Crítica
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Sinopse
Um jovem executivo é incumbido de resgatar o CEO da empresa de um centro de bem-estar nos Alpes Suíços. Prontamente ele desconfia dos tratamentos supostamente milagrosos do lugar, contatando segredos horripilantes.
Crítica
Bastam poucos minutos para que o espectador se convença que o apelo visual é o mais forte dos estímulos provocados diante de uma sessão de A Cura. São cenas em que se percebe a atenção a todo e qualquer tipo de detalhe, em que a direção de fotografia esmera-se em alcançar o inexplicável e que o cuidado estético supera em muito a atenção à ordem dos acontecimentos. Tudo em nome de uma bela imagem, ainda que, a mesma, não faça muito sentido. Aos poucos, no entanto, estas escolhas começam a fazer sentido. Não dentro de um contexto narrativo, mas diante os nomes envolvidos. Afinal, Gore Verbinski é um realizador conhecido por títulos como O Chamado (2002) e a trilogia inicial Piratas do Caribe, filmes cujos méritos estavam mais no estilo do que no conteúdo. E o mesmo se repete aqui, aliado ao roteiro escrito em parceria com Justin Haythe – os dois fizeram juntos, antes, o malfadado O Cavaleiro Solitário (2013). E como se percebe, provam de vez que um raio pode, sim, cair duas vezes no mesmo infeliz lugar.
É importante perceber que, por maior que seja a boa vontade do espectador, Verbinski esforça-se para se indispor com sua audiência por insistir em uma série de escolhas equivocadas. Para começar, temos Dane DeHaan, um ator com cara de adolescente que é escalado para viver um frio e calculista homem de negócios. Ok, perdoa-se essa escolha pela recorrente desculpa de que são os jovens que movimentam a economia – será mesmo? Pego em uma negociata escusa por seus superiores, recebe uma missão como último recurso para salvar sua pele: ir até os Alpes Suíços atrás de um diretor da empresa que, sob o pretexto de se recuperar de um forte stress, internou-se em um spa renomado internacionalmente. Ele seria o homem certo, portanto, para levar a culpa pelos atuais problemas da companhia – graças a sua instabilidade emocional – e ainda possibilitar sua fusão em um negócio milionário. O problema, no entanto, é que ele não quer mais voltar. Aliás, não quer é sair do tal centro de recuperação. Assim, abandona-se o ar urbano do início da trama e muda-se, história e produção, para um castelo medieval encravado no meio da Europa.
A decisão, que num primeiro instante parece acertada – leva-se o enredo a uma jornada por um ambiente ao mesmo tempo velho conhecido e totalmente inesperado. Reza a lenda que o lugar pertenceu a um barão que, obcecado pela pureza de sua linhagem, tentou casar-se com a própria irmã, ato que teria motivado uma rebelião nos aldeões próximos, que não teriam impedido a cerimônia como matado os dois e incendiado o lugar. Isso, no entanto, teria acontecido dois séculos atrás. Hoje em dia, o lugar é um amplo e asséptico hospital no qual seus internos, na sua grande maioria acima dos 70 anos, lá estão há anos, sem o menor interesse em retornarem aos seus lugares de origem. “O segredo está na água”, é o que dizem. Mas há outros mistérios por ali. Pena que eles não demorem muito para irem se revelando atabalhoadamente, de forma descontrolada e imprecisa. Chega-se ao ponto, inclusive, de mudar o foco de visão assumido desde o começo pelo enredo. Se até aquele momento todas as cenas são mostradas a partir do ponto de vista do protagonista, como explicar o encontro do diretor da instituição (Jason Isaacs) com a única adolescente do lugar (Mia Goth, de Ninfomaníaca: Volume 2, 2013) no quarto dela, longe de todos os demais olhares? Descuidos que evidenciam um preciosismo mais plástico do que estrutural.
Pois bem, uma vez lá, Lockhart (DeHaan) – que, foneticamente, assemelha-se a “Coração Fechado” – rapidamente descobre que até para ele será difícil voltar para casa. Primeiro, é um cervo que se atira na frente do carro que está lhe levando embora (em uma cena idêntica a vista há mais de uma década em O Chamado 2, 2005). Uma perna engessada, acusações de desidratação (“mas como, se tudo o que fazemos é beber água?”) e passagens subterrâneas irão aumentado o desconforto tanto do personagem quanto do espectador mais atento. Neste ponto, o roteiro revela outra de suas falhas: a redundância. Em mais de uma ocasião o protagonista se pegará investigando salas e corredores desocupados, invadindo o grande salão do jantar ou tentando fugir sorrateiramente, apenas para retornar após o primeiro passo em falso. Tamanho descuido na condução dos eventos resulta em uma obra com quase 2h30min de duração – cuja trama, tão simplória quanto absurda, poderia ser tranquilamente resolvida com uma hora a menos.
E assim chegamos ao derradeiro passo em falso de A Cura: sua inconstância. Nenhum dos tipos com o quais aqui nos confrontamos são o que dizem ser, e não por culpa deles, mas pela incerteza do roteirista e do diretor em sustentá-los diante uma evidente ausência de motivações críveis. Assim, aposta-se no grotesco e no fantástico para se justificar, ainda que pelo uso de recursos deus ex machina, efeitos que, de qualquer outra forma, menor sentido teriam. O mocinho é dominado, enfim, pelo mesmo mal que se assoma de todos os demais, apenas para se recuperar no momento exato ao alcance do final feliz – mas teria sido assim mesmo? Verbinski comprova, de vez, ser apenas um artesão – e não um dos mais eficientes – que, mais uma vez, almeja um grau de excelência que, obviamente, está além do seu alcance. Por isso exagera-se no uso da trilha sonora, investe em uma beleza plástica tão vazia quanto artificial, e aposta-se em posturas que brincam com a percepção do espectador, porém sem se sustentar diante qualquer questionamento. Que diferença um David Cronenberg, um Paul Verhoeven ou, quiçá, um Stanley Kubrick (O Iluminado, 1980, é apenas uma das tantas referências diante das quais esse resultado aqui apresentado deveria se envergonhar) fariam com um argumento desses em mãos.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Robledo Milani | 4 |
Alysson Oliveira | 4 |
Francisco Carbone | 3 |
Sarah Lyra | 4 |
Chico Fireman | 4 |
MÉDIA | 3.8 |
Um dos piores filmes do milênio. Soa como uma mistura desastrada de filme de terror gore com fábula teen. A produção luxuosa, o visual plasticamente impecável, o uso e abuso da trilha sonora deliberadamente exagerada e as referências a Guillermo del Toro, Stanley Kubrick, Thomas Mann e H. P. Lovecraft somados a um enredo ridículo, um péssimo roteiro e atuações de uma dramaticidade forçada resultam num filme absurdamente risível. Em mais de duas horas de tortura à inteligência humana, Gore Verbinski prova que, de boas intenções e pretensão, o inferno está cheio. Que saudade do Gore Verbinski de O Chamado. The Ring tinha uma estética bem moderninha pro início dos anos 2000 - dava medo, tinha uma roteiro intrincado, mas redondo, influenciou bastante parte da produção cinematográfica da década e, de quebra, gerou um ícone do terror: Samara. Que saudade também do Verbinski da primeira trilogia Piratas do Caribe, cuja única pretensão era divertir e cumpria 100% da promessa com muito estilo, produção luxuosa, homenagens ao cinemão pipoca dos anos 1940 e 1950 e um elenco literalmente fantástico. Pena que a experiência nem sempre é sinônimo de aprendizado.