O Amor é Estranho chegou aos cinemas brasileiros em 2015, após uma bem-sucedida passagem pelo Festival do Rio no ano passado. À frente do elenco, dois pesos-pesados: Alfred Molina e John Lithgow. Eles interpretam um casal homossexual em dificuldades financeiras (decorrência da intolerância e do preconceito) após oficializar sua união de quarenta anos. Ira Sachs, o diretor, evidencia o amor dos personagens, a ternura do sentimento que os une mesmo frente às adversidades, enquanto mostra o caminho tortuoso que eles tomam, separadamente, em moradias provisórias. De um lado, muita gente aplaude a abordagem corajosa e destituída de estereótipos. Já de outro, há quem não veja motivos para tanto alarde, e ache tudo parte de um convencionalismo mal disfarçado. E você, o que acha de O Amor é Estranho? No Confronto da semana, os críticos Marcelo Müller e Matheus Bonez debatem prós e contras do longa. Confira.
A FAVOR :: “Um dos filmes mais deliciosos e inteligentes do ano até agora”, por Matheus Bonez
O título do filme pode levar a uma interpretação errônea, como se o tal amor estranho fosse o do casal gay interpretado brilhantemente por Alfred Molina e John Lithgow. O arco principal se desenrola após o casamento dos dois, o que leva à demissão de George (Molina) e a consequente dura decisão de terem que viver separados por um tempo com parentes e amigos para pagar as contas. Aí que reside o tal amor do título. Não é apenas com a separação física que George e Ben (Lithgow) precisam lidar, mas com o fato de poderem estar prejudicando seus outros relacionamentos ao “atrapalhar” a vida dos demais, ocupando tempo e espaço fora de seus ambientes. Essas crises emocionais são uma expansão das dificuldades da sociedade norte-americana e da recessão, com a oferta de empregos em baixa e o mercado imobiliário com valores cada vez mais altos. Afinal, para onde ir? O roteiro do diretor Ira Sachs em parceria com o brasileiro Maurício Zacharias é extremamente habilidoso ao retratar a situação política e econômica do país através daquele microcosmo tão peculiar. Tanto faz se o casal é homo, hetero ou qualquer coisa sexual. O mote principal não é discutir homofobia internalizada (e mesmo este ponto é tocado), e sim como uma situação financeira instável pode afetar a vida íntima de cada um e daqueles que lhe querem bem. Com palavras tão sagazes aliadas a uma boa direção e, especialmente, um elenco tão afiado, O Amor é Estranho acaba se tornando, facilmente, um dos filmes mais deliciosos e inteligentes do ano até agora.
CONTRA :: “Um todo bastante anêmico e melhor nas frações”, por Marcelo Müller
O grande trunfo de Ira Sachs em O Amor é Estranho está no relacionamento dos personagens de Alfred Molina e John Lithgow, eles que decidem oficializar a união depois de quase quarenta anos juntos. Bem por isso, o filme perde muito de sua força e acaba à deriva quando um problema os separa momentaneamente. No começo, essa distância traz à tona problemas relevantes de convivência com os parentes, além das bem colocadas dificuldades da terceira idade. No que parece uma jogada deliberada, o casal protagonista passa a ter pouco contato, enfrentando, cada um à sua maneira, os transtornos da moradia improvisada, de tomar parte de rotinas que não são bem as suas. Quando há os reencontros esporádicos, o longa volta aos eixos, pois é nessa dinâmica que se instauram com propriedade os temas subjacentes ao que ocorre na superfície. A distância entre eles consegue apenas evidenciar a fraqueza do restante, a falta de consistência dos demais personagens e das situações que eles provocam. Sachs, por exemplo, chama atenção demais às suspeitas que recaem sobre um menino, espécie de caminho alternativo que leva ao encerramento um tanto adocicado demais, além de forçado. Quando Molina e Lithgow estão em cena, O Amor É Estranho aspira à grandeza pela sensibilidade. Momentos de exceção num todo bastante anêmico e melhor nas frações.
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