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Sinopse
A Espuma dos Dias: Conta a história de Colin, garoto belo, rico e desocupado, que encontre Chloé. Os dois se apaixonam e se casam, mas Chloé tem uma doença: uma flor nasceu em seus pulmões. Para curá-la, serão necessárias flores - milhares de flores. Com Romain Duris e Audrey Tautou.
Crítica
Michel Gondry vem de uma tradição que entende o audiovisual como instalação artística. Sua parceria de longa data com Björk, de quem dirigiu vários clipes, eleva o estilo do cineasta a expoentes máximos, seja em vídeos-dispositivos, como o clipe de "Declare Independence", seja construindo um imaginário artificialista e obscuro, como em "Bachelorette". O diretor faz ainda algumas experiências que beiram o cinema estrutural, como no fantástico vídeo de "Star Guitar", dos Chemical Brothers. Com A Espuma dos Dias, ele mais uma vez dialoga com suas origens.
No entanto, toda essa carga estilística parecia filtrada e reduzida quando Gondry dirigia filmes de ficção para estúdios famosos. Mesmo o oscarizado Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças (2004), visto como transgressor pelo grande público, soa comportado perto do que o diretor apronta no campo do videoclipe. Esse comedimento só veio crescendo ao longo do tempo, resultando no despropositado O Besouro Verde (2011). Assim, é com alegria que os fãs verão o diretor "voltar com tudo" em A Espuma dos Dias, filme que acaba de chegar a alguns cinemas brasileiros (e no qual o próprio Gondry faz uma ponta, como o Dr. Mangemanche).
Baseado num romance cult de Boris Vian, o longa conta a história de Colin, uma espécie de dândi parisiense, cujo carisma cresce na pele do galã Romain Duris. Ele vive com seu criado Nicolas (Omar Sy) e um ratinho (Sacha Bourdo), o que por si só denuncia o caráter onírico do longa. Ao perceber que seus amigos estão sempre com mulheres enquanto ele azeda os dias sozinho, Colin decide sair e se apaixonar. É quando conhece Chloé (Audrey Tautou, curiosamente parecida com Björk). No entanto, este relacionamento será marcado pelo trágico, quando ela contrai uma doença rara: há uma flor de lótus crescendo em seu pulmão.
Em primeiro lugar, cabe notar que, embora o filme tenha uma influência significativa do surrealismo (especialmente em sua direção de arte e figurino), é do existencialismo que deriva sua lógica. O mesmo pode ser dito do romance do qual foi adaptado: embora Vian fosse simpatizante do primeiro, sua identificação maior se dava com o anarquismo político e o existencialismo filosófico, especialmente Sartre, citado diretamente em A Espuma dos Dias. O melhor amigo de Colin, Chick (um divertido Gad Elmaleh), é fanático por um filósofo chamado Jean-Sol Partre (anagrama óbvio de Jean-Paul Sartre). A caricatura do filósofo não está ali por acaso: sua ideia de que a existência humana não tem propósito e que o aceitamento e a compreensão disso permitiria lidar melhor com a angústia de existir é praticamente uma síntese do que corre nas entrelinhas da trama principal, já adaptada para os palcos em forma de ópera pelo compositor russo Edison Denisov.
Sutil, a fotografia assume uma interessante função narrativa e vai "mutando" ao longo do filme, criando uma ambiência precisa e expressionista em relação aos seus personagens. A trilha sonora acompanha este movimento e premia o espectador com pérolas como a excelente "Spring", de Mia Doi Todd.
O uso do stop-motion para animar o inanimado e gerar situações fantásticas é um ponto tão divertido quanto estranho do longa, fazendo tudo parecer, eventualmente, o Castelo Rá-Tim-Bum – o que só é um problema para aqueles que não gostam de um cinema menos naturalista. Curiosamente, o recurso também lembra bastante as experiências de Luiz Fernando Carvalho como Capitu (2008), Hoje é Dia de Maria (2005) e A Pedra do Reino (2007). Vale ficar atento ao ar retrô usado pelo design de produção, que não economiza no uso de máquinas de escrever, gramofones, ternos enxutos, penteados clássicos, padronagens e televisões de tubo. Referências pra deixar qualquer hipster babando.
Estes, aliás, também vão se deliciar com as alusões ao jazz. Além de escritor, Vian também foi compositor e cantor do gênero, sendo admirador de Duke Ellington, por exemplo, que aparece citado diretamente no filme e no livro. A cena do baile, em que todos dançam ao som do tradicional ritmo norte-americano, leva a esquisitice ao ápice, deliciando os olhos enquanto provoca a mente.
As simbologias, tão caras a Gondry, também têm um papel importante. O colar de Alise (Aïssa Maïga) em forma de uma espécie de besouro, por exemplo, é uma referência direta ao símbolo da morte no Egito Antigo, traço reforçado por suas ações, sua etnia e sua aparência. Analogias também aparecem na incapacidade de Colin de "gerar" armas ou no próprio fato de que, para se curar, Chloé precisa estar cercada de flores, numa composição que sempre parece um funeral. A decrepitude crescente da casa de Colin é como seu "retrato de Dorian Gray" e por aí vai. Para quem gosta de procurar essas pistas escondidas, A Espuma dos Dias é um prato cheio.
Por fim, quem fala francês se divertirá bastante ao notar os trocadilhos (um dos melhores diz respeito a uma bandeja de petits fours), anagramas, neologismos e brincadeiras com palavras, infelizmente intraduzíveis nas legendas. Tal artifício também está presente no romance de Vian, dialogando com James Joyce, e, neste caso, expondo a fidelidade do roteiro, escrito por Luc Bossi, ao material original.
Com sua camada simbólica complexa e farta em esquisitice, A Espuma dos Dias não é exatamente um encantador de multidões. No entanto, quem estiver disposto a encarar experiências estéticas diferentes será recompensado com a mais fina flor do estilo de um diretor que, agora está claro, ainda tem muito o que mostrar.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Dimas Tadeu | 8 |
Robledo Milani | 8 |
Chico Fireman | 6 |
Alysson Oliveira | 6 |
MÉDIA | 7 |
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