A Estrada 47

Crítica

O Brasil se esquece de si com facilidade. Essa é a impressão que A Estrada 47, coprodução com Portugal e Itália, nos deixa ao tocar em um episódio importante e quase silencioso da história do país. Escrito e dirigido por Vicente Ferraz (Soy Cuba: O mamute siberiano, 2005), o longa conta o drama de um grupo de engenheiros enviados pela Força Expedicionária Brasileira (FEB) para auxiliar os Aliados durante a Segunda Guerra, na Itália.

O enredo, que em outros países poderia estar a esta altura saturado, chega aqui com ares de novidade dramatúrgica e até certa surpresa. O pano de fundo é a batalha brasileira em Monte Castelo. Guimarães (Daniel de Oliveira), Tenente (Julio Andrade), Piauí (Francisco Gaspar) e Laurindo (Thogun) são os soldados da divisão de minas que, após uma operação tumultuada, se perdem e acabam isolados em meio ao fogo inimigo. Sem comunicação ou viabilidade técnica para se reagruparem, o grupo é dado por perdido.

Esquecidos entre um exército de esquecidos e despreparados, seja tática, técnica ou psicologicamente. Assim o filme de Ferraz salienta a condição dos brasileiros em combate e a introduz como componente dramático importante, ainda que pudesse tê-la entregue de maneira mais refinada, privilegiando as situações e não os diálogos. A escolha, por exemplo, em retratar o estado anímico dos homens por meio da narração em off das cartas não é um problema em si, mas dificilmente consegue resultado outro que não a emoção barata e o constrangimento psicológico forçado.

O roteiro acerta ao trazer para o seu núcleo outros personagens, que, introduzidos de forma comedida, tornam o enredo elaborado e evitam a obviedade. É o caso do soldado alemão vivido por Richard Sammel e o personagem de Rui (Ivo Canelas), jornalista que se junta ao grupo perdido de maneira independente, assinalando um atrito bastante interessante entre a FEB e a imprensa. O destaque, porém, não vêm das inclusões, mas do personagem de Piauí. Espelho nítido do Brasil – ou do seu estereótipo – o pracinha tem os melhores momentos do grupo. Ainda que em algumas cenas extrapole o registro realista em nome do humor, Piauí, como o nome indica, é o elo de reconhecimento com o público – o herói à la brasileira.

Outros destaques da produção são a boa fotografia de Carlos de Montis (o mesmo do excelente documentário O Ato de Matar, 2012) e a direção de arte rigorosa de Sergio Tribastone (O Homem das Estrelas, 1995). Num todo, A Estrada 47 supera as próprias fragilidades e se apresenta como um filme competente e de bons momentos.

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Willian Silveira

é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação dos Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul, e da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Tem formação em Filosofia e em Letras, estudou cinema na Escola Técnica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Acumulou experiências ao trabalhar como produtor, roteirista e assistente de direção de curtas-metragens.

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