E não é que o Papo de Cinema se enrolou em cabos novamente? Desta vez, fomos convidados para acompanhar as gravações de Nem Lá, Nem Cá, comédia com toques surreais que marca a estreia de Tatiana Nequete na direção de longas-metragens. A trama – estrelada por Rafael Pimenta, Renata de Lélis, Fernanda Fuchs, Emilio Farias, Adriano Basegio, Ana Paula Schneider, Cassandra Calabouço e Danuta Zaghetto – é produzida pela Druzina Content em coprodução com Bactéria Filmes e Ziriguitoon Studio. Em nome da equipe, na última semana, o assessor de imprensa Isidoro B. Guggiana nos recebeu no set montado no estúdio da Cubo Filmes, em Porto Alegre. O planejamento do dia começava com a filmagem de uma cena de plano e contra-plano entre as atrizes Renata e Danuta logo após o elevador em que Walter (personagem de Pimenta) parte em uma queda quase infinita. Afinal, será durante esses segundos de desespero que toda a trama se desenvolve. Em uma espécie de limbo ele irá se deparar com as duas em um tipo de programa de auditório, que o fará refletir sobre sua trajetória pregressa antes de ingressar num famoso reality show. Abaixo, temos ideia do que esperar da obra por conta da sinopse divulgada pelos responsáveis:
“Walter é sujeito sem emprego nem namorada, mas que acredita piamente que a próxima ocupação profissional será a melhor de sua vida (enquanto aguarda o sucesso acontecer) e que seu grande amor pode estar depois da próxima esquina. Ao ser selecionado para um reality show, ele vivencia uma escalada surrealista de acontecimentos que o coloca num limiar entre a vida e a morte”.
Um aventura pela comédia
Em conversa com a diretora, ela nos revelou que o desafio de comandar a empreitada foi feito por Luciana Druzina, uma das produtoras, que a convidou a conferir o roteiro e trabalhá-lo sob “olhar feminino”. Segundo Tatiana, o argumento, concebido por Lisandro Santos, foi sendo “atualizado” por ela com a ajuda do próprio e também do protagonista. “Eu incluí papeis femininos mais profundos e, num segundo momento, o Rafael acrescentou uma perspectiva de modelo de produção. O Lisandro acreditava que seria importante que o longa se tornasse algo como essas comédias que, em geral, possuem uma cara à frente do projeto. Assim, o Rafa incrementou o texto com seu humor crítico e inteligente que estávamos precisando”, comenta Nequete.
Ainda segundo a realizadora, ela alegou “não ser da comédia”. Sendo assim, Tatiana comentou sobre essa proposta diferenciada em sua filmografia: “a comédia tem outro timing. Na hora de pensar a direção, é importante saber quanto tempo é necessário para absorver tal cena e como vai funcionar cada sequência em termos de reação do público. Tudo está sendo bem novo, mas é desafiador pensar essas coisas”.
Em seguida, o Papo falou com os principais artistas que precisam captar essas percepções: Rafael e Renata de Lélis (que dá vida à Marta, uma figura angelical – ou seria ‘demoníaca’? – que recebe o protagonista nesse ambiente intermediário). Para ajudar o “errático” Walter, como classificado por Pimenta, ele contará com a recepção de Marta, que lhe oferece uma chance de redenção. A personagem, segundo Renata, é “uma espécie de anjo que avalia o passado de Walter e atua como um dos jurados que decidirá se ele irá para o céu ou para o inferno. Aliás, há todo um lado super cômico nesse julgamento”. “A Marta está em campo totalmente diferente de tudo o que já fiz, tanto figura como caracterização. Está sendo motivador e interessante, pois acho a comédia mais difícil de trabalhar que o drama”, revelou de Lélis.
De um polo ao outro, Pimenta discordou sobre a dificuldade com a comédia e, ainda, em tom de brincadeira, discorreu sobre identificações com o papel. “Pra mim o drama é bem mais complexo, então, aqui, estou em casa. Inclusive, talvez fosse aconselhável não estar tão em casa assim”, afirmou dando risada. “Comentei sobre o Walter e o processo de criação dele com o meu terapeuta. Para mim, ambos estão conectados e não gostaria de me ver no filme. Porém, não há jeito de separá-los, e o terapeuta concordou (risos) com as semelhanças”. Sobre mergulhar no mundo expositivo dos realities, Rafael confirmou as falas da diretora: “houve bastante espaço para trabalhar. A experiência principal do reality é exatamente sobre essa margem. De repente você é o personagem e é julgado por quem você é. Imagina? Que imagem estou passando? Como se avalia a própria vida? São questões interessantes”.
As composições de um mundo brilhante
Para construir esse contexto singular, batemos, também, um papo de cinema com Edu Rabin e Luísa Casagranda, respectivamente, o Diretor de Fotografia e a Diretora de Arte do filme. Para Rabin, o “maior desafio” foi “recriar um show de calouros com uma câmera (de cinema), enquanto um programa do gênero possui muitas outras”.
“Muitas vezes tivemos que rever a continuidade das cenas para verificar as luzes e movimentos anteriores. Isso nos exigiu bastante, o que sempre é um desafio, e por isso tive que ser metódico para funcionar”, comenta o fotógrafo. Ainda segundo Edu, tudo possui “muito brilho”, reforçando as “ideias fantásticas da trama”, direção que conversa com o trabalho de Luísa. “As expectativas da equipe eram bem altas para que conseguíssemos criar esse universo surrealista que é o limbo da história. Mais de 80% das filmagens foram feitas em estúdio. No começo, eu tinha uma planta do espaço no qual precisava trabalhar. Mas, como sempre, há imprevistos e precisamos mover cada objeto para que tudo pareça grandioso”, ressalta Casagranda.
A expansão da personagem menor
Voltando ao elenco, conversamos com a atriz Danuta Zaghetto. Na trama, ela encarna uma figura feminina, nos moldes de Lilith (vinda das mitologias Judaica e da Mesopotâmia). Originalmente, não possuía sequer nome e era “apenas a assistente”. Logo, ganhou o apelido de “Lili” e foi garantindo espaço, à medida em que a diretora foi enxergando brechas. Perguntada sobre essa ascensão, Danuta brinca: “sou atriz que sabe aproveitar”.
“É legal poder brincar com uma personagem que, ainda que menor, tem sua importância. Ao longo dos cacos (improvisações) que fui desenvolvendo, a Lili foi chamando atenção”, contou Zaghetto. Sobre a relevância dos papéis femininos no enredo, a atriz ressaltou que o essencial para o crescimento dessa ideia é a postura do próprio protagonista. “Em diversas cenas, o Walter deixa escapar algumas falas e condutas patéticas masculinas, algo que engrandece as mulheres. As torna poderosas”.
Da concepção à finalização
Por fim, Luciana Druzina e Daniela Israel, produtoras, falaram sobre a idealização e os aspectos elementares da aposta. Segundo Luciana, a primeira ideia era que tudo fosse construído como “um curta de animação”, mas, após alguns debates, o conteúdo se tornou “um projeto de longa em live action”. Contempladas com o financiamento do Edital SEDAC n° 01/2022 FAC Filma RS, realizado pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul, as produtoras contaram, como primeiro nome da equipe, com a diretora Tatiana Nequete. Como objetivo, Druzina revela que o filme busca representar as incertezas e otimismos das últimas gerações, com nortes como “o melhor emprego será o próximo” e o “próximo relacionamento amoroso pode estar na esquina”. Uma espécie de “nem lá, nem cá” que dialoga com os jovens “nem-nem” (nem estudam, nem trabalham). Sobre a composição da equipe, Daniela afirma que “o grupo é rico por contar com perspectivas de pessoas trans, não-binárias e outros membros da comunidade LGBTQIAP+. Esses foram agregando outros profissionais conhecidos que formaram um time heterogêneo que assina esse grande processo de estruturação e diversidade”.
Ainda sem previsão de estreia nos cinemas, Nem Lá, Nem Cá deverá ser lançado, simultaneamente, em mais de 30 cidades. Nos próximos meses, o projeto deve percorrer feiras e mercados, como EFM (Berlinale), Marche Du Film (Festival de Cannes), Industry Days (Festival de San Sebastián) e VentanaSur (Buenos Aires), a fim de buscar oportunidades e janelas de difusão. As filmagens, além de Porto Alegre, ocorreram também em Novo Hamburgo, cidado do interior do Rio Grande do Sul, e o primeiro corte deverá estar pronto ainda nesse semestre. O projeto foi beneficiado por facilidades proporcionadas pela Film Commission de Porto Alegre, e tem apoio institucional do Instituto Estadual de Cinema (Iecine-RS) e da Rede Master Hoteis. E se curtiu esse primeiro contato que tivemos com a produção, a dica é ficar ligado aqui no Papo de Cinema pois, em breve, teremos mais informações sobre o filme.
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