Ainda que, inevitavelmente, sua imagem permaneça associada aos spaghetti westerns, o italiano Franco Nero sempre buscou diversificar sua carreira, aceitando papéis bastante distintos daquele do pistoleiro soturno que o consagrou no clássico Django (1966), de Sergio Corbucci. Entre os mais de 150 títulos de sua filmografia, encontram-se longas dirigidos por expoentes do cinema autoral, dentro e fora da Itália, como Luis Buñuel, Rainer Werner Fassbinder e John Huston. Tal lista inclui também a brasileira Lúcia Murat, que conduziu Nero neste drama sobre as marcas da Ditadura Civil-Militar. A trama acompanha um grupo de amigos ex-guerrilheiros, entre eles a cineasta Irene (Irene Ravache), que se reencontram em virtude da iminente morte de Ana (vivida na juventude por Simone Spoladore), o último elo entre todos os personagens. Com extrema delicadeza e lirismo, Murat trata de um tema regularmente revisitado pelo cinema nacional sob uma perspectiva bastante pessoal, entregando uma obra sincera e reflexiva, capitaneada por um excepcional elenco. Ao lado de Otávio Augusto e Zécarlos Machado, além das citadas Ravache e Spoladore, Franco Nero surge como Paolo, guerrilheiro italiano exilado no Brasil, marido de Irene, que sofre um processo de extradição em razão de um crime cometido em seu país nos anos 60. Ainda que sua participação seja pequena, o ator a torna marcante, transmitindo total credibilidade ao personagem e protagonizando cenas de grande sensibilidade, como o diálogo que mantém em sua cela com o fantasma/lembrança de Ana, expondo uma faceta dramática talvez ainda pouco conhecida por parte do público. – por Leonardo Ribeiro