Estamos no dia 11 de maio de 2014, um domingo. As ruas de Porto Alegre já estiveram mais movimentadas, mas agora, passado das 20 horas, o trânsito começa a se acalmar. Menos na avenida 24 de Outubro, próximo à Ramiro Barcelos. É porque naquela quadra em frente a um discreto centro comercial de bairro foi montado o set de filmagens da etapa da capital gaúcha de Prova de Coragem, longa baseado no romance Mãos de Cavalo, de Daniel Galera, e que conta com a direção de Roberto Gervitz, o mesmo do clássico Feliz Ano Velho (1987). Naquele momento, aliás, filme e livro tinham ainda o mesmo título, e enquanto o diretor preparava a próxima cena, movimentando câmeras e discutindo as melhores opções de enquadramento com sua equipe, o Papo de Cinema – convidado especialmente para acompanhar a gravação desta cena – conseguiu falar com os dois protagonistas, Mariana Ximenes e Armando Babaioff. Nós voltamos a nos encontrar meses depois, já na finalização do projeto, e depois na primeira exibição pública do longa, durante a mostra competitiva do 48° Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. Confira como foi esse nosso bate-papo inicial, e nos próximos dias iremos revelar mais detalhes da produção.
Como foram as filmagens em Porto Alegre?
MARIANA XIMENES: Fiquei mais de um mês por aqui, e adorei todo o processo. Virei gaúcha, praticamente! Adoro filme de locação, me dá a impressão de que todo mundo fica mais concentrado. Você acaba conhecendo o lugar de uma forma diferente, vivendo aquele espaço de outra forma. A familiaridade com as pessoas da equipe também cresce muito. Tomamos café da manhã, almoço e janta, estamos o tempo todo juntos, e isso proporciona uma intimidade muito maior. Isso ajudo muito, inclusive para a história. Eu, o Babaioff, o Daniel, e Auréa, estamos todos no mesmo hotel, junto com o Roberto… acaba virando quase uma comunidade! O Babaioff, por exemplo, cozinha super bem! Então, além dos bons restaurantes de Porto Alegre – adoro comer uma carninha, um cacetinho com chimia (risos)… – temos também noites saudáveis por conta dele quando assume a cozinha.
Você tem uma relação antiga com o Rio Grande do Sul, Armando?
ARMANDO BABAIOFF: Já estive em Porto Alegre com duas peças de teatro. Uma que eu havia produzido e que participou do Porto Alegre Em Cena de 2001, se não me engano, e depois voltei ao lado da Vera Fischer em A Primeira Noite de um Homem, que foi um grande sucesso e deu um pontapé inicial na minha carreira! Isso foi em 2003, faz muito tempo. Também participei do seriado Doce de Mãe, com a Casa de Cinema de Porto Alegre, e pra isso vim dois finais de semana seguidos, foi uma experiência maravilhosa. O Jorge Furtado, a equipe toda, foram fantásticos.
Depois de teatro e televisão, você está fazendo pela primeira vez cinema em Porto Alegre. Como está sendo essa experiência?
AB: Prova de Coragem é o meu terceiro filme. Só que o primeiro, por conta de verba, acabou nunca saindo. E depois fiz uma participação menor no Sangue Azul (2014), do Lírio Ferreira, que ganhou o Festival do Rio. Então agora é o meu primeiro protagonista, o que é uma emoção muito grande. Não imaginava que isso fosse acontecer desse jeito, sabe? Eu adoro o Daniel Galera, já conhecia o romance Mãos de Cavalo, no qual o filme se baseia, e quando soube que iam adaptá-lo para o cinema e estavam procurando um ator, não pensei duas vezes! Me candidatei na hora! Eu disse “quero muito fazer”, e agarrei essa oportunidade com unhas e dentes!
Já a Mariana é uma das artistas mais ativas do nosso cinema, sempre com um filme novo…
MX: Que bom, né? Eu adoro fazer cinema!
Pois é, a gente percebe isso. E agora, depois de ter filmado no Rio Grande do Sul, o que você sentiu de diferente nessa experiência?
MX: Eu já fiz um filme em cada canto do Brasil, né? E gosto disso. Conhecia o Sul por causa da minissérie A Casa das Sete Mulheres e da novela Chocolate com Pimenta, pois ambas foram gravadas no Rio Grande do Sul. O povo gaúcho é muito acolhedor. Senti isso também quando vim com minha peça, no Theatro São Pedro, com um público emocionado, que vibra junto com a gente. Foi bem especial.
O que lhes instigou nos personagems de Prova de Coragem para querer fazê-los?
MX: Ela tem uma história super densa. Ao mesmo tempo, o filme fala sobre um romance contemporâneo, uma relação atual de uma mulher com um homem, algo muito pé no chão. Tem essa dinâmica da mulher querer ter filho, ele não, o que vem primeiro – profissão ou maternidade? – e como isso se encaixa em um relacionamento moderno? As angústias deles, como isso reflete no comportamento. Tem várias colocações sobre a vida que achei interessante discutir.
AB: E esse é um dos personagens mais complexos da minha carreira, que exigiu muito fisicamente e psicologicamente, então foi um grande prazer!
Mariana, você já esteve em Os Penetras, que foi um grande sucesso de público, e em O Rio Nos Pertence, uma outra proposta bem mais autoral. Dois extremos, portanto. O Prova de Coragem, dentro da tua filmografia, se encaixa melhor em qual destes lados?
MX: Acho que está no meio termo. Não é tão alternativo, e também não é uma comédia. É um filme que traz reflexões, que tem humor, mas também faz pensar. É engraçado falar de um filme que ainda não vi, que estamos fazendo, pois não posso afirmar nada. Cinema é um processo. E só acaba na sala de cinema, junto com o público que o diferencia. O Uivo da Gaita, por exemplo, entrou trilha sonora, o diretor tirou os diálogos na pós-produção…
Ou seja, você nem imaginava o resultado?
MX: Não tinha a menor ideia que encontraria aquele filme na tela. Mas também é essa a aventura de fazer cinema. Você mergulha junto com o diretor e com o editor. Um filme também é feito na sala de montagem, é o olhar destes dois profissionais juntos. É sempre uma surpresa e, felizmente, na maioria das vezes foram boas surpresas. Sou apaixonada pelo processo criativo. O que me encanta é essa troca, descobrir as pessoas, a equipe toda, ouvir como cada um pode contribuir. Entro, na verdade, disposta e disponível para a experiência. E é esse processo que te faz ser uma pessoa e uma atriz diferente.
Armando, você chegou a ler o livro antes ou depois do roteiro?
AB: O livro eu já conhecia. Acho que foi lançado em 2003, se não me engano. Depois, ao mergulhar no roteiro, foi como descobrir um novo mundo. São duas experiências fantásticas.
E chegou a ter algum tipo de receio ao assumir tal responsabilidade?
AB: Olha, eu não tenho medo de trabalho. Cada personagem é uma dúvida, é uma renovação de voz com a profissão, é sempre uma pergunta. Será que dessa vez vai? Será que eu consigo? Será que entendi o que esperam de mim? Será que vou conseguir viver esse personagem? Tem sempre uma dúvida. E acho que isso que é emocionante!
(Visita feita no dia 11 de maio de 2014)
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