Crítica
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Sinopse
Morro do Vidigal, Rio de Janeiro. Rita deseja dar para o filho uma festa de aniversário. Porém, descobre que todo o dinheiro do evento, que vinha economizando há meses, foi roubado por seu marido, que contraiu uma dívida perigosa e precisa pagar urgente para salvar sua vida. A partir dessa desilusão, ela terá que correr contra o tempo.
Crítica
Sabe aquele tipo de filme no qual um monte de coisa sem importância acontece, uma após a outra, apenas para impedir o – ou prolongar a ansiedade do – protagonista de alcançar o seu verdadeiro intento? Eis aqui, portanto, mais um que faz parte dessa linhagem. A Festa de Léo, filme de Luciana Bezerra e Gustavo Melo, possui em seu argumento uma linha muito direta: uma mãe preocupada em fazer a melhor festa de aniversário possível ao filho. No entanto, entre um ponto e outro – o desejar e o conseguir – o que se verá é quase uma gincana de situações improváveis, tarefas a serem alcançadas e empecilhos que deverão ser contornados. Nos meandros de cada dificuldade que surge em seu caminho, uma pitada de crítica social, um reflexo do abandono do estado e um tanto de análise de costumes. Ou seja, um pouco de Brasil em um filme feito por quem vive essa realidade no seu cotidiano – ou, ao menos, dela já pertenceu. Essa autenticidade é o que de melhor o conjunto tem a oferecer, um sinal de alento em meio a um entremeio que nunca parece dar liga na medida das expectativas levantadas.
Cintia Rosa é o nome do elenco ao qual se deve prestar atenção. Atriz com mais de duas décadas de carreira, ao longo dos anos trabalhou com diretores como Rosane Svartman, José Padilha, Jeferson De, Daniel Filho e Murilo Salles, entre outros. Foi com esse último, no drama político O Fim e os Meios (2015), que teve uma das suas primeiras oportunidades como protagonista. Ela retoma essa condição como Rita, uma moradora do Morro do Vidigal, no Rio de Janeiro. O dia começou bem, com presente na cama para o filho e nada mais do que algumas horas tranquilas pela frente, sem ter que ir trabalhar na praia, atendendo turistas. Tirou o dia para si, e o plano é se ocupar com os preparativos da festa. Mas nem tudo é o que parece. Afinal, quando a programação é esmiuçada até o último detalhe, não há espaço para imprevistos, e estes irão ditar a ordem dos acontecimentos. O maior dos problemas: Dudu, pai do menino, está devendo para os traficantes da região, e caso sua dívida não seja paga, o preço passará a ser o seu pescoço. E agora, o que é mais importante: a alegria da criança ou a segurança deste que não parece estar muito ciente do que se passa com sua própria família?
Focada no que tem pela frente e segura de si, Cintia Rosa faz de sua Rita uma mãe coragem, daquelas mulheres que não desistem mesmo quando tudo parece apontar o contrário. O compromisso assumido com o garoto não é esquecido, mas a urgência do drama paterno termina por atropelá-lo. É engraçado, pois não se trata de uma data que tradicionalmente merece uma comemoração mais planejada, como 15 anos, nascimento ou mesmo primeiro ano. E nem de uma menina, que costumam demandar esse tipo de atenção. É legal a preocupação materna, mas não se trata de um dia particularmente especial. Assim, o que merecia um olhar mais profundo seria a maneira como o pai é visto. Quem é esse homem, afinal? Quantas vezes ele já os decepcionou? Como pode o afeto do filho soar quase inabalável, ao passo que o da esposa há muito se mostra esmaecido? Um ou outro diálogo – principalmente com a bisa, participação carinhosa de Neusa Borges – tentam se encarregar dessas explicações. Mas não dão conta de uma complexidade apenas percebida, mas nunca investigada tal qual se poderia esperar.
Luciana Bezerra e Gustavo Melo não são estreantes – ela foi uma das realizadoras de 5x Favela: Agora Por Nós Mesmos (2010), enquanto que ele, além de diversos curtas, dirigiu episódios da série Mais X Favela (2011-2014) – mas, mesmo assim, este filme tem sido anunciado como “o primeiro longa de ficção, tendo como um dos diretores uma moradora de favela, a chegar às salas de cinema”. O pioneirismo é interessante, mas que se reforce: ninguém por aqui é novato. Muitos dos talentos envolvidos, tanto à frente quanto atrás das câmeras, vieram de grupos como o Nós do Morro, e estão na luta há anos. Jonathan Haagensen, que aparece como Dudu, estreou no sucesso Cidade de Deus (2002), assim como outros tantos que também por aqui marcam presença: Thiago Martins, Marcelo Mello Jr, Babu Santana, Mary Sheila e Roberta Rodrigues. Era de esperar, diante tamanho envolvimento em comum, que essa mesma sintonia transparecesse na tela. Mas a ausência de uma mão firme que os conduza é que termina por chamar atenção.
Desde os primeiros minutos, qualquer espectador um pouco mais atento conseguirá antever qual será o desfecho de A Festa de Léo (se o final feliz não fosse esperado, no mínimo o título seria outro). Sem temer por uma não resolução dos conflitos, resta apenas acompanhar as andanças da protagonista, que entre arrumar dinheiro de última hora para pagar um botijão de gás (uma sequência particularmente desengonçada e cansativa) e um enfrentamento diante de uma mentira contada pelo filho em defesa do pai notoriamente malandro (passagem tensa e que explora uma postura assertiva da intérprete), ela sabe bem a qual destino se encaminhar. Era evidente a vontade de todos em tornar esse projeto realidade: o que, de fato, conseguiram, e por isso merecem os parabéns. Pena que, nesse intuito, não houve também um maior comprometimento em fazer desta uma obra relevante não apenas pelo que reúne nos bastidores, mas também por seu tecido narrativo e ficcional. A esse, entre tropeços e pontas soltas, o máximo que se pode é torcer por uma nova chance. Algo que nem sempre vem na velocidade que se merece.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Robledo Milani | 5 |
Chico Fireman | 7 |
Alysson Oliveira | 4 |
Francisco Carbone | 7 |
Suzana Uchôa Itiberê | 6 |
MÉDIA | 5.8 |
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