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Top 10 :: França

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O dia 13 de novembro de 2015 foi de terror para os franceses. 129 pessoas foram mortas após atentados terroristas atribuídos ao Estado Islâmico. Entre investigações e possível morte do mentor dos ataques, na última semana o mundo parou para acompanhar a repercussão dos fatos em Paris. Também surgiu muita discussão sobre quem é o verdadeiro autor, que a França também tem sua parcela de culpa pelo imperialismo de suas ações além das fronteiras e, especialmente, uma briga virtual sobre todos chorarem muito mais a morte dos franceses do que lembrar de outras tragédias de países menores, o que inclui o desastre ocorrido aqui no Brasil, mas especificamente na barragem de Mariana, em Minas Gerais. Polêmicas à parte, a equipe do Papo de Cinema não quis saber de temas pesados para esta semana cercada de tragédias. Escolhemos selecionar dez grandes filmes franceses para celebrar a diversidade de um país tão rico culturalmente e que sempre agregou boas experiências na filmografia mundial. É a nossa forma de homenagear o luto do país. Sobre a nossa lista, é claro que precisaríamos de um top 100 para incluir tanta coisa boa, mas adotamos um critério de relembrar desde os anos 1940 até a última década com títulos marcantes na história do cinema francês. Será que o seu favorito está aqui? Confira!

 

O Boulevard do Crime (Les enfants du paradis, 1945)
A bela Garance é uma atriz que se apresenta no requintado Teatro Funambules, onde atrai a atenção de Baptiste, um mímico de rua que nutre uma paixão desesperançada pela moça. Algo que se torna ainda mais impossível quando ela é acusada de roubar o relógio de um homem e precisa abrigar-se nos braços do Conde Edouard que, com sua influência, pretende protegê-la. Sempre atraindo os homens à sua volta, Garance volta a encontrar Baptiste anos mais tarde quando ambos já tomaram rumos muito diferentes em suas vidas. Filmado durante a Segunda Guerra Mundial, o período de 18 meses ocupado pela produção acabou coincidindo com a ocupação nazista na França, especialmente em Paris. Devido ao fato histórico, houve vários atrasos provocados por investigações alemãs em cima das filmagens e da equipe, da qual todos os membros italianos tiveram de sair às pressas, sendo substituídos por outros franceses que precisavam esconder sua identidade. Além disso, ainda havia a escassez de recursos, já que, em tempo de guerra, a produção cinematográfica não era prioridade. Porém, O Boulevard do Crime conseguiu ser, apesar das adversidades e dos tempos sombrios pelo qual passava a França, um recordista em escala de produção e, posteriormente, aceitação do público.  – por Yuri Correa

 

Meu Tio (Mon oncle, 1958)
Dos trabalhos mais festejados de Jacques Tati, esta produção é uma verdadeira aula de comédia. Lançado em 1958, o filme trazia o cineasta/roteirista/produtor/ator no papel de Monsieur Hulot, um homem que via com certa surpresa as tendências modernosas de seus familiares, os Arpel. O filme tem direção de arte caprichada e dá destaque para o conflito entre o confortável e o belo, o usual e o extraordinário. Tati critica de forma inteligente o moderno pelo moderno, acentuando as linhas arrojadas da casa da família Arpel e fazendo um contraste interessante com o curioso local onde Hulot mora. Em uma das melhores cenas do filme, vemos o protagonista passear por diversos cantos da casa onde mora até chegar aos seus aposentos. Com esta e outras sequências, o diretor mostrava o quanto tinha controle da arquitetura de um plano, fazendo com que as piadas surgissem com a mise en scene. Utilizando de muito humor visual para construir suas piadas, com pouquíssimos diálogos, Meu Tio conquistou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, além de um prêmio especial no tradicional Festival de Cannes. E é simplesmente obrigatório para quem curte comédias francesas. – por Rodrigo de Oliveira

 

Acossado (À bout de souffle, 1960)
O ator Jean Paul Belmondo caminha sem lenço, sem documento pelas ruas parisienses nesta obra-prima de Jean-Luc Godard, um dos marcos da nouvelle vague. Ele é um marginal, não só por matar um policial rodoviário ou pelo furto recorrente de automóveis, mas principalmente por representar os que vivem à margem de uma sociedade centrada no sucesso financeiro, na fidelidade às marcas e ao estilo mais burguês possível. Neste filme, Godard, para atender aos instintos de sua criação singular, brinca com o fluxo da montagem e, por conseguinte, com a nossa percepção, expondo o espetáculo que o cinema proporciona. Pensar que a narrativa tem somente na forma seu sustentáculo é cair na armadilha das aparências, se deixando levar pelo epidérmico. O conteúdo e suas ressonâncias, camuflados em meio ao mote simples, até banal, são realmente sublinhados bastante pela forma godardiana, mas, por exemplo, não dá para fechar os olhos à vanguarda em que o longa está inserido também no que tange às questões comportamentais que o substancial abarca. O fio que conduz a trama pode até aparentar simplicidade, mas mesmo o estofo vai além. – por Marcelo Müller

 


Jules e Jim: Uma Mulher para Dois (1962)
A amizade do alemão Jules (Oskar Werner) e do francês Jim (Henri Serre) é o ponto central da primeira parte. Juntos pela capital francesa, eles conquistam mulheres, passeiam por cafés, desfrutam de companhias fugazes e apreciam arte, pouco preocupados com estabilidade. Estupefatos com o sorriso de uma estátua, os amigos logo se veem diante de uma mulher com expressão similar, por quem igualmente se encantam. Catherine (Jeanne Moreau), assim como eles, gosta de liberdade e não se aferra às configurações sociais que ditam este ou aquele comportamento. O romantismo mais existencial que amoroso. François Truffaut diferencia os dois caracteres do filme por meio da câmera. Em princípio, ela própria é livre para enquadramentos insólitos, para capturar momentos aparentemente banais, nos quais reside a felicidade cotidiana. Aos poucos, porém, seu olhar vai endurecendo, e o desapontamento frente aos sonhos não concretizados surge como inevitável sintoma de um tempo em que a felicidade é quase uma abstração, justo porque dela não se valorizam mais as pequenas ocorrências.  – por Marcelo Müller

 

Cléo das 5 às 7 (Cléo de 5 à 7, 1962)
Não se pode falar de cinema francês, nouvelle vague e feminismo na sétima arte sem citar a grande Agnès Varda. Uma das mais respeitadas realizadoras francesas a nível mundial, a diretora realiza neste filme uma jornada espiritual e poética sobre a vida de uma mulher, a Cléo do título (Corinne Marchand), em duas de intervalo entre a realização e a retirada de um exame que pode lhe dizer se ela está com câncer. Passado em tempo real, vemos tudo o que a cantora não muito conhecida faz neste tempo. Nisto ela vai em uma cartomante, toma café, compra um chapéu, encontra o amante, tem reunião com o letrista, conversa com uma amiga e até conhece na rua Antoine, um militar. Durante todo este tempo e trajeto suas ações são mecânicas em contraste com a preocupação que ocupa sua mente de saber se sua vida pode estar condenada ou não. Afinal, como realizar tarefas do cotidiano com tanta preocupação? Varda transforma estas tarefas corriqueiras do dia a dia de forma lírica, pontuando como pano de fundo algumas questões da sociedade francesa da época e, especialmente, focando sua lente na mente feminina muito além dos clichês tão usuais retratados até hoje. Cléo é uma personagem forte tanto quanto sua criadora. Não à toa, o filme é um dos mais belos e instigantes exemplares da cinematografia francesa de todos os tempos. – por Matheus Bonez

 

A Bela da Tarde (Belle de Jour, 1967)
Se hoje nos referimos à Catherine Deneuve como a “deusa gélida” do cinema, muito disso se deve a sua performance hipnotizante neste clássico de Luis Buñuel. Ainda que o realizador fosse espanhol, foi na França que ele realizou esse conto sobre moral e costumes familiares, sociedade e relações humanas. Porém, ao contrário de outros títulos em que explorava essas contradições através de cenários mais amplos, aqui ele elege apenas uma mulher para ser o foco de sua atenção. Séverine (Deneuve) encarna com propriedade essa dona de casa que, para lidar com frigidez que atormenta seu casamento, decide passar suas tardes atuando como prostituta em um bordel. A dicotomia que se estabelece entre os dois comportamentos da protagonista – em casa, casta e recatada, e em sua atividade secreta, atrevida e ousada – indica uma discussão sobre a hipocrisia social que domina a sociedade contemporânea, levantando questões que não podem ser facilmente respondidas, mas que desde seu lançamento tem servido para inúmeros debates entre os mais diversos tipos de espectadores. Premiado com o Leão de Ouro no Festival de Veneza, é um dos marcos da cinematografia europeia, uma obra que até hoje segue mexendo com os mais diversos tipos de instintos, dos mais óbvios até aqueles resguardados à sete chaves. – por

 

Sob o Sol de Satã (Sous le soleil de Satan, 1987)
Por muito tempo este trabalho do cineasta francês Maurice Pialat foi lembrado pela polêmica de sua premiação no Festival de Cannes, quando ao ser anunciado como vencedor da Palma de Ouro, de forma unânime, Pialat foi vaiado por grande parte da imprensa. Felizmente, com o passar dos anos, a percepção sobre o filme parece ter mudado e o rigor estilístico do cineasta, antes considerado um formalismo acadêmico por seus detratores, hoje é reconhecido como um traço autoral único. Com seu magnífico trabalho de iluminação, composição elegante de quadros geralmente estáticos e cortes abruptos, que surpreendem ao realizar a transição entre cenas de momentos temporais distintos, Pialat narra sua história, adaptada do livro homônimo de Georges Bernanos, sobre Donissan (um intenso Gérard Depardieu), padre de uma comunidade rural que tem seu caminho cruzado pelo próprio Satã, na tentativa de ajudar a jovem problemática Mouchette (Sandrine Bonnaire, bela e arrebatadora). Transitando sem restrições entre o real e o fantástico, Pialat trata não só de religiosidade, mas do desencanto de seu protagonista com a fé, a humanidade e consigo mesmo.  Uma obra complexa e provocativa, que exige a capacidade interpretativa do espectador, mas que também o premia com sequências belíssimas e impactantes. – por Leonardo Ribeiro

 

O Ódio (La haine, 1995)
Em um momento em que a França é o alvo principal do terrorismo provocado por muçulmanos extremistas, e quando a Bélgica francófona se apresenta como posto avançado do Estado Islâmico na Europa, a presença do filme de Mathieu Kassovitz neste top seria imprescindível. Paris, a Cidade Luz, berço das atuais concepções de República e democracia, lócus ideal da arte, da cultura e do bom viver, é há décadas rodeada por aglomerações urbanas empobrecidas. Densamente ocupados por famílias francesas oriundas de ex-colônias africanas como Argélia, Marrocos, Tunísia e Guiné, os banlieues parisienses também abrigam imigrantes do Oriente Médio. Nesta enorme comunidade islâmica transitam jovens à margem do sonho da Europa rica e unida, cuja sensação de não pertencimento se mistura à falta de perspectivas socioeconômicas e ao apelo insidioso das interpretações proféticas distorcidas. O Ódio capta este cenário, mas, sendo de 1995, não aborda diretamente o terrorismo global em território francês. Ainda assim, apresenta o contexto de jovens não totalmente integrados à cultura ocidental, impelidos à violência e ao crime, tornando-se naturalmente mais suscetíveis ao recrutamento por grupos radicais. – por Danilo Fantinel

 

O Fabuloso Destino de Amélie Poulain (Le fabuleux destin d’Amélie Poulain, 2001)
Se tem algo que se pode dizer do cinema francês é que este nunca foi decadente. Porém, sua qualidade nunca foi muito além do eixo europeu, ainda que algumas produções possam dizer o contrário ao longo dos anos. Foi preciso um diretor inventivo como Jean-Pierre Jeunet para conseguir popularizar a sétima arte da França para fora de suas fronteiras com esta obra que, apesar de uma sinopse aparentemente simples, consegue unir a modernidade da decupagem com aquele ar clássico dos filmes feitos em sua terra. E Amélie (Audrey Tautou) é uma metáfora do próprio cinema francês que, assim como sua protagonista, pode aparentar ser tímido, mas é recheado de energia e ideias pulsantes que extrapolam conceitos. Com uma paleta de cores extremamente vivas e uma edição rápida e ágil, mas sem atropelos, acompanhamos a vida desta garota que, após anos enclausurada em sua própria solidão, tem um choque revelador. A morte de Lady Di faz com que a moça derrube uma tampa no chão e descubra um caixa escondida numa parede de seu apartamento. A busca pelo dono faz com que ela se torne uma espécie de super-heroína que melhora a vida de todos à sua volta em sua busca. Uma das produções mais graciosas dos anos 2000 em todo mundo, este longa faz qualquer um se apaixonar. Não apenas por alguém, mas pelos mais simples prazeres da vida. – por

 

O Artista (The Artist, 2011)
Grande vencedor do Oscar 2012, O Artista é um filme no qual abrir um sorriso de orelha a orelha ocorre com imensa facilidade, de tão adorável que ele é durante sua narrativa. Mudo e fotografado num belíssimo preto e branco como uma produção saída direto da década de 1930, o filme de Michel Hazanavicius explora a época em que o cinema encarava a evolução do som e fazia a passagem para os filmes falados, com a história mostrando então a queda do astro George Valentin (Jean Dujardin), que teima em não se render a nova tecnologia sonora, e a ascensão da jovem atriz Peppy Miller (Bérénice Bejo), que foi descoberta pelo próprio Valentin. Claramente inspirado por produções como Cantando na Chuva (1952) e Nasce Uma Estrela (1976), o filme é uma grande homenagem ao próprio cinema, sendo uma diversão absolutamente encantadora ao mesmo tempo em que é sensível com seus personagens, interpretados brilhantemente por Dujardin e Bejo, que exibem uma química irretocável. E como esquecer o cãozinho Uggie? Aliás, como esquecer esse filme? É um longa que representa um verdadeiro deleite para adoradores da sétima arte. – por Thomás Boeira

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