Crítica


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Sinopse

Os Addams são uma família rica e excêntrica, que adora o macabro e que, ao mesmo tempo, não se dá conta, ou simplesmente não se importa, que outras pessoas os achem bizarros ou assustadores. Quando se mudam para uma nova cidade, seus costumes um tanto estranhos entram logo em choque com os moradores locais, dando início a uma verdadeira guerra.

Crítica

Desde o princípio dessa animação com os personagens criados por Charles Addams, o clã que dá nome à produção é visto como passível de perseguição por ser diferente. A Família Addams é uma história de origem, com o casamento entre Gomez e Mortícia, o encontro com o mordomo Tropeço (numa situação impagável) e um subsequente clipe que dá conta, por meio das fotografias que registram a passagem dos 13 anos, de mostrar como as coisas foram se desenvolvendo no topo da colina escolhida como local de fixa moradia. Fazendo jus à tradição dessas figuras na contramão geral, infortúnios, depressões, tristezas e estados de espírito sorumbáticos são apresentados como nutrientes essenciais, motrizes da gente que brinca com a morte e faz pouco dos fantasmas possessivos. É bastante divertido o desenho das estratégias e situações macabras enquanto pilares do cotidiano. Mas há subtextos nutridos ao largo da simples aventura de tintas funestas.

Um dos principais elementos de A Família Addams é a relação, lotada de expectativas e, por isso mesmo, propensa a frustrações, entre pais e filhos. Feioso, por exemplo, está sendo preparado para protagonizar um ritual que marcará sua passagem à maioridade. Especialista em explosivos, ele tem dificuldade enorme para lidar com o sabre da cerimônia a ser testemunhada pelos parentes bizarros. Mesmo que os cineastas Greg Tiernan e Conrad Vernon não se aprofundem nesse empenho de Gomez a fim de fazer o caçula empunhar devidamente a tradição familiar, a observação está ali, claramente posta e associada às singulares tensões entre Vandinha e Mortícia, especialmente quando esta demonstra querer libertar-se da rotina modorrenta e encontrar o mundo para além do nevoeiro que confere um clima terrífico à propriedade dos ricos Addams.

Mesmo que não mergulhe de cabeça nesses e noutros apontamentos importantes, inclusive para ambientar a tramas na atualidade, os realizadores atingem um satisfatório equilíbrio entre traquinagens e gags visualmente criativas e tais pontuações que dizem respeito às esferas pessoais e sociais. Margô Agulha, apresentadora de um programa de reformas residenciais, aparece como a vilã, imediatamente contraposta aos Addams pelo efusivo colorido de suas vestimentas. No núcleo dela há questões curiosas, como outra versão do choque entre mãe e filha – encarregado de adensar a noção de que nem sempre os herdeiros se sentem confortáveis com a vida que os pais almejam para eles – e uma igualmente breve menção às fake news. Uma pena que não haja um estudo mais intenso da hipocrisia dos “cidadãos de bem” que, a despeito das próprias esquisitices, apontam desbragadamente o dedo para os moradores da colina, como se suas diferenças fossem perigosas.

A Família Addams tem passagens hilárias, como as manifestações de Vandinha sobre o mundo, então visto a partir de um prisma peculiar e sombrio. Mesmo que lance mão de uma conciliação um tanto artificial, especialmente em função de seu estabelecimento forçado, o longa-metragem valoriza o legado de Charles Addams, triscando nas mencionadas noções de suma importância, circunstancialmente atingindo um patamar acima da média recente. A importância de seguir o próprio caminho, de eventualmente negar os trajetos pré-determinados à revelia de nossa vontade, é outra ideia construída no entrecruzamento das jornadas particulares de Vandinha e de sua amiga ávida por libertar-se da tirania das roupas vivazes e do cotidiano asfixiante concebido pela mãe. A igualmente vital valorização de quem se é está na missão assumida a contragosto por Feioso. Não à toa essa relação pais e filhos é constantemente sublinhada, ao ponto de Mortícia não sair da cama sem retocar o visual com as cinzas de seus genitores mortos. Nada mais Addams do que isso.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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