Crítica
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Sinopse
Anna é uma agorafóbica nova-iorquina que passa seus dias enchendo a cara, assistindo a filmes antigos e observando seus vizinhos. Certo dia ela testemunha algo aterrador no apartamento de uma suposta família perfeita.
Crítica
A Mulher na Janela é uma carta de amor de Joe Wright à Hollywood da Era de Ouro, período cinematográfico estadunidense entre os anos 1920 e 1960. E o cineasta elege seu célebre compatriota Alfred Hitchcock como principal alvo dessa devoção, espalhando ao longo da trama diversas menções a filmes do chamado Mestre do Suspense. A mais óbvia é evidentemente a Janela Indiscreta (1954), afinal de contas a protagonista, Anna Fox (Amy Adams), assim como o personagem de James Stewart no clássico dos anos 1950, está impossibilitada de sair de casa e acaba se distraindo diariamente ao bisbilhotar os vizinhos através da janela da frente. A certa altura, ela faz uso da câmera e de sua lente teleobjetiva. Citação mais escrachada possível. Além disso, há o inquilino vivido por Wyatt Russell que remete justamente a O Inquilino (1927), um dos principais filmes da fase britânica de Hitch, e que num certo instante revela-se condenado por estar no lugar e na hora impróprios, se encaixando no arquétipo hitchcockiano do homem errado, utilizado para mostrar o infortúnio de alguém inocente. Há ainda os planos zenitais no vazio de Um Corpo que Cai (1958) e o “fantasma” de Stewart.
Joe Wright se presta às comparações ao lançar mão ostensivamente de tantas referências. A Mulher na Janela não é intrincado como Janela Indiscreta, aliás, sequer passa perto de misturar, como sua matriz, o humor, a casualidade e o macabro. Tampouco consegue construir algo profundo/denso a partir das maternidades perturbadas/perturbadoras, como Alfred Hitchcock fez nas obras-primas Psicose (1960) e Os Pássaros (1963). Na companhia do fotógrafo vivido por James Stewart, somos levados a embarcar numa paranoia labiríntica que perde gradativamente o caráter de abelhudice inocente e ganha natureza tétrica. Com a personagem interpretada por Amy Adams, o convite é de outra lavra. A perturbação psicológica da protagonista pretende instaurar a ideia da falta de confiabilidade da “narradora”. Embora a mulher não descreva acontecimentos e noções em off, essa lógica se dá porque somos levados a objetivamente compartilhar essa perspectiva, ou seja, ver o que ela vê, reter da realidade o que Anna consegue perceber, mesmo lotada de remédios e álcool.
Porém, a reverência de Joe Wright à Era de Ouro não se restringe às homenagens desbragadas à Alfred Hitchcock. Ela também é visível na decupagem, na composição estilizada dos quadros, na iluminação expressiva que refuta o naturalismo em prol de intenção e intensidade dramática. Um dos principais elementos dessa conjuração fetichista é justamente a fotografia a cargo de Bruno Delbonnel. O esqueleto sustenta uma história de gato e rato acontecendo na mente perturbada de quem não consegue sair de casa. Agorafóbica, Anna, no entanto, não tem problemas de interagir com visitantes ocasionais, tais como a mãe e o filho recém-chegados. O maior calcanhar de Aquiles aqui é a antecipação de certos desdobramentos. Por exemplo, o testemunho de um suposto assassinato, ocasião em que não enxergamos o agressor, apenas a vítima se esvaindo em sangue. Tudo aponta tão gritantemente à possível culpa do sujeito irritadiço ao ponto de abrir uma porta para a desconfiança recair imediatamente sobre aquele entendido claramente como inocente.
Joe Wright capricha na produção, mas privilegia o tributo em detrimento do resto. As tomadas de Anna alcoolizada assistindo a emblemas do cinema norte-americano viram um deleite aos que partilham dessa admiração. No entanto, são elementos puramente nostálgicos, pois não estão a serviço de uma conjuração efetiva. Nem a integridade da verdade é questionada habilmente. Fatos aparentemente inquestionáveis surgem, logo depois são desmentidos, Anna é colocada em dúvida pelos interlocutores que sabem de sua condição mental e o improvável (que tem desde sempre cara de provável) arremata. Certa vez, Alfred Hitchcock definiu suspense com a imagem de uma bomba explodindo embaixo da mesa. Se o espectador não sabe do artefato mortal prestes a estourar, levará apenas um susto momentâneo. Mas, caso o cineasta dê a ele mais do que aos personagens, informando previamente a existência de algo mortal, isso gera suspense. Wright planta algo “sob a mesa”, deixa o pavio aparecendo (será que é uma bomba?), faz de tudo para que não entendamos aquilo como petardo, lá pelas tantas permite ouvir um tique-taque sintomático, mostra o estouro já incapaz de mobilizar tanto e concluí com uma estranha e deslocada menção visual ao slasher dos anos 1980.
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Fala, Daniel, beleza? Primeiramente, muito obrigado pela leitura e o feedback. Pensando aqui a partir das tuas colocações, geralmente não costumo mesmo me debruçar muito sobre os desempenhos do elenco nos meus textos, quando muito fazendo uma rubrica. De fato a Amy Adams está excelente, mas o que me chamou a atenção foi justamente essa arquitetura reverente fetichista e como isso poderia render um fruto melhor. De todo modo, valeu demais por nos prestigiar, mais uma vez, com o carinho de sempre. Grande abraço
Adorei a crítica, mas confesso que senti falta de algum comentário do trabalho em si da atriz protagonista (fala-se de intenções dos realizadores, referências, direção, fotografia, mas nada de como está a Amy, que é apenas citada), ainda mais quando, me pareceu, que é um filme que se contrói inteiramente ao redor da personagem dela...