Crítica
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Sinopse
Um agricultor se muda para um terreno remoto sob ameaça de excomunhão da igreja. Coisas estranhas começam a acontecer nesse terreno que faz divisa com uma floresta onde, de acordo com os mitos, mora um mal inominável.
Crítica
No começo de 2015, um pequeno filme, feito de forma bastante discreta e por um realizador praticamente desconhecido – o diretor e roteirista Robert Eggers – tomou o Festival de Sundance (palco principal de lançamento de produções independentes nos Estados Unidos) de assalto, conquistando não só o prêmio de Direção como também aplausos entusiasmados da audiência. Estamos falando de A Bruxa, longa que, curiosamente, tem entre seus produtores o brasileiro Rodrigo Teixeira – leia-se RT Features – também responsável por sucessos indies como Frances Ha (2012) ou o polêmico Love (2015). Mas ao contrário do modismo temporal do primeiro ou do frenesi gratuito do segundo, esse lançamento mais recente possui não apenas uma estética interessante, mas também conteúdo de sobre para justificar a atenção recebida.
Nova Inglaterra, 1630. Uma família é expulsa da comunidade onde vivem acusada de envolvimento com feitiçaria e magia negra, reação provocada pelo fanatismo religioso extremo dos pais. Afastados de tudo e todos, tentam recomeçar enfrentando as mais duras condições, sitiados no meio do nada. O distanciamento parece lhes fazer bem num primeiro momento, mas logo os problemas recomeçam. Afinal, o que está errado não vem de fora, mas de dentro daquele núcleo – ou seria tal impressão equivocada? Colaboram para criar esse clima de opressão e constante pavor a fotografia plasticamente estudada de Jarin Blaschke, eficiente em colocar o público diante dos dilemas enfrentados pelos protagonistas de uma trama passada séculos atrás como se fossem experiências contemporâneas. A identificação é imediata, e isso serve apenas para aumentar o grau de horror experimentado em ambos os lados da tela.
O pai é a força bruta, mas também o olhar caridoso. A mãe é pura tensão, culpa e acusações. A filha mais velha tenta manter a sanidade, enquanto que o menino luta para demonstrar maturidade, ainda que sua escassa idade lhe contradiga. O casal de crianças menores parecem tão angelicais quanto demoníacas – tudo é uma questão de ponto de vista – enquanto que o bebê... bem, esse tem pouco a nos dizer. E não por não saber como – afinal, certos olhares falam mais do que mil palavras – mas simplesmente por não possuir tempo hábil para isso. No meio de uma brincadeira inocente, ele some sem deixar rastros, de modo inexplicável. A suspeita recai imediatamente na primogênita, responsável por cuidar dele. A família se divide, uns acreditando na inocência dela, outros acusando-a de bruxaria e outras maldições piores. Mas estaria ali na cabana onde vivem a origem do mal ou embrenhada na mata do lado do pequeno rancho?
A teoria conspiratória que começa a se desenvolver a partir desse instante vai envolvendo a todos sem misericórdia. Atuações poderosas de Ralph Nelson (Harry Potter e o Enigma do Príncipe, 2009) e de Kate Dickie (Game of Thrones, 2011-2014), como os patriarcas, se unem à revelação Anya Taylor-Joy (cujo único crédito anterior é uma participação discreta em Academia de Vampiros: O Beijo das Sombras, 2014), que rouba a cena a cada aparição, mantendo em suspenso a todo instante a verdadeira natureza de sua personagem. Culpada ou injustiçada, esse será um veredito que talvez somente no além seja possível averiguar. E por isso, quando se ouve a voz cruel de Black Phillip, encarnada na ovelha negra de olhar estático, tudo possa desandar em uma conclusão aterrorizante.
A Bruxa não é filme para consumo barato e imediato, como tantos outros sucessos do gênero. Os esforços aqui reunidos revelam uma obra refinada, que brinca com o ato de assustar de forma responsável, com parcimônia e bastante cuidado, sem revelar nada além da conta e medindo com sabedoria cada nova revelação. O sobrenatural se une a um medo genuíno, vítima do preconceito e da ignorância, motivada por questões sociais e religiosas que tanto poderiam estar em voga na época retratada como nos dias de hoje. Afinal, tais ameaças podem ter as mais variadas formas, inexplicáveis ou não, e muito mais assustadoras e irremediáveis são quando as reconhecemos no próprio reflexo.
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