Provavelmente, em 2017 nenhum outro filme ficou tão entre acirrados “AMO” e “ODEIO” como Mãe!. Também pudera, já que poucos arriscaram tanto. Darren Aronofsky, oriundo da cena independente, foi prontamente cooptado pela indústria num passado recente, mas não se deixou reduzir a um mero timoneiro que executa a rota pré-determinada pelos estúdios. Aqui ele pega dois grandes astros, Jennifer Lawrence e Javier Bardem, e os coloca numa casa isolada, fazendo-os interagir em meio a um estranhamento latente, acirrado com crescente violência à medida que a moradia passa a ser abrigo de desconhecidos. Aos poucos, os signos religiosos vão se impondo. Ed Harris faz às vezes de Adão, cuja cúmplice é a Eva vivida por Michelle Pfeiffer. O fratricídio remete a Caim e a Abel e as simbologias cristãs não param por aí. Uma claustrofobia cada vez mais opressora se abate sobre a mulher desorientada – ótima interpretação de Lawrence, aliás – diante das intrusões constantes, fruto de uma habilidosa conjugação de sons e imagens conceitualmente entrecruzados para transmitir ao espectador um pouco da experiência da mulher, um amálgama de figuras simbólicas, como a virgem Maria e a Mãe Natureza. Bardem, por sua vez, é retratado como um Deus colérico e absolutamente vaidoso, que chega a sacrificar seu filho recém-nascido para alimentar o próprio ego. A analogia com a crucificação de Cristo é evidente e contundente. Num circuito geralmente tomado por mesmices, movidos por engrenagens que frequentemente absorvem talentos para extirpar deles a personalidade em prol da produção, é extremamente bem-vindo o ímpeto de Aronofsky, essa despirocada consciente, cujo resultado é um filme corajoso e, antes de qualquer coisa, uma experiência cinematográfica ímpar.
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