MOSTRA DE CINEMA DE GOSTOSO (23 a 27 de novembro) – Prêmio da Imprensa
Catadora de Gente, de Mirela Kruel, exibido em vários festivais de cinema do país, é um retrato singelo, arguto e absolutamente sensível de uma personalidade cativante. Maria Tugira da Silva Cardoso, catadora de lixo em Uruguaiana, município fronteiriço do Rio Grande do Sul, fala com propriedade e desprendimento de sua trajetória sofrida, de uma vida levada à base das sobras alheias. A captura dos depoimentos acontece de maneira direta, com a personagem contra um fundo preto, indeterminado. Mirela compreende a potência da fala de Tugira e depura os elementos ao seu redor a fim de valorizar a sua retórica. Excertos poéticos entrecruzam as falas, inclusive com atrizes brevemente fazendo às vezes da protagonista quando jovem. Todavia, o grande ativo do curta-metragem é justamente a clareza de Tugira diante de um sistema amplamente excludente, sobre o qual teve informação pela curiosidade fomentada durante as leituras de obras descartadas. Da constituição brasileira extraiu a ciência de seus direitos de cidadã. Das prosas de Machado de Assis e Jorge Amado, a eloquência que torna ainda mais carismática a sua retórica. Ela é um típico caso de resistência, ao ódio racial (ser negra a torna alvo) e à ojeriza dos mais abastados, por ser pobre e subsistir de um trabalho por muitos considerado insalubre. Catadora de Gente lhe faz jus, pois fornece espaço suficiente para a manifestação da história de superação, com algumas dificuldades sucumbindo diante da tenacidade de uma mulher como tantas outras.
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