Crítica
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Sinopse
A história de A Menina e o Dragão se passa no passado, quando dragões e humanos foram amigos. Mas a ganância dos homens destruiu essa aliança, fazendo com que as criaturas mágicas fossem caçadas e aprisionadas. Anos depois, a jovem Ping encontra o último dos dragões imperiais e decide ajudá-lo.
Crítica
Os animais fantásticos e mitológicos presentes no título e na trama de A Menina e o Dragão pouco têm em comum com aqueles vistos nas sagas descritas por George R.R. Martin ou J.R.R. Tolkien, apenas para ficar em dois nomes que são referências na literatura (e com suas adaptações para o cinema e/ou televisão) fantástica contemporânea. Os seres presentes nessa simpática animação são esguios e um tanto desengonçados, e se soltam fogo pelas ventas e voam pelos ares, assim o fazem em zigue-zague, com seus corpos compridos e atléticos, pouco volumosos e de impressionante agilidade. Trata-se, como se é possível perceber, de uma concepção mais oriental e menos europeia, portanto. Isso, provavelmente, explica o nome de Li Jianping (chinês) na direção. Mas ele não está sozinho, e quem assina ao seu lado é Salvador Simó (espanhol). Essa, afinal, é uma produção nascida na Espanha, porém falada na maior parte do tempo em inglês (Bill Nighy é um dos destaques do elenco de dubladores). A combinação, se num primeiro momento pode soar esdrúxula, acaba funcionando na maior parte do tempo, ainda que não necessariamente junto ao público ao qual projetos similares a esse geralmente se destinam.
Tal esclarecimento é importante pois um espectador desavisado poderia facilmente se induzido a vislumbrar esta como uma obra voltada a um público infantil. Sim, há uma criança à frente da maior parte da ação, mas os dilemas que ela enfrenta, assim como o resultado de suas ações, lhe cobram uma maturidade precoce. Da mesma forma, seus oponentes pouco parecem se importar com sua pouca idade. O que se encontra aqui é uma disputa por poder milenar, que não hesita em cobrar a vida de figuras mágicas em nome de uma condição que apenas poucos afortunados – ou impiedosos desprovidos de remorso – poderão experimentar. O sangue destes dragões é de imensa valia, e aquele que o dominar – seja na vida, como principalmente após a morte destes – se verá capaz de desfrutar o bem e o mal acima de qualquer lei dos homens. A disputa por assumir esta verdade cobrará um alto preço.
A protagonista de A Menina e o Dragão é, a despeito do que o batismo original possa dar a entender, mais a menina do que o animal. Ping é uma jovem órfã que desde cedo aprendeu que teria que se virar por conta própria, tendo poucas pessoas ao seu alcance em quem confiar. Quando uma das únicas a se importar com ela é punida em meio a um destempero emocional do senhor que governa o vilarejo onde moram, a garota chega à conclusão de que passar todos os seus dias apenas obedecendo poderá lhe reservar um destino igual. Assim, independente do que lhe é dito, se põe a investigar a origem da força daqueles que a aprisionam. É quando descobre dois dragões encarcerados, vivendo em masmorras debaixo de onde os homens transitam.
A fêmea já não tem muito tempo de vida, mas ao se deparar com Ping adquire a certeza de ter encontrado aquela que poderá seguir com a sua missão: cuidar e se responsabilizar pelo último ovo de dragão. É neste ponto que a bonita animação conduzida por Jianping e por Simó realmente mergulha em ambientes diferenciados. O traço pode ser mostrar um tanto acanhado, não tão dinâmico ou impressionante como aquele visto nas mais recentes produções hollywoodianas. Por outro lado, há uma sinergia entre narrativa e personagens que vai além de um mero esmero técnico, conduzindo o desenrolar dos acontecimentos a desfechos inesperados e decisões surpreendentes, abrindo mão de uma segurança comum a esse tipo de história.
Frente aos desafios apresentados, Ping vai descobrindo seu próprio valor, assim como o espectador, que identificará nela uma energia maior do que aquela que qualquer dragão poderia lhe emprestar. Eis, portanto, o maior dos méritos de um filme feito visando o mercado exterior, abrindo mão de características locais que pudessem reduzir seu campo de atuação, mas que, por meio de um outro caminho, termina por oferecer maior alcance a sua mensagem. A fantasia está presente, mas é não mais do que uma mola propulsora para aqueles que estão, enfim, com os pés bem próximos do chão. A Menina e o Dragão aponta para os céus na busca de um alívio momentâneo, mas o que revela está além da superfície: encontra-se nos meandros da transformação da criança abandonada em uma mulher dona do seu destino. Uma vez no controle de suas escolhas, o mundo se torna possível. Deixar a infância para trás pode ser um processo dolorido, mas é um primeiro passo necessário.
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