Crítica
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Sinopse
Um grupo de amigos se encontra todos os anos para celebrar um aniversário. Desta vez, em uma vila à beira-mar, algo está diferente: eles descobrem que o mundo vai acabar em apenas algumas horas.
Crítica
O que você faria se soubesse que o mundo está prestes a acabar? A questão, que transita entre o retórico ao absurdo, é posta como ponto de partida aos personagens de A Ordem do Tempo, longa assinado pela veterana realizadora italiana Liliana Cavani. A cineasta responsável por títulos que até hoje são referência, como O Porteiro da Noite (1974), com Dirk Bogarde, ou A Pele (1981), com Burt Lancaster e Marcello Mastroianni, agora entrega uma obra, curiosamente, menos pretenciosa e mais acomodada do que muitos dos seus trabalhos anteriores, por mais que sua premissa pareça apontar justamente o contrário. A situação proposta se revela limitada pelo recorte ao qual a realizadora se debruça: um grupo de amigos dotados de condições privilegiadas e aparentemente alheios ao que se passa ao redor deles. Poderia, a partir disso, abrir espaço para um viés crítico, mas não chega a tanto. Uma vez que esses tentam se compadecer, mas sem conseguir deixar de ser aquilo que se mostram em seus âmagos. Estão mais preocupados com futilidades, como um amor perdido ou o paradeiro de uma filha rebelde (mas nem tanto), do que diante da ameaça que se aproxima. E assim, atravessam as duas horas seguintes imersos em discussões vazias e movimentos sem consequência.
Em um retiro litorâneo, um casal convida os amigos mais próximos para um fim de semana de comemoração. É aniversário dela, e ao seu lado estão aqueles que lhes são queridos. Durante o brinde de parabéns, ela se declara para a melhor amiga, colega do tempo de faculdade, a quem se dirige como seu “único e verdadeiro amor”. O marido observa a manifestação com o coração apertado, mas resignado, sem fúria ou indignação. Já um dos membros da confraria precisa ser convencido aos demais se juntar quando o que o chama afirma que “Paola” já chegou – e a expectativa de reencontro com uma antiga paixão é suficiente para uma mudança de ideia. Sendo que aquilo que estava retardando essa tomada de decisão era justamente a ciência de que um asteroide está se aproximando da Terra a uma velocidade inimaginável, e uma eventual colisão pode significar o fim de tudo e todos. Tudo é uma questão de prioridades, como se percebe.
O curioso é que a mulher citada é casada, o que não a impede de ter momentos a sós com o recém-chegado. Mas são passagens de muita conversa e pouca ação, como parece ser a tônica destes relacionamentos. Assim como uma outra que sabe de um envolvimento homossexual do companheiro no passado, e a esta citação se refere como “foi por isso que fiquei com você, porque mais do que um marido, queria um amigo ao meu lado”. Ele, por sua vez, sorri de satisfação, como se desprovido de vontade própria. São pessoas de grande valia, principalmente na forma como se veem. São cientistas, físicos, economistas, empresários, doutores e autoridades em seus campos. Mesmo assim, nada de pânico, desespero, ou atitudes concretas. Afinal, o que parece importar de fato é que cada um garanta a sua fatia do bolo (de aniversário), mesmo que seja o último. A única que demonstra algum tipo de insatisfação frente ao cenário que se aproxima é a jornalista – do The Guardian, de Londres, evidentemente – mas sua revolta se dirige mais à decisão das autoridades em não alertar o público e menos em investigar o que está acontecendo. Mais uma cheia de discurso, mas ausente de repercussões.
Esse grupo insensível ao mundo exterior não está sozinho, no entanto. A empregada, vivida por Mariana Tamayo, está ali perto, porém com poucas oportunidades de assumir qualquer tipo de protagonismo. É ela a primeira a levantar o assunto, a temer pelos seus, a exigir algum tipo de explicação. É também quem decide fazer algo – voltar para sua terra natal em busca de algum tipo de segurança e conforto que, naquele cenário, lhe é negado – e quem, de uma forma ou de outra, provoca um mínimo de sensibilidade e humanismo entre aqueles que está servindo. Chama atenção uma cena calculada para comover o espectador, que tem início em um momento idílico frente ao poder transformador da arte. A partir disso, os convidados passam a se alinhar um ao lado do outro, e vão progressivamente sendo tomados por uma sensação de gratidão e felicidade coletiva. Quando menos esperam, estão dançando de braços dados, abrindo mão de suas individualidades e se assumindo como um conjunto sólido. Menos a serviçal, é claro. Que a tudo observa de longe, com um sorriso constrangido no rosto e uma pitada de preocupação no cerne, se vendo entre a obrigação de arrumar a mesa para os patrões e ter que providenciar uma partida improvisada. A distância entre eles é imensa, e a ninguém tal evidência parece se fazer notar.
O que mais choca é que tamanha disparidade também não se mostra suficiente para que a própria Liliana Cavani redirecione seu olhar e vá além de uma muito bem estabelecida zona de conforto. A criadagem está ali para servir, e no máximo alertar àqueles no domínio da situação, mas não mais do que isso. Já estes, que deveriam saber o que fazem, preferem recorrer a prazeres mais imediatos, deixando o destino de si e do planeta ao acaso. Nem mesmo a interferência de um comentário religioso (participação irrelevante da grande Ángela Molina) se apresenta com peso e relevância capaz de alterar o rumo – ou as reflexões – frente ao imponderável. E assim A Ordem do Tempo se afunda na própria irrelevância, incapaz de olhar além do umbigo ao qual tem tanto apreço, ao mesmo tempo em que se vê cada vez mais envolto por uma areia movediça repleta de intenções e frases de efeitos, mas desprovido de feitos coerentes que as acompanhem. Um grande nada, portanto.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Robledo Milani | 4 |
Francisco Carbone | 4 |
Alysson Oliveira | 2 |
Leonardo Ribeiro | 5 |
MÉDIA | 3.8 |
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