Fosse uma Copa do Mundo corriqueira, França e Argentina não teriam muitos problemas para passarem à próxima fase do torneio, jogando contra Nigéria e Suíça. Só pela mística da camisa, teriam seu passaporte carimbado. No entanto, foram tantas as zebras e muitas seleções com tradição que já sucumbiram nesta Copa no Brasil que não é possível dar nenhum resultado como certo. Portanto, o escrete francês – que mostrou ótimo futebol na primeira fase – e a seleção argentina do craque Messi terão de ter cuidado nesta nova fase. Afinal de contas, um tropeço pode representar um adeus precoce. E na Copa de Cinema? O desafio dos editores do Papo de Cinema foi escolher longas-metragens à altura dos países jogando o Mundial. E, de acordo com a lista abaixo, o objetivo foi alcançado. Confira!
FRANÇA x NIGÉRIA
Se na primeira fase, Godard e seu Acossado (1960) foram os representantes da França nesta Copa de Filmes, para as oitavas-de-final vamos escalar outro pilar da nouvelle vague: Truffaut e seu Os Incompreendidos (1959). O filme é protagonizado por Antoine Doinel, alter ego do diretor, garoto que não se adequa à escola, assim como também se percebe deslocado no seio familiar degradado por traições, dissimulações e falta de afeto. Doinel só encontra alforria na rua, local de descobertas e da livre exploração de um mundo que tratará de lecionar a ele algumas coisas valiosas. Abandono dos pais, opressão do sistema, tudo conspira para que ele não chegue a lugar algum e, no fundo, baseado em suas próprias vivências, Truffaut com este filme nos diz que as engrenagens que movem a máquina por vezes só tratam de massificar e apequenar algumas ambições pessoais. Fugir pode ser a solução, correr para a contemplação das torrentes do amplo mar que se desnuda frente às nossas expectativas pode ser o caminho para essa liberdade que tanto almejamos. Com um clássico como este, tem como não ser favorito? – por Marcelo Müller
Se encontrar um filme para representar o escrete nigeriano na fase de grupos desta Copa de Filmes já foi uma tarefa complicada, com a classificação da seleção de futebol às oitavas-de-final do certame disputado em campos brasileiros, precisamos voltar à pesquisa para pinçar outro exemplar da chamada Nollywood. Então, quem vai a campo para o mata-mata é Rattle Snake (1995), dirigido pela cineasta Amaka Igwe, aliás, ela uma das artistas locais mais reconhecidas internacionalmente. Na trama, um homem, a despeito de todo esforço, é arrastado para uma teia de crimes, num mundo controlado por gangues, em circunstâncias imprevistas que alteram o que parecia seu rumo natural longe da violência. Se no campo a seleção africana é bem organizada, tendo complicado inclusive a toda poderosa Argentina, na seara cinematográfica ainda é difícil a torcida nigeriana ter algum tipo de esperança. Neste caso, participar já pode ser considerado uma vitória e tanto. – por Marcelo Müller
ARGENTINA x SUÍÇA
A Argentina fez valer a mística de sua camiseta e conseguiu passar para as oitavas de final da Copa do Mundo 2014 com 100% de aproveitamento. A seleção dos nossos hermanos pode estar atrás no quesito de títulos de mundiais em relação ao Brasil, mas quando a história é cinema – e Oscar – a Argentina dá um banho de bola. Já possui duas estatuetas na estante. O já citado nesta Copa de Cinema O Segredo dos seus Olhos (2009) e A História Oficial (1985). Dirigido por Luis Puenzo, o longa-metragem mergulha nos anos da ditadura militar argentina, contando a história de uma professora que descobre que os pais da criança que adotou podem ser presos políticos dos anos de chumbo. Drama forte, com atuações poderosas, A História Oficial não fez bonito apenas no Oscar. Encantou as plateias do Festival de Berlim, de Cannes (de onde saiu com dois prêmios) e ainda arrebanhou o Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro. Ou seja, um longa-metragem que tem tudo para defender muito bem as cores da Argentina nas Oitavas de Final contra os pontuais suíços. – por Rodrigo de Oliveira
A Suíça não tem uma grande tradição na Copa do Mundo e nem no cinema. Ao menos, não no foco internacional. Um de seus títulos mais conhecidos – hoje talvez nem tanto por ter sido realizado há 30 anos – é Fora de Controle (1984), vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro daquele ano. O enredo, à primeira vista, é simples: dois campões de xadrez disputam o título mundial. No meio disso tudo, uma guerra psicológica para quem realiza o xeque-mate. Mas nem tudo é tão simples. A disputa não passa de uma metáfora da política em meio à Cortina de Ferro, mesmo que tenha como referência a disputa real do torneio entre Karpov e Korchnoi em 1978. A tensão promovida por esta “Guerra Fria” entre os jogadores aumenta a cada instante, ainda mais quando são mostrados os bastidores do campeonato. O vício no jogo, a vaidade em se mostrar superior ao adversário, o tempo longe de casa: todos estes aspectos podem ser interpretados de forma literal, mas também como uma metáfora ao dia-a-dia da política. A produção, então, vai além da União Soviética ou qualquer outro país, mostrando os pontos de convergência no modus operandi do mundo inteiro. Um pequeno filme, mas recheado de boas intenções que merece seu lugar nos destaque da cinematografia suíça. – por Matheus Bonez