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Wong Kar Wai é, sem dúvida, um dos diretores chineses mais conhecidos no Ocidente. Seu trabalho mais famoso por aqui, Um Beijo Roubado (2007), com Norah Jones e Jude Law, criou uma estética meio melancólica, colorida de neon e de bordas desfocadas, que acabou ficando como sua marca registrada desse lado de Greenwich. No entanto, com O Grande Mestre (2013), seu mais recente longa, Kar Wai volta à China e relembra suas origens, sejam as cinematográficas, sejam as étnicas.

O filme conta a história de Ip Man (Tony Leung, sempre ótimo), mestre de kung fu do sul da China que, fugindo da guerra, acaba indo para Hong Kong, onde, um dia, teria ninguém menos do que Bruce Lee como discípulo. Ou, pelo menos, deveria, de acordo com a sinopse: a trama é quase uma saga, espalhando-se pelas histórias de diversos personagens que cruzaram os caminhos de Ip Man entre as décadas de 30 e 50 do século XX.

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Mas o que se deve ter em mente é que se trata de um filme de kung fu e que os amantes dessa arte marcial (no cinema ou na vida) tem aqui um prato cheio. Não se deixe enganar pela cena de abertura, de cortes truncados (algo meio Zack Snyder ou Ridley Scott dirigindo cenas de luta) e uma ambientação que lembra demais Matrix (1999). Logo a câmera começa a dançar no ritmo das coreografias do já célebre Yuen Woo-Ping e a atmosfera se torna muito próxima da dos filmes de Zhang Yimou, ou mesmo de O Tigre e o Dragão (2000), de Ang Lee, para citar um exemplo mais conhecido.

Os belíssimos figurinos também são privilegiados pela decupagem de Kar Wai. O cineasta, ao detalhar os golpes com primeiros planos de pés, mãos, pernas e braços, também exibe bordados, sedas e detalhes que impressionarão qualquer apreciador da cultura chinesa.

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Cultura de cuja ancestralidade o diretor parece ser um entusiasta. Afinal – e este parece ser o tom principal do longa – trata-se de um filme que mostra a trajetória do kung fu que começa como arte ancestral e se torna “técnica”, “profissão”, “espetáculo”. Se para os personagens (e colateralmente para Kar Wai) a ideia não parece lá muito palatável, para a realidade ela se faz presente inclusive pela realização desta obra, que funciona como demonstração e espetáculo da cultura chinesa para o Ocidente, mantendo inclusive seu exotismo que incluem tradições familiares, bordéis luxuosos, ópio e misticismo.

A tônica parece tão forte que, inclusive, faz com que o se perca um pouco o foco na trama em si, ou seja, a trajetória de Ip Man. Se os passos do kung fu são acompanhados de perto, o mesmo não pode ser dito sobre os “do grande mestre”, que às vezes simplesmente sai de cena para dar lugar à história de Er Gong (Zhang Ziyi) , que deve ocupar boa metade do filme. Isso sem contar as sagas de mais dois ou três personagens, que se entrelaçam aos demais. O resultado é um filme truncado e que exige mais atenção do que seria necessário, especialmente dada a semelhança física entre alguns atores (Ma San, discípulo do pai de Er Gong, e Navalha, um mafioso, tem inclusive o mesmo bigode).

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No fim, O Grande Mestre é um filme visualmente requintado e com coreografias de arte marcial do mais alto nível, criando set pieces interessantes e admiráveis para quem é fã do gênero. Como filme, no entanto, confunde a si e ao público com o excesso de tramas que tenta abraçar. Um desafio que apenas os admiradores de kung fu talvez estejam dispostos a encarar.

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é jornalista, mestre em Estética, Redes e Tecnocultura e otaku de cinema. Deu um jeito de levar o audiovisual para a Comunicação Interna, sua ocupação principal, e se diverte enquanto apresenta a linguagem das telonas para o mundo corporativo. Adora tudo quanto é tipo de filme, mas nem todo tipo de diretor.
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