Há certas coisas que acontecem todo ano. A estreia de pelo menos um filme de Woody Allen é uma delas. Mesmo beirando os 80 anos, o cineasta nova-iorquino, conhecido pela verve cômico-neurótica, não parece muito a fim de desacelerar esse ritmo que vem mantendo desde sua estreia nos anos 1960. Prova disso é a chegada de Magia ao Luar (2014) aos cinemas. Recebida com frieza pela crítica americana, a trama do mágico cético e arrogante (Colin Firth) contratado para desmascarar uma vidente (Emma Stone) vem dividindo opiniões aqui no Brasil. Ambientado no sul da França, nos anos 1920, Magia ao Luar é, para alguns, só mais um filme de Woody Allen, daqueles feitos no piloto automático, enquanto para outros é a prova de que o cineasta continua em grande forma. Aqui no Papo de Cinema também houve divergência. Então, para o Confronto da semana, chamamos os críticos Marcelo Müller e Willian Silveira, respectivamente defensor e atacante de Magia ao Luar. E você, de que lado está? Confira e não deixe de opinar.
A FAVOR :: “Há algo bastante substancial, que faz o filme escapar do ordinário”, por Marcelo Müller
Woody Allen é um dos meus diretores favoritos, gosto até de seus filmes mais fracos (exceção feita a um ou dois que realmente não descem). Portanto, dá para colocar um pouco disso na conta de meu apreço por Magia ao Luar, sua mais recente realização. Entendo quem não goste da verborragia (aqui ainda mais onipresente), de algumas pontas que parecem se ligar como que por mágica mesmo, mas, ora, há algo muito substancial, principalmente nas idas e vindas existenciais do personagem de Colin Firth – aliás, que baita atuação a dele. Woody Allen mais uma vez desconcerta um protagonista certo demais das coisas da vida, mostrando-lhe por linhas retas e tortas alguns mistérios que escapam da nossa vã filosofia. E como não rir daquele herdeiro almofadinha – evidência do ridículo burguês, outra constante do cinema de Allen – que vive a fazer serenatas para a vidente por quem está apaixonado? Magia ao Luar pode não ser um dos melhores filmes recentes de Woody Allen (para mim não é mesmo), mas certamente há algo ali que o faz escapar bastante do ordinário.
CONTRA :: “Resumo preguiçoso das preocupações temáticas do diretor”, por Willian Silveira
Nunca assisti a um filme ruim de Woody Allen. A essa altura da carreira, a ideia me parece tão improvável quanto esperar algo ruim de um grande escritor (pensemos em Philip Roth, para continuar no registro dos judeus ateus). Em todos casos, a preocupação é irrelevante. Há muita gente ocupada em realizar coisas ruins por aí. O que deve ser dito é que vi filmes irregulares, fracos e menores – entre eles alguns de Allen. Magia ao Luar é um exemplo. A comédia romântica entre um cético e uma otimista é o resumo preguiçoso – feito por um colegial prestes a reprovar – das preocupações temáticas do diretor. Em termos estéticos, Allen nunca tinha sido tão displicente ao filmar. Os filmes costumam se passar em lugares interessantes (nada de Detroit ou Maine) para usar a mitologia dos locais ao seu favor. Foi assim em Nova York, em sua Manhattan; na Rússia czarista; na Barcelona de Gaudí; na Paris artística; na Roma gastronômica e operística. Em Magia ao Luar, a região escolhida foi Provença, ao sul da França. O uso do local, porém, é irrisório. O conjunto de cenas à la guia de turismo servem para encobrir o roteiro frágil e descuidado, repleto de diálogos expositivos, muitos sem naturalidade. Pelos poucos momentos inspirados, quem parece ter aproveitado a região francesa foi a criatividade de Woody Allen – de férias.