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Crítica


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Sinopse

As rotinas de sobrevivência, o estilo de vida e a cultura dos moradores de rua de São Paulo. Exclusão social, desemprego, alcoolismo, loucura, religiosidade e o roubo da imagem dessas comunidades abrem espaço para uma discussão ética dos processos de estetização da miséria.

Crítica

Vez que outra, o trabalho do crítico de cinema acaba por ser facilitado quando as respostas das falhas e acertos de alguns longas-metragens estão estampadas de forma gritante no filme em questão. É o que acontece com À Margem da Imagem, documentário de Evaldo Mocarzel que faz um interessante apanhado de diversas histórias tocantes sobre pessoas que vivem nas ruas. Ao final do longa-metragem, o diretor incluiu a première do documentário, feita especialmente para as pessoas que participaram da produção. E a resposta daqueles depoentes a respeito do resultado final do filme é tão pertinente que este crítico confessa: pensou não ser necessário um texto seu após aquelas críticas dos moradores de rua. De qualquer forma, é preciso algo resenhado para informar ao espectador que por ventura não teve oportunidade de assistir ao documentário, que o faça.

À Margem da Imagem é o primeiro filme da série criada por Mocarzel, complementada por À Margem do Concreto (2005), À Margem do Lixo (2008) e À Margem do Consumo (ainda inédito). Nele, o cineasta responde uma pergunta que muitos de nós já fizemos em algum ponto da vida, ao nos depararmos com um morador de rua: como aquela pessoa chegou ali? A resposta não é simples e é desenvolvida por um grupo nada homogêneo angariado pelo realizador.

Cascavel é um dos mais curiosos. Um senhor negro, cadeirante, que fala tão veloz quanto seu pensamento. Dono de coragem e certezas contundentes, Cascavel vive sua existência em um pequeno casebre montado debaixo de uma ponte, o máximo que conseguiu para chamar de casa. Em outro momento, igualmente curioso, conhecemos um senhor aparentemente culto e letrado, mas que fora sugado por forças ocultas em sua antiga casa, o que o fez abandonar o lar e, desde então, vive na rua, carregando seu caderno de anotações.

Mocarzel deixa seus depoentes contarem suas histórias com liberdade, montando um interessante e triste mosaico de situações. Pessoas que deixaram sua terra natal para tentar a sorte em São Paulo e não conseguiram, crianças que cresceram em orfanatos e se viram sem moradia ao final do período de permanência, idosos que perderam toda a família e vagam pelas ruas. Essas e outras duras realidades são mostradas pelo documentarista em À Margem da Imagem.

Ao seu final, como já dito, os moradores de rua fazem suas críticas ao filme e enxergam alguns pontos cruciais que a plateia em geral talvez não percebesse. A fome que os flagela é pouco mostrada e o preconceito perante os cidadãos sem teto é apenas mencionado, porém nunca mostrado. Curiosamente, em seu início, o filme contém um depoimento de uma freira que revela a proibição por parte de uma moradora de rua em ser clicada pelo grande fotógrafo Sebastião Salgado, pois a exploração midiática dos moradores de rua já é demasiada o suficiente para outro vir e fazê-lo. De alguma forma, o que Mocarzel faz não é muito diferente do que Salgado tentava ao fotografá-los. E a inclusão deste depoimento só reforça o fato do cineasta entender isso e tentar utilizar seu filme para ajuda-los de alguma forma. Não se sabe o quanto isso aconteceu, visto que o documentário infelizmente não é o gênero mais popular entre o público brasileiro. Mas só o fato de dar voz a pessoas que talvez nunca tivessem suas histórias ouvidas, já é algo de muito positivo.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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