20171215 martirio papo de cinema

Dando continuidade à trilogia iniciada com Corumbiara (2009), e que será concluída com o vindouro Adeus, Capitão, o cineasta Vincent Carelli, em parceria com Tatiana Almeida e Ernesto de Carvalho, dedica este segundo capítulo, épico em sua duração de quase três horas, ao registro dos sucessivos massacres sofridos pela população Guarani Kaiowá desde os primórdios da colonização do Brasil. Contando com um vasto conteúdo, captado pelo diretor ao longo de mais de três décadas, e engenhosamente intercalado a materiais de arquivo, como noticiários televisivos, o longa constrói um panorama detalhado sobre o gradativo extermínio indígena promovido, essencialmente, por interesses econômicos, e pelo preconceito. Um extermínio que não se refere apenas ao aspecto físico, das mortes diárias dos membros das tribos que habitam a região de Mato Grosso pelas mãos de latifundiários, mas também ao cultural, com a memória da existência indígena sendo apagada pela imposição dos costumes do homem branco. Ainda que se mostre convencional em sua realização, a obra deixa transparecer uma estruturação eficiente, bem como um trabalho louvável de montagem, responsável por dar vazão, com clareza e contundência, à densidade monumental do material. Por meio dessa crueza formal, Carelli, indigenista e antropólogo que também narra o documentário, envolve sua denúncia em uma urgência tangível, capaz de comover – com os diversos relatos dos próprios Guarani Kaiowás sobre sua situação – e causar indignação – com as lamentáveis e surreais sessões do Congresso Nacional nas quais as questões indígenas são “debatidas” – na mesma medida. Um tratado na defesa de uma causa e que se assume como tal desde o princípio, mas, acima de tudo, um poderoso documento histórico/social que transcende a esfera cinematográfica.

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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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