O cineasta James Gray não é afeito ao óbvio. É só assistir ao genial Amantes (2008) para ver que sua narrativa não é nem um pouco convencional, ainda mais quando o assunto é uma história de amor. Seu filme mais recente, Era Uma Vez em Nova York, relata a história de uma imigrante polonesa (Marion Cotillard) que precisa se sujeitar a trabalhar com um cafetão (Joaquin Phoenix), ao mesmo tempo em que se envolve com um mágico (Jeremy Renner). O longa pode ter ares épicos sobre a saga dos imigrantes europeus nos EUA e até cair no melodrama em algumas situações. Porém, a natureza do cineasta permanece intacta. Ou será que não? Para confrontar as idéias sobre esta nova empreitada, uma dupla de editores do Papo de Cinema resolveu colocar seus argumentos em xeque. Robledo Milani defende enquanto Marcelo Müller ataca o filme. Confira e dê sua opinião também.
A FAVOR :: “Um filme belo, emocionante e sofrido, como poucos da atual temporada”, por Robledo Milani
Ainda que tenha, infelizmente, passado desapercebido pelo público e pela crítica – faturou pouco mais de US$ 2 milhões nas bilheterias norte-americanas e obteve a maioria das avaliações positivas, porém poucas esfuziantes – esse drama histórico encaixa-se perfeitamente dentro da filmografia de James Gray, um dos cineastas mais subestimados da atual Hollywood. Esteta de visual e temática, o diretor abandona os cenários contemporâneos, porém permanece fiel aos elementos que são mais caros, como personagens profundos, repletos de nuances, e histórias complexas e de profundo teor humano. Joaquin Phoenix continua marcando presença como seu amuleto pessoal – este é o quarto filme dos dois juntos – mas a estrela é a francesa Marion Cotillard, que tem aqui, muito provavelmente, seu melhor personagem já defendido nos Estados Unidos. Completa o trio de protagonistas a revelação Jeremy Renner, sempre contrapondo com eficiência energia e carisma pessoal. A sina dos imigrantes europeus em busca de melhores condições de vida no novo continente na virada do século XX ganha um olhar melancólico, ainda que dono de uma postura muito particular a respeito da esperança que devemos ter pelos dias que virão – e as mudanças que trazem consigo. Um filme belo, emocionante e sofrido, como poucos da atual temporada.
CONTRA :: “Um passo perigoso, um desvio de James Gray em direção à auto importância” por Marcelo Müller
James Gray é um dos grandes cineastas americanos da atualidade. Filmes como Fuga para Odessa (1994), Caminho sem Volta(2000) e, principalmente, Os Donos da Noite (2007), deixam clara a relevância do trabalho desse artista que, guardadas as devidas proporções, lembra muito Francis Ford Coppola pela visão similar da família como organela principal da sociedade, de onde partem as alegrias e as agruras. Contudo, seu mais recente filme, o esperado Era Uma Vez em Nova York, embora passe muito longe de ser um filme ruim, é ligeiramente menor se comparado aos seus antecessores. Há uma potência evidente no retrato dos imigrantes na América e mesmo na dinâmica entre os personagens, feita de relações de poder, dominação e consequente subjugação do outro. Contudo, talvez a pegada melodramática de Gray neste filme, por meio da qual carrega tudo com tintas um tanto quanto saturadas, ou seja, fugindo de seu registro habitual, faça com que algumas coisas soem encenadas demais, pouco orgânicas. Há os bons, os maus e os que sofrem, sobrando assim espaço diminuto para demais matizes, elas que surgem, ao certo, mas apenas como fagulhas. Talvez uma revisão mude essa impressão (algo comum), mas à primeira vista Era Uma Vez em Nova York me pareceu um passo perigoso, um desvio de James Gray em direção à auto importância.
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