algo que pertença ao roteiro. Se a única justificativa era “contar a história”, livros e até documentários estão aí para isso. Usar o aparato (e a dinheirama) de ficção pra enfadar o público por mais de duas horas é que é de doer.