PANORAMA COISA DE CINEMA (11 a 21 de novembro) – Júri oficial
A vida de uma mulher, mãe a proletária, numa cidade de São Paulo desalmada, capaz de cometer violências para manter a roda girando normalmente. O começo de Mesmo com Tanta Agonia se dá na cozinha de um restaurante de luxo, onde um chefe vocifera ordens enquanto seus subalternos preparam e empratam. A câmera de Alice Andrade Drummond permanece na altura do balcão, registrando as minúcias do trabalho. O diálogo no fim do expediente ajuda a desenhar a brutalidade daquela circunstância corriqueira, marcada por endinheirados pagando centenas de reais por refeições bem apresentadas, saborosas por conta do talento e esforço de gente que precisa se espremer entre os demais corpos cansados no metrô nosso de cada dia a fim de voltar para casa. O curta-metragem vai deixando essas pistas durante um percurso sensível, aparentemente destituído de uma vontade prontamente manifestada. É, portanto, nas entrelinhas que o discurso ganha tônus. De um lado, a crueldade institucionalizada, vide a ordem dos metroviários para seguir em frente mesmo com um corpo inerte nos trilhos. Do outro, o esforço para fazer a criança feliz com uma festa de limousine, reproduzindo comportamentos de ostentação pertinentes aos bem de vida com o intuito genuíno de pertencer. Mesmo com Tanta Agonia faz uma radiografia simples, porém efetiva, da metrópole marcada por abismos e de quem se esforça diariamente para existir dignamente.
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