Cedo demais. Com apenas 37 anos, Gaspard Ulliel morreu em um acidente ao praticar esqui, durante um período de férias em Grenoble, nos alpes franceses. E não é a primeira vez que um nome importante da tela grande se vai da mesma forma: em 2009, a atriz Natasha Richardson – esposa de Liam Neeson e filha de Vanessa Redgrave – veio a falecer em uma tragédia similar, quando tinha apenas 45 anos. Filho de Serge, um estilista, e Christine Ulliel, uma produtora de moda, Gaspard se formou em Cinema na Universidade de Saint-Denis, em Paris. Mesmo com o sonho de ser diretor, aos 12 anos já atuava, tendo marcado presença no elenco do seriado Une femme en blanc (1997), que tinha Sandrine Bonnaire como protagonista. No ano seguinte participou do telefilme Bonnes vacances (1998). Em uma carreira que durou mais de duas décadas, seu nome esteve em nada menos do que 50 produções diferentes, seja para o cinema ou para a televisão. Ao todo ganhou 2 César – o Oscar francês – e 2 Lumière – a maior premiação da imprensa e crítica francesa, e seus filmes foram exibidos em festivais ao redor do mundo. Amigo próximo de estrelas com quem trabalhou, como Audrey Tautou e Jérémie Renier, era pai de um menino, Orso, que completou 6 anos no último dia 12 de janeiro. Em homenagem a esse nome em ascensão, que ainda tinha muito a mostrar, o Papo de Cinema aponta aqui dez filmes imprescindíveis do ator, que revelam sua versatilidade e talento. Confira!
O Pacto dos Lobos (Le pacte des loups, 2001)
A estreia de Gaspard Ulliel no cinema se deu em um verdadeiro blockbuster do cinema francês! Na obra do cineasta Christophe Gans, estrelada por nomes de peso, como Mark Dacascos, Jérémie Renier, Vincent Cassel e Monica Bellucci, faz uma rápida aparição como um jovem pastor que é atacado pela Besta, a fera atrás da qual todos os personagens estão à caça. Vencedor do César de Melhor Figurino e premiado até nos Estados Unidos, esse filme, até pelo seu caráter aventuresco e pela rápida participação de Ulliel em cena, talvez não fosse um início dos mais promissores. No entanto, o incrível sucesso do projeto, que arrecadou quase US$ 100 milhões nas bilheterias de todo o mundo, fez com que muita gente o visse – inclusive o diretor Michel Blanc, que impressionado com ele terminou por lhe oferecer um papel no seu próximo longa.
Beije Quem Você Quiser (Embrassez qui vous voudrez, 2002)
Escrita e dirigida por Michel Blanc, essa comédia romântica segue à risca a cartilha do gênero, apresentando diversos casais que se aproximam e se afastam (e se aproximam novamente) ao longo de quase duas horas de projeção. Ulliel aparece como Löic, um dos tantos apaixonados em cena, surgindo ao lado de nomes como Charlotte Rampling, Karin Viard, Denis Podalydes, Melanie Laurent e o próprio Michel Blanc. Mesmo assim, no meio de tantas estrelas conseguiu se destacar a ponto de garantir sua primeira indicação ao César – como Revelação Masculina – e a primeira vitória no Lumière, apontado naquele ano como “o Mais Promissor Jovem Ator” do cinema francês.
Anjo da Guerra (Les égarés, 2003)
Após dois trabalhos em sequência, Ulliel decidiu voltar ao básico, e foi atuar como estagiário na Le Cours Florent, uma das mais prestigiadas escolas de teatro da França. Mais uma aposta que se revelou certeira, pois foi numa dessas peças que foi visto pelo diretor André Téchiné, que o chamou para ser um dos protagonistas de seu próximo longa. Como Jean Delgas, recebeu pela frente a missão de ser o amante de ninguém menos do que Emmanuelle Beart, que interpretava uma professora viúva obrigada a fugir com os filhos de uma Paris ocupada pelos nazistas, durante a Segunda Guerra Mundial. Sua composição segura e dona de muitas camadas lhe rendeu uma segunda indicação ao César – novamente como Revelação Masculina – e o prêmio da Academia Étoiles d’Or, uma associação de jornalistas franceses, também na categoria de Revelação.
Eterno Amor (Un long dimanche de fiançailles, 2004)
Mais uma romance pra conta, e novamente ao lado de uma grande estrela. Dessa vez, foi sob o comando do visionário Jean-Pierre Jeunet, que colocou Ulliel como par da sensação Audrey Tautou, no primeiro filme do cineasta após o sucesso O Fabuloso Destino de Amélie Poulain (2001) – e, mais uma vez, com sua protagonista favorita. Dessa vez, Jeunet e Tautou se reuniram em um épico romântico, narrando a saga de uma jovem apaixonada em busca do noivo – papel de Gaspard – que desapareceu nas trincheiras da Primeira Guerra Mundial. Ulliel ganhou, enfim, o César de Revelação Masculina – na terceira indicação consecutiva – mas não só isso. O sucesso do filme foi imenso, tendo sido indicado como Melhor Filme Estrangeiro no Bafta, no Critics Choice e no Globo de Ouro, premiado no European Film Awards e recebido duas indicações ao Oscar. Com isso, o galã se tornava, enfim, conhecido nos Estados Unidos.
Paris, Te Amo (Paris, Je T’Aime, 2006)
Após aparecer no romance LGBT Le Dernier Jour (2004) – que permanece inédito no Brasil – Gaspard Ulliel embarcou em outra história homoafetiva, mas dessa vez como parte de um projeto mais ambicioso. Primeiro capítulo da saga “Cidades do Amor” (que já se estendeu por Nova York, Rio de Janeiro e Berlim), este longa coletivo contou com a participação de diversos cineastas de prestígio, como os irmãos Joel e Ethan Coen, o francês Olivier Assayas e até os brasileiros Walter Salles e Daniela Thomas. Quem escalou Ulliel foi o norte-americano Gus van Sant, no episódio Les Marais, no qual aparece ao lado de ninguém menos do que a roqueira Marianne Faithfull, como objeto de desejo do jovem turista interpretado por Elias McConnell (Elefante, 2003). Em cena Ulliel diz pouco, mas como esquecer de sua presença?
Hannibal: A Origem do Mal (Hannibal Rising, 2007)
Após trabalhar sob o comando de um diretor indicado ao Oscar, Ulliel investiu na carreira internacional. E o projeto que lhe abriu essas portas era igualmente ambicioso: uma prequel – ou seja, mostrava acontecimentos anteriores – do sucesso O Silêncio dos Inocentes (1991). Na verdade, se trata do quinto longa baseado na obra de Thomas Harris, após também Caçador de Assassinos (1986), Hannibal (2001) e Dragão Vermelho (2002). Aparecendo como o jovem Hannibal Lecter, papel que consagrou Anthony Hopkins, o astro pode atuar ao lado de nomes como Rhys Ifans e Gong Li numa obra que dividiu opiniões, mas de impacto suficiente para deixar sua marca.
Saint Laurent (2014)
Para se recuperar de uma passagem por Hollywood que não foi exatamente como esperava, Gaspard Ulliel voltou para a França e se envolveu em diversos projetos de maior ou menor projeção. Atores como Isabelle Huppert e Jean Reno foram seus colegas nos anos seguintes, mas só ocupou o papel de protagonista novamente na aguardada cinebiografia do estilista Yves Saint Laurent. No projeto dirigido por Bertrand Bonello – feito simultaneamente com o similar Yves Saint Laurent (2014), com Pierre Niney como o personagem-título – Ulliel causou forte impacto pela cena de nudez frontal e pelos relacionamentos amorosos com os personagens interpretados por Jérémie Renier e Louis Garrel, entre outros. Apesar de ter sido o escolhido oficial da França para o Oscar 2015 e exibido no Festival de Cannes, no César o filme não teve a mesma sorte: apesar das dez indicações recebidas, ganhou apenas como Melhor Figurino. E Ulliel, que concorria como Melhor Ator, perdeu justamente para… Pierre Niney, pelo mesmo papel! No Prêmio Lumière, no entanto, o jogo virou, com novamente os dois indicados, mas quem levou a estatueta para casa foi Gaspard Ulliel!
É Apenas o Fim do Mundo (Juste la fin du monde, 2016)
Personagens homossexuais foram uma constante na carreira de Gaspard Ulliel. Após os já citados Le Derniere Jour, Paris, Te Amo e Saint Laurent, o ator voltou a interpretar um jovem gay nesse drama dirigido pelo cineasta-fenômeno Xavier Dolan. Ao lado de Nathalie Baye, Vincent Cassel, Marion Cotillard e Léa Seydoux, Ulliel surge como o filho/irmão/cunhado que há muito tempo saiu de casa, e finalmente decide voltar, após anos sem nenhuma visita, para contar que está morrendo. Um filme de fortes embates, relações nada fáceis e emoções à flor da pele, que exigiu o máximo do seu elenco. Vencedor do Grande Prêmio do Júri no Festival de Cannes, foi premiado como Melhor Filme no Canadian Screen Awards – o Oscar canadense – e recebeu seis indicações ao César, tendo sido agraciado com três vitórias: Melhor Direção, Montagem e Ator, para Gaspard Ulliel.
Os Confins do Mundo (Les confins du monde, 2018)
O último grande desafio na tela grande de Gaspard Ulliel foi vivendo a história real do soldado Robert Tassen, que foi mandado para a Guerra da Indochina, em 1945, e se tornou o único sobrevivente de um massacre que até hoje repercute no exército francês. Nesse filme escrito e dirigido por Guillaume Nicloux (O Vale do Amor, 2015), Ulliel teve a oportunidade de atuar ao lado de Guillaume Gouix e do grande Gerard Depardieu, numa obra exibida nos festivais de Gijón (Espanha), Hamburgo (Alemanha) e Istambul (Turquia), entre tantos outros.
Sibyl (2019)
Gaspard Ulliel deixou dois longas incompletos – La Bête, que o reuniria com o diretor Bertrand Bonello, e Plus que jamais, em que atuou ao lado da grande Liv Ullmann – mais o seu retorno à Hollywood, como parte do elenco da minissérie da Marvel O Cavaleiro da Lua, prevista para estrear em março. Seu último filme a ser exibido nos cinemas brasileiros, porém, foi esse drama romântico estrelado por Virginie Efira e Adèle Exarchopoulos. Nele, aparece como o homem no meio dessas mulheres, em uma história que mistura realidade e ficção. Exibido na mostra competitiva oficial do Festival de Cannes, servirá também como registro final de um ator sempre disposto a fazer mais, fazer diferente e fazer melhor, do qual a saudade será eterna.
Últimos artigos deRobledo Milani (Ver Tudo)
- Piano de Família - 23 de novembro de 2024
- Wicked - 22 de novembro de 2024
- Gladiador II - 22 de novembro de 2024
Deixe um comentário