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Sinopse

Um carcereiro tem um relacionamento incomum com um preso que se encontra no corredor na morte: Coffey, condenado por ter matado brutalmente duas gêmeas de nove anos. Ele tem tamanho e força para ter cometido o crime, mas seu comportamento é completamente oposto à sua aparência. Além de ser simples, ingênuo e ter pavor do escuro, possui um dom sobrenatural.

Crítica

Segundo longa-metragem para cinema de Frank Darabont, lançado cinco anos após Um Sonho de Liberdade (1994), À Espera de Um Milagre é, como seu antecessor, adaptado de uma história de Stephen King ambientada em uma prisão. O diretor parece ter encontrado, naquele momento, uma espécie de fórmula do sucesso nesse tipo de material – vale lembrar que seu trabalho anterior, apesar de fracassado nas bilheterias, foi indicado a sete Oscars e tornou-se fenômeno no home video, ocupando até hoje, e já há algum tempo, o posto de filme melhor avaliado pelos usuários da principal base de dados cinematográficos da internet, o Internet Movie Database (IMDb). Muito em decorrência disso, À Espera de Um Milagre contou com elenco de peso, capitaneado pelo maior astro da Hollywood de então (Tom Hanks), e foi lançado nos cinemas como forte candidato ao prêmio da Academia – de fato, acabou lembrado em quatro categorias, incluindo a principal, num ano de pesada concorrência.

Trata-se, portanto, de uma obra que é fruto do prestígio alcançado por Darabont com seu trabalho anterior, o que lhe deu poder e liberdade para tocar esse projeto maior. Isso fica visível no resultado fílmico. À Espera de Um Milagre carrega, ao mesmo tempo, a paixão de seu realizador pelo universo em que se baseia – a literatura de King, à qual Darabont retornou novamente naquele que é, até o momento, seu último trabalho no cinema, o atordoante O Nevoeiro (2007) – e os excessos advindos da ausência de freio a essa paixão. O principal mérito do filme é conseguir transformar em imagens o olhar mágico de King para o mundo. O autor, muito associado ao gênero horror, carrega na verdade um encantamento com o mistério da existência humana e uma crença absoluta na magia como motor dessa última – a dedicatória deixada por ele a seus filhos no livro It: A Coisa, por exemplo, é emblemática nesse sentido: “Crianças, a ficção é a verdade dentro da mentira, e a verdade desta ficção é bem simples: a magia existe”.

Em À Espera de Um Milagre, tem-se a realidade dura do corredor da morte, onde trabalha o protagonista Paul Edgecomb (Hanks) e seus subordinados, os bondosos Brutus (David Morse), Dean (Barry Pepper) e Harry (Jeffrey DeMunn, parceiro habitual de Darabont), além do odioso Percy (Doug Hutchinson). O cineasta, partindo de King, propõe uma abordagem à lá Frank Capra para esses personagens, focando com proposital ingenuidade em seus valores positivos – Hanks já demonstra sua propensão a ser uma espécie de novo James Stewart, que se confirmou posteriormente em alguns dos filmes que fez com Steven Spielberg, como O Terminal (2004) e Ponte dos Espiões (2015) – e transformando a única laranja podre desse cesto, Percy, num vilão quase cartunesco. Mas é quando o prisioneiro John Coffey (Michael Clarke Duncan) – que combina, em si, porte amedrontador, atitude inofensiva, já que sempre próxima da infantilidade, e a condenação por um crime brutal – começa a revelar seus atributos que À Espera de Um Milagre mergulha de fato no mundo mágico de King. Magia que é, aqui, literal, diferentemente, portanto, de outros filmes mais “sérios” adaptados desse escritor, como o próprio Um Sonho de LiberdadeO Aprendiz (1998) e Conta Comigo (1986).

Darabont opta por estabelecer a dinâmica entre esses homens sem qualquer pressa, o que, a princípio, é um acerto, já que o tempo dado a eles torna suas relações mais críveis. No entanto, o diretor e roteirista exagera nesse aspecto, incluindo na narrativa momentos que talvez pudessem ser deixados de fora, já que por demais marginais à trama central – como as repetidas provocações feitas aos policiais por “Wild Bill” Wharton (Sam Rockwell), figura que, graças ao destaque desproporcional obtido, adquire certa aura folclórica naquele universo, tornando um tanto incoerente, quase um Deus Ex-Machina, a solução dada a ela no clímax (seria mais interessante que Wharton recebesse tratamento semelhante ao do personagem de Um Sonho de Liberdade que exerce função equivalente na narrativa, com presença breve na tela e nenhuma chance para exercer qualquer carisma). Mas o maior (sem trocadilho) problema do filme é mesmo John Coffey. Interpretado por Clarke Duncan num único tom do início ao fim, o personagem, que deveria ser adorável, apaixonante, se revela por vezes irritante. E há em À Espera de Um Milagre uma cena, pouco antes do epílogo, que, protagonizada por ele e Patricia Clarkson, se entrega à cafonice numa medida que a torna digna de qualquer novela das seis de temática espiritualista.

Ainda assim, trata-se de um belo drama americano de matriz capriana, que recupera com competência a ingenuidade desse cinema dos anos 30 e 40 – difícil não se lembrar de A Felicidade Não Se Compra (1946), também dono de considerável dose de magia literal – e emociona justamente por apostar radicalmente nas características que o constituíam. Logo na sequência de sua carreira, aliás, Darabont deu mais um passo nessa direção, com Cine Majestic (2001), retumbante fracasso de crítica e público. Talvez tenha faltado ao filme a base sólida do material de King, ao qual o realizador voltou, como dito anteriormente, alguns anos depois em O Nevoeiro – mas, aí, já com interesses bem menos ingênuos.

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é um historiador que fez do cinema seu maior prazer, estudando temas ligados à Sétima Arte na graduação, no mestrado e no doutorado. Brinca de escrever sobre filmes na internet desde 2003, mantendo seu atual blog, o Crônicas Cinéfilas, desde 2008. Reza, todos os dias, para seus dois deuses: Billy Wilder e Alfred Hitchcock.
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