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A cinematografia brasileira não é muito de falar sobre as grandes guerras que já aconteceram durante os mais de 500 anos de formação da nação. E nem todos os exemplares são realmente dignos de nota. Alguns, porém, merecem destaque, mesmo que não sejam grandes obras-primas, mas por tratarem do tema de forma relevante. Com a estreia de Estrada 47, filme que se passa na Segunda Guerra Mundial, a equipe do Papo de Cinema resolveu listar dez exemplares do nosso cinema que falam de grandes conflitos no Brasil. Confira!

 

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Os Fuzis (1963)
Ano de 1963. O nordeste padece de fome, situação não apenas ocasionada pela seca, mas também, e muito, pela negligência dos governantes e os desmandos históricos dos senhores da terra. O povo sofrido, muitas vezes não vendo outra solução, se desloca e, ocasionalmente, saqueia os últimos estabelecimentos em que há água e comida. E o que o governo faz? Envia uma tropa de soldados para evitar que os roubos aconteçam, ao invés de mandar ajuda para a população que definha debaixo do sol escaldante. Produção brasileira e argentina, com direção de Ruy Guerra, moçambicano de nascimento, mas tupiniquim de vivência, Os Fuzis mostra a violência instituída contra um povo que busca sobreviver. De um lado, os retirantes famintos, liderados por um beato místico que prega a adoração a um boi santo, e do outro, o destacamento do exército que protege o estoque de alimentos de um grande produtor temeroso do assalto. Expoente do Cinema Novo, Os Fuzis mostra a guerra não anunciada no nordeste flagelado. A paisagem árida do sertão emoldura, assim como em outros filmes cinemanovistas, uma batalha em que não há vencedores. – por Marcelo Müller

 

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For All: O Trampolim da Vitória (1997)
No final dos anos 90, o diretor Luiz Carlos Lacerda, conhecido por sua posição revolucionária e libertária, se juntou ao ator e roteirista Buza Ferraz para, juntos, levarem às telas um curioso episódio a respeito do envolvimento brasileiro na Segunda Guerra Mundial. Devido ao seu ponto geográfico estratégico, no extremo nordeste do país, a cidade de Natal, capital do Rio Grande do Norte, foi utilizada pelos norte-americanos para o estabelecimento de uma base militar que possibilitasse um fácil acesso ao continente europeu através de uma rota não muito óbvia, vinda do hemisfério sul. Porém, o que de fato chamou atenção foi a presença de muitos americanos em meio aos brasileiros, e como os costumes de ambos mudaram a partir dessas interações. Com um elenco nobre, encabeçado por nomes como José Wilker, Betty Faria e Edson Celulari (este no papel de um agente nazista), o filme ainda brinca com a expressão do título, que se referia aos bailes oferecidos na região com o objetivo e unir os dois povos – dando, assim, origem ao termo “forró” (uma corruptela do estrangeirismo). Uma comédia repleta de momentos interessantes, premiada como Melhor Filme no Festival de Gramado. – por Robledo Milani

 

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Guerra de Canudos (1997)
A guerra do título homônimo é um dos conflitos mais críticos da história do país desde o surgimento da República. Com a seca, a fome a miséria predominando nos sertões da Bahia no final do século XIX, a camada mais pobre da região, o Arraial de Canudos, se reúne sob a liderança de Antônio Conselheiro (José Wilker), um revolucionário que afirma ser líder religioso. Do outro lado, os militares baianos tem apoio tanto do governo do estado quanto do federal para combaterem os rebeldes. O resultado são quatro conflitos, dos quais apenas o último significou a derrota dos sertanejos através de uma chacina e centenas de mortos. No filme, o conflito externo é internalizado por Luíza (Cláudia Abreu), sertaneja que não aceita a revolta  de sua família e não faz parte dos rebeldes. Isto até sua mãe ser morta. O filme de Sérgio Rezende acompanha toda esta trajetória sob o olhar da protagonista, dando um panorama geral do conflito sobre ambos os lados. – por Matheus Bonez

 

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Anahy de las Misiones (1997)
Nem só de grandes guerras vive o cinema brasileiro. Aliás, muito pelo contrário – afinal, é tímida em nossa filmografia a existência de obras que registrem o envolvimento brasileiro em conflitos de repercussão internacional. Mais comum é nos depararmos com filmes que se preocupem em analisar as consequências dos embates que tiveram como cenário as terras daqui mesmo. E o Rio Grande do Sul, por sua posição de fronteira, tem participação fundamental neste registro. Dos longas produzidos na região, um dos destaques é certamente esta adaptação de Mãe Coragem, de Brecht, transposta para o pampa gaúcho após a devastação da Revolução Farroupilha, um episódio de luta pela independência que não teve o resultado esperado, mas que até hoje repercute entre os locais. Anahy, em uma interpretação poderosa de Araci Esteves, é uma andarilha que percorre vastos campos em busca de restos deixados por mortos abatidos em batalha e que possam garantir a sobrevivência sua e de sua família. Com agregados surgindo a todo instante e outros tantos que partem, este é um conto que reflete a formação do estado e da identidade gaúcha, vinda das cinzas e se levantando a partir dos próprios farrapos. – por Robledo Milani

 

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Netto Perde sua Alma (2001)
Dos realizadores gaúchos, provavelmente o mais preocupado com a história do Rio Grande do Sul e seu passado bélico é, sem dúvida, Tabajara Ruas. E se atualmente ele se prepara para o lançamento do ainda inédito Senhores da Guerra (premiado no Festival de Gramado 2014), seu envolvimento com o cinema começou muito antes, neste filme co-dirigido por Beto Souza e que adaptava um livro de sua própria autoria. Aqui, o General Netto (Werner Schünemann, premiado como Melhor Ator no Festival de Brasília e indicado ao Grande Prêmio do Cinema Brasileiro) se revela peça fundamental na Revolução Farroupilha, um dos mais importantes movimentos revolucionários nacionais do século XIX. Após seu envolvimento com a Guerra do Paraguai, ele volta ao estado mais ao Sul do Brasil com o objetivo de declarar a República Rio-Grandense, libertando-se da pressão imperial brasileira e almejando um destino similar ao alcançado pelo Uruguai. No entanto, como nem tudo são flores, mais importante aqui será o processo em busca destes objetivos do que o resultado final – que, enfim, nunca foi alcançado. Um longa poderoso, que se mantém acima de sua continuação – Netto e o Domador de Cavalos (2008) – e até da própria obra literária. – por Robledo Milani

 

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Olga (2004)
Baseado em fatos reais e inspirado no livro-reportagem homônimo de Fernando Morais, este filme oferece uma luz a um obscuro episódio sobre o envolvimento do governo ditatorial de Getúlio Vargas com a força nazista durante a Segunda Guerra Mundial. Olga Benário (interpretada com vigor por Camila Morgado) era esposa do líder comunista Luís Carlos Prestes (Caco Ciocler, em postura correta). Com o intuito de minar seus esforços contrários ao poder estabelecido, os homens de Vargas não apenas prendem Olga como acabam enviando-a à Alemanha em guerra (devido ao fato dela ser alemã de nascença). Lá, ela é presa em um campo de concentração, onde acaba dando à luz à filha do casal, Anita Leocádia. O tom é exageradamente épico e resvala em vários momentos no melodrama, mas a história é real e merece ser conhecida. Jayme Monjardim, acostumado com telenovelas de sucesso, estreia no cinema aos tropeços, em um filme que agradou o público – teve mais de 3 milhões de espectadores – porém decepcionou a crítica. Hoje em dia, mais de dez anos após seu lançamento, resiste melhor como uma pertinente peça sobre nossa história, que a despeito dos seus problemas possui valor inegável. – por Robledo Milani

 

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Tempos de Paz (2009)
Na Era Vargas, muitos dos que se opunham ao presidente e às suas convicções foram torturados. Em Tempos de Paz, com as pressões externas ocasionadas pelo fim da Segunda Guerra, vários presos políticos ganharam liberdade. Segismundo (Tony Ramos), um dos homens da polícia política de Vargas que aplicou a lei da violência contra a discordância, teme que suas vítimas do passado voltem para vingar-se. Realocado para a alfândega do Rio de Janeiro, ele agora trabalha com afinco para evitar que os derrotados nazistas cheguem ao país, aqui se exilando de maneira ilegal. Eis que Clausewitz (Dan Stulbach), ator polonês que pleiteia entrada no Brasil, cruza seu caminho, caindo no interrogatório que dirá muito sobre ambos e a situação político-social do mundo naquela época. O estrangeiro precisará convencer o cético funcionário do governo de que não se trata de um partidário do Führer. O longa de Daniel Filho tem um quê teatral, mas só se assim o consideramos em virtude da forma como se dá a maior parte da encenação, na sala de interrogatórios, local do embate entre aquele que inquire e o que precisa fazer-se acreditar para começar uma vida nova. Pouco afeita a discutir o período da Segunda Guerra, a cinematografia brasileira tem aqui um exemplar que ao menos busca refletir, partindo do íntimo ao geral, a convulsionada situação de então. – por Marcelo Müller

 

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Uma História de Amor e Fúria (2013)
É impressionante o que Luiz Bolognesi consegue realizar em Uma História de Amor e Fúria. Não é tão comum na cinematografia nacional uma animação – muito menos com temática tão adulta quanto este trabalho. Recontando a história do Brasil através de um personagem imortal, que vive momentos dos mais importantes do passado (e do futuro) do País, Bolognesi faz um interessante e premiado longa-metragem. Com as vozes de Selton Mello, Camila Pitanga e Rodrigo Santoro, o filme vai pulando de período em período, nos mostrando a vida do guerreiro imortal protagonista e sua paixão por Janaína, com quem se relaciona em cada momento de sua longa jornada. Um dos pontos altos da animação e o retrato da Balaiada, um dos principais conflitos do Brasil, acontecido no Maranhão entre 1838 e 1841. Neste seguimento, Selton Mello dá voz a Manuel Balaio, um dos líderes da revolta, que bate de frente com as tropas de Duque de Caxias. Temos filmes sobre a Guerra dos Farrapos e a Guerra de Canudos, mas a Balaiada ainda necessitava de um bom retrato nos cinemas, algo que foi realizado em Uma História de Amor e Fúria, ainda que seja apenas uma parte deste grande filme. – por Rodrigo de Oliveira

 

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O Tempo e o Vento (2013)
Adaptar as duas partes de O Continente, primeira história do épico literário O Tempo de o Vento, de Erico Verissimo, em um filme de pouco mais de duas horas não seria tarefa fácil para qualquer. O diretor Jayme Monjardim tem o maior cuidado em tentar pincelas todas as partes mais relevantes da obra (e é difícil dizer o que não é), mas acaba se perdendo ao não aprofundar muito as questões. Afinal, a obra, antes de mais nada, é um retrato da formação do Rio Grande do Sul a partir das missões jesuítas, das Revoluções Farroupilha e Federalista e até da Guerra do Paraguai. Todos estes momentos se encontram no filme, mas perdidos no meio do embate de séculos das famílias Terra/Cambará e os Amaral. Mas o filme está longe de ser ruim, apenas conduzido de forma inadequada. Não faltam momentos emocionantes, de beleza gráfica ou de tensão na guerra, especialmente quando o clássico Capitão Rodrigo (aqui na pele de Thiago Lacerda), representante máximo do “gaúcho macho” aparece para a luta. Para quem não leu a obra literária, é um bom início para começar a entender a história do estado gaúcho e, depois, desenvolver mais ainda nas páginas do livro. – por Matheus Bonez

 

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A Estrada 47 (2014)
Já vimos histórias a respeito da Segunda Grande Guerra vindas praticamente de todas as cinematografias do mundo. Mas, curiosamente, este período é um tanto esquecido pelos cineastas brasileiros que, muito raramente, se embrenham nesta temática em seus filmes. Por essas e por outras que A Estrada 47 é um exemplar raro e, portanto, muito recomendável para quem gosta de saber mais sobre aquele período histórico. O diretor Vicente Ferraz mostra um pequeno recorte daquele momento, dando cara aos pracinhas brasileiros que desempenharam papel importante na guerra. Mais do que um filme sobre o conflito, é uma história de coragem e perseverança. Chamam a atenção a direção de arte muito bem trabalhada, a fotografia que utiliza-se muito bem do branco da neve para contrastar os tons escuros daquela fria paisagem e, claro, o desempenho do elenco. Daniel de Oliveira, Julio Andrade, Thogun Teixeira e Francisco Gaspar formam um pelotão nada óbvio, com relacionamento cheio de rusgas e ressentimento. Além dos brasileiros, destacam-se participações do ator alemão Richard Sammel e o português Ivo Canelas. Com grande pesquisa histórica, filmado em locação na Itália e esmerado valor de produção, A Estrada 47 é um belo exemplar da cinematografia nacional, vencedor do Kikito de Melhor Filme no Festival de Gramado em 2014. – por Rodrigo de Oliveira

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