Os primeiros minutos deste filme são de pura contemplação da natureza. Fernando (Paul Hamy), assim como sugere o título, observa espécies de pássaros a bordo de uma pequena canoa sob as águas, numa paisagem rodeada por rochedos e matas. Nessa catalogação de animais voadores, o protagonista se perde e cai no rio. É aí que a floresta, tão submissa nas imagens, começa a tomar uma forma de horror para o protagonista que se vê numa trajetória em que o homem é assimilado pela natureza, não mais a controlando como ele tão bem acha saber fazer. A coprodução entre Portugal e Brasil tem a assinatura de João Pedro Rodrigues que, mais uma vez, utiliza a sexualidade para contar uma história permeada pela quebra do ceticismo, imagens religiosas e a regressão do homem para seu estado mais bestial. As imagens podem até chocar o espectador menos acostumado com a filmografia do diretor. Se o pau excitado marcado na cueca branca de Fernando amarrado por cordas já não for o bastante, logo na primeira meia hora de filme, o que dizer de cenas que utilizam fetiches como o pissing (pessoas que tem tesão por xixi) ou a transa do personagem principal com uma representação de Cristo na sua clássica forma de homem, cabelos compridos e olhos azuis? Rodrigues causa polêmica, mas não por leviandade. O cineasta desconstrói arquétipos e lembra a todos de que da terra viemos e para lá voltaremos, assim como diz a Bíblia. Longe de uma simples crítica à religião e espiritualidade, mas questionador da mesma forma, o longa não tem medo de cutucar com vara curta as maiores expressões de divindade. Para Rodrigues, não há dogma que não possa ser quebrado. E sua bela construção de imagens torna este exemplar em cinema do mais alto nível.