O mundo é um organismo em constante mutação, as pessoas evoluem, os conceitos se alteram, a moda se reinventa, o cinema vai se aperfeiçoando, a tecnologia se supera diariamente. Mas parece que a música e o espírito romântico são algumas das poucas coisas que não dão passos pra frente. É claro que eu poderia divagar também sobre o espírito humano e a ecologia, como outros exemplos que não conseguem dar passos pra frente sem dar passos pra trás, mas não é exatamente meu objetivo aqui.
Assistindo e ouvindo a trilha sonora do filme Mensagem pra Você (1997), estrelado por Tom Hanks e Meg Ryan, me dei conta daquele ponto ali de cima: a música não é mais bonita e divertida como era antes, ficamos com a sobra de um monte de conceitos misturados e hoje nos pegamos cantando pelos cantos palavras tão rasas quanto um pires e de calão bem duvidoso, envolvendo bundas, peitos, doces e muito suor… Pois bem, onde é que foram parar as letras e o romantismo com a vida? Quando falo em romantismo, me refiro ao espírito romântico mesmo, uma noção de que a vida pode ser muito mais agradável e bonita do que nos é oferecido diariamente. É a noção de que um punhado de flores pode ser o bastante pra alegrar toda uma semana, de que um raio a mais de sol pode trazer novas energias, mas também de que tudo pode se resolver com alegria ao invés do estresse.
Em Mensagem Pra Você, por mais americano e bobo que seja, somos colocados em uma história onde o espírito romântico deve sempre se sobrepor aos ideais do mundo consumista. Somos submersos por idéias de um mundo antigo, algum lugar perdido nos anos 40 ou 50, onde uma música era capaz de elevar o espírito e uma frase bem escrita em um pedaço de papel era capaz de mudar toda uma vida. Com o passar dos anos fomos deixando os livros de lado, assim como as cartas escritas e enviadas por correio, relegando a verdadeira busca pelo amor e por sonhos em prol de uma carreira, de um carro, de uma casa, de status. Enfim, combustível pro ego. Perdemos o rumo em todas as etapas da evolução. Vivemos uma fase onde mentimos pra todos e pra nós mesmos, onde uma noite não significa mais que uma noite.
Porque não podemos mais ter atos impulsivos e estúpidos pela simples alegria de um momento? Porque não dirigir até a praia para simplesmente sentir os pés na areia por um breve momento de solidão acolhedora? Talvez porque nosso tempo cronometrado nos deixe ansiosos e esperançosos por coisas que de fato nem são assim tão significativas, já que os ideais que seguimos são em grande parte pré-definidos pelo nosso estilo e meio de vida. Nesse filme, da mesma diretora do também excelente Sintonia de Amor (1993), também estrelado por Hanks e Ryan, estamos inseridos em um outro contexto: é o mesmo mundo em que circulamos diariamente, mas habitado por esses personagens adoráveis e completamente possíveis, que anseiam por uma vida menos caótica e mais romântica, onde o mundo gira na velocidade de um sorriso verdadeiro e não de um pré-fabricado. Tudo muito básico e inserido no padrão do cinema americano, mas não é isso que conta – esse é um daqueles filmes que deve fazer você se sentir bem pelos pequenos momentos, nos remetendo às fortalezas que construímos em nossas vidas particulares, aquela que somente você e mais ninguém conhece, que habita sua mente e seu coração. Onde uma música antiga é capaz de fazer os cabelos dos braços arrepiarem e o coração acelerar, uma boa xícara de café pela manhã é apreciada pelas sensações que proporciona e não para supostamente dar energia em um dia movimentado.
O fato é que esse filme quer dizer que, mesmo com os problemas que enfrentamos diariamente, as nossas batalhas particulares acabam sendo muito pequenas perto do prazer que podemos ter no final do dia se levarmos uma vida mais equilibrada, onde as flores na janela da vizinha nos trazem uma alegria profunda e nos fazem lembrar que o mundo é feito de uma infinidade de elementos, e que sem eles não somos nada. Por isso a apreciação romântica da vida é necessária, e talvez seja esse o papel de filmes como esses: nos recordar que precisamos parar pra refletir e observar. Não é difícil e é um exercício extremamente recompensador.
Assista Mensagem pra Você e Sintonia de Amor e tente olhar para o quadro maior, fora da historinha de casal. Foque no clima geral, nos ideais e na velocidade das vidas ali apresentadas – tudo tem um outro contexto. Se você não conseguir mudar esse foco eu garanto que pelo menos algumas horas agradáveis estarão no seu cardápio. Divirta-se!