Os grandes vencedores do Emmy 2020, cujo anúncio dos premiados aconteceu no último domingo, 20 de setembro, foram as séries Succession (2018-2020) e Schitt’s Creek (2015-2020), além da minissérie Watchmen (2019). Outros nomes populares, como Zendaya, Catherine O’Hara, Mark Ruffalo, Regina King e Billy Crudup, também foram premiados. Mas o que tais escolhas significam, tanto para o público norte-americano – afinal, esse é reconhecido como o “Oscar” da televisão nos Estados Unidos – como também para o espectador brasileiro, que, afinal, é onde estamos? Muito pouco, infelizmente. Ao contrário do seu irmão cinematográfico – o Oscar, que, inclusive, é apontado como referência – que consegue mobilizar multidões ao redor do mundo, e, de um jeito ou de outro, acaba tendo impacto tanto no resultado financeiro como na carreira artística dos envolvidos, o troféu da Academia de Artes e Ciências da Televisão (Academy of Television Arts & Sciences) pouca repercussão acaba gerando, seja na audiência, como também entre os produtores e realizadores. Além do brilho e do glamour de uma festa quase interminável, muito pouco sobra a respeito da qualidade das apostas que aqui são feitas.
A maior vencedora dessa temporada foi a HBO, com 30 vitórias, seguida pela Netflix (21 troféus). Além das duas gigantes, Disney+ (8), Prime Video (4) e AppleTV+ (1) foram outras plataformas de streaming que também conquistaram alguma parcela do ouro. Todas somadas, deixaram na poeira as emissoras tradicionais, como NBC, FOX, ABC ou CBS, por exemplo. Essa tendência, no entanto, não é nova, e já tem registrado turbulência até mesmo no âmbito cinematográfico. Então, nada de inédito no horizonte. Entre os programas, Watchmen foi a mais premiada (11 troféus), seguida por Schitt’s Creek (9), Succession e The Mandalorian (7 cada). A primeira foi ao ar no ano passado e era isso (não terá continuação), a segunda encerrou sua jornada na sexta temporada, a seguinte está indo para uma terceira leva de episódios (ainda sem data de estreia) e a última segue inédita no Brasil. É mais ou menos na linha: quem já viu, ótimo, e quem não viu, provavelmente não verá (ao menos não tão cedo).
O que significa Succession ser escolhida como a melhor série dramática do ano? Eram nada menos do que oito indicadas nessa categoria, e apenas uma estreante (The Mandalorian). No primeiro ano, não ganhou, agora que é notícia “velha”, finalmente foi reconhecida. Mas será suficiente para fazer que alguém que não curtiu o começo do programa mude de ideia? Entre as comédias, Schitt’s Creek, um programa que teve zero repercussão no Brasil – foi lançada apenas na tevê aberta e atualmente se encontra somente no Now, e em versão única dublada, sem o áudio original – se consagrou superando uma novata (What We Do in the Shadows), uma em despedida (The Good Place) e outras de status variado, como veteranas (Segura a Onda), que ainda merecem mais destaque (Insecure) ou já bastante premiadas (Maravilhosa Sra. Maisel). Entre as minisséries, a disputa era acirrada: Watchmen é incrível, mas seria mesmo melhor do que Mrs. America, Inacreditável ou Nada Ortodoxa? Uma briga parelha, portanto. Por fim, temos a categoria de Melhor Telefilme, que reconheceu o óbvio: Má Educação, o vencedor e único realmente digno da indicação, foi concebido para os cinemas, e somente depois destinado exclusivamente para a televisão. Os demais eram não mais do que especiais de variedades.
É importante apontar, também, as diversas escolhas questionáveis dos membros da Academia. Como assim, Jeremy Strong foi o melhor ator de série dramática, sendo que ao lado dele concorria, também por Succession, um monstruoso – e absolutamente perfeito – Brian Cox? Catherine O’Hara é tão maravilhosa que quase não dá pra reclamar que Issa Rae (Insecure) ainda não foi premiada, e é claro que Mark Ruffalo enfrentou a tortura de I Know This Much is True apenas para conquistar esse prêmio, mas o que dizer de Regina King (Watchmen) superando uma absolutamente irretocável Cate Blanchett (Mrs. America)? Bom, acredito que nada foi pior do que ver Zendaya (Euphoria) sendo considerada a melhor atriz de série dramática, à frente de Laura Linney (Ozark), Olivia Colman (The Crown), Jennifer Aniston (The Morning Show) e a dupla Sandra Oh e Jodie Comer (ambas por Killing Eve)? São apostas no popular, que deixam de lado qualquer talento artístico. Muito triste ver a que ficou reduzida uma premiação que deveria, supostamente, ter alguma relevância.
A questão maior envolvendo esse assunto é, em resumo, a pouca repercussão que essas vitórias possuem. Quem, afinal, lembra os vencedores do Emmy do ano passado? Ou de cinco anos atrás? Ou de uma década antes? Praticamente, ninguém. Outra coisa: são necessários, realmente, tantas categorias? São dezenas delas! Tanto é que, na noite de premiação oficial, são distribuídos apenas aqueles considerados “importantes”. Os técnicos, por exemplo, são revelados todos de antemão. Pra piorar, não há um “grande vencedor”, um prêmio de “melhor filme”, enfim, que aponte o “melhor de todos”. Há, no mínimo, quatro vencedores de igual importância: série dramática, série cômica, minissérie e telefilme. Claro que, assim como acontece no Globo de Ouro, os concorrentes em Drama acabam adquirindo maior destaque. Mais uma demonstração de ineficácia nesse pretenso equilíbrio. Não seria lindo se houvesse a categoria de “Melhor Programa Ficcional de Televisão”? Isso talvez resolvesse esse problema.
Independente de qualquer coisa, é emocionante ver Eugene Levy (Schitt’s Creek), Julia Garner (Ozark), Yahya Abdul-Mateen II (Watchmen), Uzo Aduba (Mrs. America), Ron Cephas Jones (This Is Us), Cherry Jones (Succession), Eddie Murphy e Maya Rudolph (ambos pelo Saturday Night Live) sendo agraciados, ainda mais por serem artistas que nunca obtiveram o mesmo reconhecimento por seus esforços na tela grande. O espectador brasileiro, no entanto, que acompanhou ávido a abertura dos envelopes, irá assistir a todos os premiados que ainda, porventura, não viu? Com um ritmo intenso de séries novas sendo lançadas todas as semanas, acho difícil. E em Hollywood, não será um Emmy que irá fazer diferença na balança na hora de fechar um contrato ou outro. É mais uma diversão, um entretenimento, assim como muito dos shows apontados. E não mais do que isso. Talvez, nesse aspecto, também não muito diferente do já citado Oscar. Mas não é essa a questão. A referência aqui é em relação a sua perenidade, ao aspecto descartável que assume, de méritos ressaltados que não duram mais do que uma temporada. Curioso, mas também facilmente esquecível.
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