“O rigor formal que caracteriza o cinema de Yorgos Lanthimos marca, igualmente, A Favorita, primeiro longa-metragem de época do diretor grego. As tomadas feitas com lentes grande-angulares, que aqui distorcem cenários para projetar a deformidade moral da corte inglesa; as mudanças céleres de perspectivas; a trilha intermitente que ora sinaliza, ora prenuncia acontecimentos importantes. Todos são traços de uma assinatura. Todavia, tais elementos não estão dispostos na telona para, apenas, celebrar o estilo, pois em função de uma história que envolve peças moralmente dúbias – para dizer o mínimo –, privilegiadas pelo lugar de nobreza do qual gozam no século XVIII. É, também, uma realização que salta aos olhos, imediatamente, pela meticulosidade do elenco na delineação das personagens. Elas simbolizam a sordidez que não resiste aos códigos implícitos e explícitos da realeza afeita a brigas intestinas por poder e posições de destaque que deem a impressão de superioridade (…) Um dos sintomas da singularidade desse olhar enviesado que Yorgos Lanthimos lança sobre a gente excêntrica dos palacetes repletos de tapeçarias e suntuosas peças de decoração é justamente a forma como ele recorre à escatologia para contrapor o luxo. Em diversos momentos, pessoas se referem a odores fétidos – como os ‘comentários políticos’ da população descontente que defeca à beira dos castelos –, regurgitam jantares grandiosos e convivem com feridas pustulentas, ou seja, deixam transparecer a decrepitude de sua humanidade”.
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