Crítica


3

Leitores


5 votos 6.8

Onde Assistir

Sinopse

Elle tenta equilibrar seu relacionamento à distância, a universidade e os amigos. Ao conhecer um colega maravilhoso, ela se questiona sobre aquilo que realmente deseja.

Crítica

Não é novidade que boa parte das comédias românticas acabam pecando, numa comparação com a realidade, pela excessiva idealização dos relacionamentos amorosos. Quando circunscrito ao âmbito adolescente, o gênero vem acumulando ainda outras simplificações, tratando os jovens como poços de dúvidas a serem relativamente sanadas após jornadas de aprendizado com doses cavalares de moralismo. Cinema também pode ser área de escape, por certo, não precisando observar o lado menos bonito e sombrio das pessoas e de suas atitudes. Mas, é importante perceber de que maneira um filme “vende” ideias, se deliberadamente como um conto de fadas diante do qual voluntariamente nos desarmamos em prol da fábula ou se na condição de um simulacro reducionista. A Barraca do Beijo 2, assim como seu antecessor, até lida com as dificuldades enfrentadas por Elle (Joey King), mas acaba evitando as curvas mais sinuosas, suavizando as guinadas e sempre deixando claro aos torcedores do romance principal que no final das contas tudo vai dar certo. Além disso, impera uma lógica bastante chupada da saga Crepúsculo, dentro de uma fatura de execução agradável.

No primeiro filme, a protagonista era uma adolescente do nível intermediário do universo secundarista. Nem invisível, tampouco popular. Essa colocação social era de certa forma importante, especialmente depois que Elle passa a ser cortejada pelo veterano mais cobiçado do local, o atlético Noah (Jacob Elordi). Em A Barraca do Beijo 2 o colégio é praticamente irrelevante, servindo apenas de mero cenário para as pessoas centrais se encontrarem cotidianamente. No longa inaugural, a personagem de Joey King era apresentada às agruras de crescer, incluindo a escolha entre a companhia do melhor amigo, Lee (Joel Courtney), e o amor improvável interditado pelas regras escritas na infância. Aqui ela se transforma numa espécie de Bella Swan, mas ao invés de ser disputada por um vampiro brilhoso e um lobisomem imberbe, permanece entre o príncipe encantado distante e o latin lover igualmente caidinho por ela. Pegando carona na onda antiquada observada em diversos de seus congêneres, o filme relega o sexo a meras citações, não o levando séria e adultamente em consideração.

O cineasta Vince Marcello perfaz o caminho carola tomado pelo longa-metragem inicial, chegando ao ponto de expandir o conservadorismo aplicado nas cirandas amorosas. Em A Barraca do Beijo até existia uma sensualidade, sufocada, mas havia migalhas dela nas frestas. Já A Barraca do Beijo 2 sustenta que o único fator capaz de fazer alguém mobilizar-se por outrem é o amor, sentimento puro que uma vez verbalizado por Lee no microfone da escola, por exemplo, causa comoção desproporcional, o que sinaliza o artificialismo. Elle é blindada de qualquer potencial controvérsia, sobretudo porque tem de ser vista como a boa moça que toma atitudes condizentes com as “meninas de bem” diante das vicissitudes. Ela se enreda por Marco (Taylor Zakhar Perez) apenas por suspeitar que o namorado está possivelmente a traindo. Até para rechaçar esse vínculo que lhe pesa na consciência, evoca a falta de paixão, passando muito longe de assumir que o desejo é um elemento a ser colocado na balança. Afora isso, repetições denotam falta de ideias, como os desagravos infantis de Lee.

Se há uma coisa positiva em A Barraca do Beijo 2 é o fato de ir na contramão do clichê que nega a existência da amizade entre homens e mulheres sem segundas intenções. No entanto, pena que isso decorra de outra aparagem de aresta, o rechace de que os melhores amigos de infância podem sentir algo além de amizade. Embora na obra original em nenhum momento Elle e Lee ensaiem algo distante da fraternidade de sempre, é possível captar fagulhas que, ao menos, apontam à complexidade de sentimentos que evidentemente não controlamos integralmente. Outro ponto pouco discutido nesta sequência cheia de figuras fofas é a autonomia da protagonista, assunto especialmente suscitado diante da necessidade de escolher a universidade para prosseguir a vida acadêmica. Novamente presa num dilema – como frente a Noah e Marco –, ela fica dividida entre agradar o namorado ou atender às expectativas do melhor amigo, sequer demonstrando o que verdadeiramente quer. Mais um indício dessa visão fantasiosa que comporta ainda o envolvimento homossexual pudico, milimetricamente concebido para não ofender as suscetibilidades conservadoras, ou seja, romantizado como o resto, e a sustentação de que basta querer para colocar seu estrépito interno em ordem.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
avatar
Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
avatar

Últimos artigos deMarcelo Müller (Ver Tudo)

Grade crítica

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *