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Sinopse

Arman tem 33 anos e resolve mudar de vida. Para começar, começa a correr no parque aos sábados. No primeiro dia, conhece Amélie. A primeira impressão é de um choque, a segunda será uma punhalada no coração. Benjamin é o melhor amigo de Arman. Entre dois outonos e três invernos as vidas de Amélie, Arman e Benjamin se cruzam, cheias de encontros, acidentes, histórias de amor e memórias.

Crítica

Os franceses fazem como ninguém filmes românticos agridoces, nos quais um final relativamente conciliador é precedido de elucubrações que deflagram as dificuldades efetivas dos relacionamentos. Aliás, essa afirmação não é exatamente precisa, pois Woody Allen talvez seja, realmente, o nome de referência no que tange a esse tipo específico de dramédia. 2 Outonos e 3 Invernos bebe escancaradamente na fonte de Noivo Neurótico, Noiva Nervosa (1977), especialmente por permitir que os personagens se dirijam diretamente ao espectador para comentar as circunstâncias, a fim de estreitar o caminho ao entendimento das complexidades sentimentais. Todavia, diferentemente do inspirador oscarizado, a produção de Sébastien Betbeder utiliza esse artifício como muleta, um simples facilitador. Dessa forma, não somos instigados pelas personalidades se chocando em cirandas afetivas repletas de amores e desencontros naturais, pois convidados a algo que se assemelha a uma visita guiada, não desprovida de qualidades, mas muito filtrada intermitentemente.

2 Outonos e 3 Invernos é protagonizado por Arman (Vincent Macaigne), sujeito de 33 anos que começa negando-se a falar de sua ocupação profissional, dizendo que tal informação não é importante para o compreendermos essencialmente. Portanto, somos restritos ao contato com suas questões amorosas, mais especificamente com o trajeto curioso do seu enredamento pela jovem Amélie (Maud Wyler), cuja situação de perigo iminente gera literalmente um buraco em sua barriga e acarreta a aproximação que ele tanto almejava. Entre idas e vindas, com o longa-metragem dividido em breves capítulos de títulos espirituosos, vemos a intimidade crescente entre os dois, bem como a convalescença do amigo Benjamin (Bastien Bouillon) que, a despeito da juventude, sofre um acidente vascular cerebral, permanecendo durante um bom tempo entrevado numa cama. O realizador injeta determinados elementos na trama, valiosos apenas pelo caráter insólito, vide a telepatia do acamado com a irmã, cuja repercussão é mínima ou absolutamente irrelevante.

Os personagens de 2 Outonos e 3 Invernos falam ora deslocados dos contextos, em fundos deliberadamente falsos, ora interrompendo o fluxo natural das cenas, quebrando desavergonhadamente a quarta parede. Especialmente por ser utilizado sem parcimônia, como uma constante que logo perde frescor e força dramática, o recurso rapidamente cai na banalidade. Os estragos dos efeitos colaterais só não são mais sentidos por conta do ótimo trabalho do elenco, encarregado de manter o interesse nessas pessoas que não têm certeza dos passos tomados, constantemente pressionadas por dúvidas facilmente identificáveis, pois corriqueiras. Arman não sofre grandes transformações ao longo da trama, se restringindo a agir nem sempre racionalmente, e posteriormente a ficar ruminando sobre as coisas que não deram certo. O modus operandi é semelhante ao das demais figuras ali observadas, algo que fica ainda mais evidente com a entrada em cena de Katia (Audrey Bastien), namorada de Benjamin, que o ajuda a se recuperar do AVC.

Se o decurso desses amores não traz qualquer novidade para o filão, Sébastien Betbeder se esforça no sentido de sublinhar a singularidades. Um dos dispositivos para dar conta disso é a menção frequente de filmes e discos, suportes à delineação de particularidades. Todavia, esse traço é meramente instrumental. As rápidas discussões acerca de longas de Eugène Green e Judd Apatow – dois cineastas de trabalhos formalmente díspares, provavelmente para deflagrar o ecletismo dos rapazes –, assim como a menção a um exemplar preto e branco, supostamente um dos favoritos de Katia, não se expandem, tampouco representam algo numa dimensão simbólica. Estão ali, pura e simplesmente, para encaixar o quarteto numa classe média dada a ocasionais devaneios artísticos e existenciais. Sem eventos capazes de gerar guinadas substanciais, o roteiro se fundamenta nos imprevisíveis desígnios do coração, dando-lhes uma roupagem dinâmica, mas bem indutora.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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