Crítica
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Sinopse
Um padre é brutalmente assassinado na França em 1956. Ao tentar investigar a natureza do crime, a Irmã Irene se depara com Valak, a freira demoníaca. Na companhia da Irmã Debra, Irene precisa derrotar a inimiga demoníaca.
Crítica
O terror/horror possui várias possibilidades e direções fascinantes. Chamá-lo de “menor” seria desrespeitar uma tradição e demonstrar enorme falta de conhecimento. Estamos falando de um gênero cuja matéria-prima essencial é o medo, sensação com incontáveis nascentes: o temor do desconhecido, a inquietação diante do inusitado, o frio na espinha frente às mudanças comuns ao crescimento, o pavor provocado pela maldade humana, etc. A Freira 2 situa sua fonte de medo e, a partir dela, tenta (sem conseguir) propagar a onda amedrontadora. A protagonista é a Irmã Irene (Taissa Farmiga), religiosa que lutou bravamente contra um espírito maligno e sobreviveu para contar história. Depois do retorno da assombração bizarra – ateando fogo num padre –, a Igreja Católica pede a Irene que enfrente novamente o capiroto vestido de freira. Desse modo, o cenário é bem claro. Temos a ameaça sobrenatural e a pessoa que pode vencê-la. No entanto, o mais novo longa-metragem da Saga Invocação do Mal é, antes de qualquer coisa, um filme religioso. E a chave para compreendermos esse discurso está, vejam só, na Irmã Debra (Storm Reid), especificamente em seu trajeto de iluminação rumo à crença. Mesmo sendo, no máximo, a escudeira fiel da protagonista, ela é quem precisa aprender a lição valiosa antes de o mal ser derrotado. No fim das contas, as vitórias são concedidas somente aos crentes.
Contraponto da fé inabalável e da bondade de Irene, Debra é apresentada como rebelde, fumante e questionadora dos dogmas. Ela chega a perguntar como é possível acreditar que um ser humano transformaria vinho comum no sangue de Jesus Cristo (se referindo ao padre numa celebração cristã). Então Irene diz algo do tipo “é a fé que faz isso, você precisa ter fé”. Não percam este panorama de vista: temos em cena uma pessoa descrente que precisa ser agraciada com o dom de acreditar para prover a derrota do mal. No entanto, não é apenas por conta dessa coadjuvante que podemos considerar A Freira 2 uma produção fundamentalmente religiosa. Paralelamente à jornada de Irene e Debra temos a pequena Sophie (Katelyn Rose Downey) sofrendo bullying das colegas de internato em que sua mãe leciona. As endiabradas meninas que não lhe deixam em paz também azucrinam a diretora idosa da instituição ao colocar baratas em seu quarto. Pois bem, mais à frente, quando a freira capirota ataca justamente esse lugar, as garotas serão punidas por terem feito coisas erradas e não passarem pela contrição (o arrependimento) – inclusive provando do próprio veneno. A conexão lógica das ações faz com que sintamos menos pena das jovens atacadas, afinal de contas elas torturaram uma “inocente”. É um jogo de manipulação narrativa para torcermos pelo moralismo punitivista do cristianismo.
A construção da atmosfera de terror em A Freira 2 deixa a desejar. O cineasta Michael Chaves não consegue imprimir uma sensação de horror latente, nem quando recorre aos famigerados jump scare (mudança abrupta de eventos para causar susto). Ele sequer aproveita bem a mitologia cristã envolvendo os olhos de Santa Luzia e a provável busca do demônio pela clarividência de quando era um anjo alado a serviço de Deus. Aliás, pausa para outro aspecto de valorização do discurso religioso: a vilã nada mais é do que uma ex-serva celestial expulsa do paraíso por sua insolência – como a Irmã Debra. O filme parece a todo momento estar dizendo ao espectador “os mansos, fieis e obedientes herdarão o reino dos céus”, mas sem assumir de peito aberto a defesa da retórica cristã, camuflando-a de caçada nobre ao satanás. Além disso, há excesso de conveniências e atalhos mal justificados, como quando um bibliotecário detém convenientemente conhecimentos sobre o paradeiro de uma relíquia católica. Ou como quando Maurice (Jonas Bloquet) explica coisas do primeiro filme a fim de que um espectador desavisado não fique completamente perdido. Portanto, a atmosfera é pouco angustiante, a história fica dando círculos e sendo “cozinhada” por diálogos expositivos e movimentos previsíveis, isso enquanto é armada a grande arapuca de convencimento sobre a importância de temer a Deus.
Voltando a Debra, o elo fundamental entre a cobertura terrífica e recheio religioso de A Freira 2. Ainda que sirva estritamente como auxiliar da colega de convento e tenha poucos lampejos de subjetividade (além da rebeldia estereotipada), ela é peça-chave para vencer o demônio em busca de um tesouro poderoso. Michael Chaves não é sutil ao atrelar a vitória à conversão da personagem numa crente convicta, mesmo não tendo a coragem de assumir o discurso religioso gritante. Sem que Debra acredite com todas as suas forças em, por exemplo, transformar vinho comum no sangue de Cristo por advento da fé, o filme não oferece qualquer outra possibilidade de êxito diante da horrenda antagonista sobrenatural. No entanto, nem essa situação se sustenta completamente, pois Debra muda seu posicionamento cético somente depois de enxergar e ser alvo do espírito maligno, ou seja, não dá o famigerado salto de fé no escuro, sem a necessidade de comprovação e/ou garantia. Mas o realizador não está atento a essas (ou sequer interessado pelas) contradições entre crer de modo fervoroso e a necessidade de ver para crer. Continuação sonolenta e pouco inspirada, essa produção peca pelo excesso de lugares-comuns, pela falta de valorização da mitologia, pelo volume de aprendizados moralistas e pela defesa de Deus, bem como de aliados, vide a força dos olhos de Santa Luzia, santo remédio contra o mal. O saldo é um filme que utiliza o demônio como contraprova da existência de Deus.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 3 |
Alex Gonçalves | 5 |
Ticiano Osorio | 3 |
Carissa Vieira | 4 |
Alysson Oliveira | 1 |
Ailton Monteiro | 3 |
MÉDIA | 3.2 |
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