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Sinopse

Emmanuelle Blachey é uma dedicada executiva numa renomada empresa francesa. Ela passou toda a sua carreira tentando não trazer à tona e usar a seu favor a real diferença trabalhista que existe entre homens e mulheres. Contudo, ao encontrar uma barreira misógina para subir profissionalmente, e com uma série de problemas pessoais, ela parece não ter outra opção.

Crítica

A proximidade do Dia Internacional da Mulher costuma movimentar a mídia, o comércio e também as rodas de conversas masculinas. Afinal, parece ser o tempo anual reservado pelos homens para valorizar as mulheres que os cercam durante todos os outros 364 dias, sem pestanejar. No mundo empresarial, é costume que as poucas presidentes de grandes corporações e demais funcionárias sejam agraciadas com flores e chocolates, presentes que, desde tempos imemoriais, são considerados femininos. A estreia no Brasil de um filme como A Número Um, produção de 2016, mas atual como nunca, pode também ser considerada um presente às mulheres. Porém, não deve agradar uma boa parcela do público masculino.

Dirigido pela também atriz Tonie Marshall, A Número Um acompanha a transformação de Emmanuelle Blachey, interpretada de forma brilhante por Emmanuelle Devos. Essa mudança não é apenas profissional, já que a maior metamorfose da personagem se dá em seu modo de observar as atitudes masculinas dentro do ambiente de trabalho. Executiva de uma importante empresa de energia eólica, ela recebe, durante uma convenção, o convite para conhecer um clube feminista encabeçado por Adrienne, defensora ferrenha da presença das mulheres no mundo corporativo. Emmanuelle é colocada dentro de um plano para assumir a presidência de uma empresa de água francesa e tornar-se a primeira mulher no cargo. Seria uma oferta e tanto para sua carreira e à luta contra a misoginia, mas Emmanuelle nunca se envolveu com o feminismo e, como muitas outras mulheres, sempre preferiu focar em seu trabalho e não nos detalhes machistas do meio. Esse traço da protagonista é o que permite a A Número Um conter cenas emblemáticas para os nossos tempos.

Para além do roteiro inteligente e da montagem criativa, o filme de Marshall tem o trunfo da interpretação sutil e certeira de Davos para apresentar situações bastante comuns na vida das mulheres, sejam elas altas executivas ou singelas funcionárias. A blusa abotoada antes da reunião, a fim de evitar comentários sobre o decote, os quadros comemorativos da empresa repletos de homens, a mão do chefe sobre a perna durante uma conversa que deveria ser apenas sobre negócios e a simpatia com os sócios encarada como estratégia de sedução, são apenas alguns dos momentos retratados no longa de forma que apenas uma diretora conseguiria abordar. Não que um homem não possa ter um olhar respeitoso e incentivador ao gênero oposto, mas mesmo o mais descontruído deles corre o risco de cair na armadilha do “as coisas sempre foram assim”. Marshall coloca em xeque essa máxima. Muitas coisas continuam iguais, mas não nos calamos mais com a mesma facilidade.

A jornada de Emmanuelle rumo à uma vida mais questionadora não acontece por meio da leitura de teóricas feministas, mas através da vivência com outras mulheres que ajudam a tirar o véu do machismo de sua visão. Isso colabora não apenas para seu crescimento profissional, mas também a leva a uma quebra de barreiras íntimas, envolvendo a misteriosa morte da mãe e a relação conflituosa com o pai. Nesse caso, não é Freud quem irá explicar, mas nomes como o da escritora Margareth Atwood, citada já nas primeiras cenas de A Número Um.

Antes mesmo de apresentar sua principal personagem, já que todas as mulheres do longa possuem seu momento de protagonismo, o filme tem uma cena rápida, mas que vai ganhar seu real significado após os créditos finais. Emmanuelle sofre um esbarrão de outra mulher ao sair do aeroporto e não ouve sequer um pedido de desculpas. Encara com certa naturalidade a falta de educação da moça, até que outra mulher percebe o ocorrido e a incentiva a soltar uma bela indireta. Sororidade pura. Ajudar a próxima, naquele momento do filme, era algo quase impossível para Emmanuelle e sua eterna desconfiança na amizade e colaboração sincera entre mulheres. Ela não será a mesma depois da odisseia contra os homens que a cercam e seus próprios fantasmas. Sou do time que não acredita que um filme precise ter uma lição final, uma mensagem. Mas se fosse para identificar uma em A Número Um, ela seria que feminismo importa e muda vidas. De mulheres e homens.

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é jornalista e especialista em cinema formada pelo Centro Universitário Franciscano (UNIFRA). Com diversas publicações, participou da obra Uma história a cada filme (UFSM, vol. 4). Na academia, seu foco é o cinema oriental, com ênfase na obra do cineasta Akira Kurosawa, e o cinema independente americano, analisando as questões fílmicas e antropológicas que envolveram a parceria entre o diretor John Cassavetes e sua esposa, a atriz Gena Rowlands.
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Bianca Zasso
9
Francisco Carbone
5
MÉDIA
7

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