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Cinema e culinária rendem filmes deliciosos há muitos anos. Há obras tão sensíveis e prazerosas que a vontade que dá é de adentrar a tela e provar os mais diversos pratos feitos em obras do gênero. Nesta semana chega aos cinemas brasileiros mais um filme sobre o assunto: Chef, dirigido e estrelado por Jon Favreau. Com muita fome, a equipe do Papo de Cinema resolveu lembrar de dez filmes que contém não apenas comidas deliciosas, mas tramas interessantes que remetem à cozinha. Confira!

 

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Delicatessen (1991)
Um futuro pós-apocalíptico e inimaginável é a perfeita ambientação de Delicatessen, comédia ácida e repleta de humor negro assinada por Jean-Pierre Jeunet uma década antes de toda a delicadeza e poesia de O Fabuloso Destino de Amélie Poulain (2001). Esta obra incorreta e visualmente deslumbrante transcorre dentro de um complexo de apartamentos mantido por um açougueiro tão excêntrico quanto assustador. Enquanto o caótico mundo exterior não apresenta quaisquer oportunidades para uma vida plena, ele delicia os moradores do local com excelentes cortes de carne, oriundos de fontes suspeitas. Brilhantemente concebido, Delicatessen deleita mais aos olhos do que o estômago, uma vez que se vale de seu subtexto gastronômico unicamente para divertir o expectador. Jeunet, aliado a seu codiretor Marc Caro e seu fiel escudeiro Dominique Pinon, desenvolve um conto sombrio num mundo surreal repleto de reviravoltas absurdas, estética extravagante e um humor pitoresco tão delicioso quanto perturbador. A mistura pode soar indigesta para aqueles de estômago fraco, porém toda a originalidade e virtuosismo de Jeunet em um de seus melhores momentos são a receita infalível para um verdadeiro banquete cinematográfico. – por Conrado Heoli

 

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Chocolate (Chocolat, 2000)
Em Chocolate, Vianne (Juliette Binoche) e sua filha se mudam para uma cidadezinha interiorana e antiquada. Ela tem uma habilidade quase sobrenatural para identificar o chocolate que melhor se adequa aos anseios dos clientes de sua recém-aberta chocolateria. Ao chamar atenção, ela automaticamente vira alvo da parcela mais retrógrada dos moradores, que vira-lhe a cara totalmente, sobretudo após ela iniciar romance com o forasteiro Roux (Johnny Depp). A comida é vista como via do prazer, portanto sua importância precisa ser sufocada por conservadores, talvez porque, segundo eles, ao deleite não se permita agregar a retidão, como se a vida precisasse ser uma penitência velada e constante para adquirir valor legítimo. Lasse Hallström “joga baixo”, instigando nossos sentidos com a exploração visual de diversos tipos de chocolate. A associação de comida e prazer não é nova, vem certamente desde antes de a gula ser considerada um pecado capital, mas certamente em Chocolate ela se dá de maneira interessante, pois deflagra a necessidade de alguns em ver na felicidade alheia algo como um erro moral. – por Marcelo Müller

 

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Simplesmente Martha (Bella Martha, 2001)
Martha (Martina Gedecké) é a chef perfeccionista e temperamental que eleva o status de um fino restaurante em Hamburgo. A workaholic não tem vida pessoal, apenas voltada ao trabalho. Um acidente de carro transforma sua vida: a irmã morre e ela precisa cuidar da sobrinha Lina (Maxime Foerste), de oito anos. Menina, que por sinal, odeia a comida da tia, preferindo coisas simples. O segundo baque é a contratação de um sous chef italiano, Mário (Sergio Castellitto), que canta enquanto faz os pratos. A implicância inicial entre os dois, é claro, como em qualquer comédia romântica, se transforma em algo mais. O clichê do gênero é estabelecido, mas a química do casal e a empatia do trio de protagonistas é tão grande que a gente releva. A produção fez tanto sucesso que ganhou um remake americano em 2007 sob o título Sem Reservas, com Catherine Zeta-Jones e Aaron Eckhart nos papeis principais. Uma produção divertida, mas prefira o original. Bem mais temperado e com um sabor agridoce. – por Matheus Bonez

 

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O Tempero da Vida (Politiki kouzina, 2003)
O longa do turco Tasos Boulmetis tem um grande diferencial em relação à maioria dos filmes sobre culinária e afins: a metáfora dos conflitos entre a Grécia e a Turquia na década de 1950 através dos temperos originários de cada um dos países. A ideia toma proporções ainda maiores quando Fanis (Georges Corraface), professor de astronomia, estabelece um paralelo entre o interplanetário e os sabores da cozinha. Afinal, como já diria o protagonista, “gastrônomo contém a palavra astrônomo”. É neste contexto que o personagem volta de Atenas para Istambul e relembra a história da família, que foi expulsa pelos turcos no passado. O passado vem à tona através da relação com o avô, que lhe ensinava tudo sobre a vida em uma sala recheada, é claro, de temperos. Sensível, o filme de Tassos Boulmetis pode não ser dos mais convencionais sob certos aspectos narrativos, mas o diretor insere vários momentos clichê para tornar o longa mais agradável ao estômago. Uma tarefa brilhantemente cumprida. – por Matheus Bonez

 

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Estômago (2007)
Raimundo Nonato (João Miguel) é um nordestino que chega em São Paulo para arranjar trabalho. Não demora muito para ele descobrir que tem talento para a cozinha e suas coxinhas acabam sendo um sucesso imediato. Algo dá errado na vida de Nonato e ele acaba parando na prisão. Apenas seu talento culinário poderá fazê-lo sobreviver em um lugar onde o perigo atende pelo nome de Bugiu (Babu Santana). O grande acerto no filme de estreia de Marcos Jorge na direção de uma ficção é a narrativa. Em vez de acompanharmos a trajetória de Nonato cronologicamente, somos apresentados primeiramente ao personagem já na prisão, dando uma explicação hilária de como nasceu o queijo gorgonzola. Com essa pequena história, podemos ter uma pequena noção de quem é Raimundo Nonato e qual é o tamanho de sua “fome” pelo conhecimento culinário. A narrativa passeia entre os dias anteriores à prisão de Nonato e seu cotidiano dentro da cela. Com isso, nos questionamos qual é o real motivo por “Alecrim” – como o personagem é apelidado na cadeia – estar detido, já que ele não apresenta muitos sinais de ser um homem perigoso. Ledo engano. Estômago não chega a passar uma mensagem de amor à culinária como Ratatouille (2007) e Sem Reservas (2007), mas usa essa nossa predileção pela boa cozinha para mostrar que até os presos mais sanguinários podem ser conquistados por um bom prato de comida. – por Rodrigo de Oliveira

 

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Sweeney Todd: O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet (Sweeney Todd: The Demon Barber of Fleet Street, 2007)
Como Sweeney Todd poderia deixar de constar na nossa seleção? Apesar das peculiaridades gastronômicas apresentadas pelo filme de Tim Burton – o último lançado pelo cineasta que se pode chamar de “ótimo”, aliás – o musical adaptado da peça composta por Stephen Sondheim se mostra divertidamente macabro. Contando com canções que, sim, são estranhas aos ouvidos e não envolvem nenhuma coreografia, tão típicas em longas do gênero, O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet é primordialmente um drama sobre amor e ódio, que com sua paleta quase monocromática desenvolve a associação do sinistro Sweeney Todd do título – um Johnny Depp em seu melhor – com a melancólica Senhora Lovett – Helena Bonham Carter sendo, com muito talento, Helena Bonham Carter. Uma parceria que envolve o barbeiro matando seus clientes e então entregando os corpos para a sócia, que por sua vez usa a carne dos cadáveres para cozinhar suas deliciosas tortas. Isso para que Todd consiga o prestígio necessário para receber em seu estabelecimento o Juiz Turpin (Alan Rickman), o homem que desgraçou sua vida a ponto de levá-lo a atual condição de assassino em série. Sensível e de certa maneira até delicado, Sweeney Todd se encerra deixando um gostinho de quero mais. – por Yuri Correa

 

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Ratatouille (2007)
“Nem todo mundo pode se tornar um grande artista, mas um grande artista pode vir de qualquer lugar”. Esta fala de Ratatouille é a própria síntese do filme e dos temas que ele aborda ao longo de sua história. Acompanhando o simpático ratinho Remy (voz de Patton Oswald), que com seu surpreendente talento como cozinheiro passa a ajudar o atrapalhado chef Linguini (voz de Lou Romano) no restaurante Gusteau’s, o filme dirigido por Brad Bird  faz um retrato interessante da arte em si (no caso, da culinária). Para tal, conta com ingredientes que se combinam perfeitamente, resultando em um prato maravilhoso e que deixa quem o experimentar mais do que satisfeito. Além disso, é uma animação tecnicamente impecável (é notável, por exemplo, a atenção dada à maneira como os alimentados são cortados) e com um visual arrebatador, que ajuda a fazer da narrativa algo de tirar o fôlego. É uma receita que se revela infalível em um filme que, sem dúvida, é uma das grandes obras-primas da Pixar. – por Thomás Boeira

 

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Julie & Julia (2009)
Quando se fala em cinema e gastronomia, é impressionante reparar o quanto o nome da grande Meryl Streep se faz presente. Pois entre a dona de casa de As Pontes de Madison (1995) e a proprietária de uma padaria muito saborosa em Simplesmente Complicado (2009), em nenhum dos seus trabalhos ela esteve tão ligada ao assunto como no delicioso Julie & Julia (2009), de Nora Ephron. Baseado no livro de Julie Powell, esta cinebiografia recria a trajetória de uma mulher maior que a própria vida e que até hoje, anos após sua morte, tem seu nome diretamente ligado à culinária norte-americana: Julia Child. É Streep, em uma atuação indicada ao Oscar e vencedora do Globo de Ouro, que interpreta com muita precisão e respeito essa senhora que largou os afazeres domésticos para se dedicar à sua maior paixão – a cozinha – em ambiente nacional. Child se transformou em apresentadora de televisão, sempre com um estilo leve e descontraído, e cozinhando do seu jeito se tornou uma celebridade como poucas. Mas o filme não é tão linear, e ganha muito com a participação da própria Julie Powell, que ganha em cena o rosto da sempre simpática Amy Adams. As duas, em tempos e ambições diferentes, fazem uma boa dupla, tornando esse filme uma experiência tão necessária quanto uma generosa barra de manteiga em qualquer cozinha que se preze. – por Robledo Milani

 

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Toast: A História de uma Criança com Fome (Toast, 2010)
Muito antes de haver Nigella Lawson, houve Nigel Slater, um dos jornalistas gastronômicos mais famosos do Reino Unido. O que pouca gente sabia é que as mesas da infância de Nigel tinham bem menos glamour do que aquelas que ele criticou até o fim da vida. Toast: A História de uma Criança com Fome, conta essa história.  O nome do filme, que quer dizer torrada, vem do fato de que a mãe do garoto só sabia cozinhar isso. Nasce daí a dedicação de Nigel para a cozinha. Ele atravessa os anos 1960 – recriados numa direção de arte que faz lembrar anúncios de comida da época – fazendo os mais deliciosos pratos. Mas como nem só de pão vive o homem, é também nessa época que Nigel descobre a própria sexualidade, o que o joga num conflito interminável com sua família, sua madrasta – Helena Bonham Carter, causando – e todos à sua volta. Confessional, interessante e com uma trilha sonora saborosíssima (versões inglesas de sucessos franceses da época, como Hier Encore, um bem vindo trocadilho que também bebe da fonte da gastronomia), Toast é o tipo de filme que deixa quem vê com gostinho de quero mais. – por Dimas Tadeu

 

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Os Sabores do Palácio (Les Saveurs du Palais, 2012)
Hortense Laborie (Catherine Frot) é um cozinheira de mão cheia, mas seu principal atrativo são comidas caseiras. Por isto mesmo a própria se surpreende quando recebe o convite do presidente da França (Jean d’Ormesson) para se tornar sua personal chef. O filme é baseado na história verídica de Danièle Mazet-Delpeuch, a cozinheira do presidente François Mitterand, e sua experiência na cozinha do palácio do governo em Paris. Um dos aspectos mais interessantes da narrativa é justamente mostrar a relação de Hortense (o duplo ficcional de Daniéle) com o regente da França. A amizade entre os dois é de poucas palavras e surge justamente pelo fato de o presidente ser um apaixonado por receitas desde criança, especialmente as mais caseiras. Por seu trabalho em Os Sabores do Palácio, Catherine Frot recebeu sua nona indicação de Melhor Atriz no César, o Oscar Francês. Méritos não faltam já que ela incorpora a personalidade da cozinheira mesclando doçura, um pouco de petulância e certa neurose sobre a realização dos almoços do presidente. O filme é uma produção sensível e trata do assunto com naturalidade, sem perder a mão. O único pecado é a fome que dá quando as luzes do cinema se acendem. – por Matheus Bonez

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