Crítica
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Sinopse
Crítica
Para realizar A Princesa da Yakuza, o cineasta brasileiro Vicente Amorim estabeleceu um diálogo direto com a tradição de filmes japoneses sobre a principal das máfias orientais. Não é de se estranhar que a trama apresente tantos personagens e situações semelhantes de outras obras. Isso porque podemos compreender o resultado como um gesto reverencial de afeto, dos que se justificam pela atitude de prestar homenagens. É mais ou menos o que o norte-americano Quentin Tarantino fez em toda a sua carreira: o pastiche, ou seja, a reprodução de estilos, mas não com o intuito de critica-los (e isso o diferencia da paródia). Aliás, Amorim bebe das mesmas fontes nas quais Tarantino foi buscar inspiração para fazer o díptico Kill Bill. Quer um exemplo óbvio disso? A cena da criança testemunhando o assassinato da família e sobrevivendo para liderar adiante a vingança/reparação. Essa situação está presente em Kill Bill: Volume 1 (2003) e nesta produção ambientada no Brasil, mas que de brasileiro tem pouquíssimo. No entanto, existe um abismo entre os estilos de Tarantino e Amorim na hora de fazer o mergulho no mundo dos gângsteres japoneses e numa iconografia que tem na katana (a espada samurai) o seu principal elemento. Até nisto a Mamba Negra de Uma Thurman e a Akemi de Masumi se parecem: em dado momento, empunham uma lâmina mítica, tratada como se tivesse vida própria.
Definitivamente, este texto não será uma incessante comparação entre A Princesa da Yakuza e Kill Bill, mas é bom ter o filme de Tarantino no horizonte para compreendermos melhor onde Amorim falha. A protagonista é uma jovem deslocada que mora no bairro da Liberdade, na cidade de São Paulo, um dos maiores redutos de japoneses fora da Terra do Sol Nascente. O realizador brasileiro prefere sobrepor os neons mais comumente associados a Hong Kong e ao bairro de Chinatown, em Nova Iorque, a qualquer traço de brasilidade do cenário. Na verdade, pouca diferença faria se o longa-metragem se passasse em Amsterdã ou em Montevidéu, desde que nessas capitais existisse uma colônia oriental para justificar a estilização. Amorim pesa a mão na evocação estética dos filmes aos quais faz referência, não se contentando com a despersonalização do país onde a história está acontecendo. Não é apenas no bairro da Liberdade (poética) que os personagens são banhados por luzes saturadas, mas em qualquer lugar da metrópole genérica. Por exemplo, quando Akemi está recostada na janela do trem em viagem, seu rosto é banhado por uma luz verde que acentua o recorte artificial da fotografia. Isso poderia funcionar muito bem se houvesse um abraço vigoroso da dinâmica espetacular, como Tarantino faz em Kill Bill, no qual somos levados a nos deleitar com os exageros que ditam o tom charmoso.
Especialmente quanto ao enredo, A Princesa da Yakuza fica num meio termo entre reproduzir circunstâncias canônicas dos filmes de máfias orientais e oferecer algo diferente num manancial de intenções parecidas. Akemi é a típica heroína que precisa se adaptar rapidamente à nova configuração de vida imposta por verdades antes desconhecidas. Ela não é simplesmente uma jovem órfã, estrangeira e relativamente frustrada com o trabalho numa banca de venda de eletrônicos. Como prontamente saberemos, a japonesa é a única herdeira de uma família de mafiosos dizimada durante um golpe que levou os conspiradores à liderança do temido clã. Portanto, Akemi precisa ser assassinada pelos algozes do pai, da mãe e do irmão, pois representa a permanência de uma chama de revolta acesa. Enquanto somos apresentados a ela, vemos um homem desmemoriado (vivido por Jonathan Rhys Meyers) tentando lembrar porque está com a cara retalhada e, igualmente, por que cargas d’água carrega a katana. Além disso, há um gângster que desembarca no Brasil e persegue Akemi. Existe um jogo de aparências sendo montando, com personagens desempenhando papeis que serão invertidos à medida que segredos são revelados. Mas, o roteiro assinado por Fernando Toste, Kimi Lee, Tubaldini Shelling e Vicente Amorim não lida bem com as ambiguidades da situação, deixando tudo plano.
Akemi não é uma protagonista que se impõe na tela como alguém rumo ao desabrochar; o homem sem nome (batizado na última cena) jamais se consolida como um enigma instigante a ser desvendado; a tragédia dos protetores que tombam em prol da herdeira é desprovida de espessura dramática e intensidade emocional; a evocação da aura mitológica esbarra na tonalidade genérica imposta durante a reutilização dos elementos de referência. Outra coisa que faz A Princesa da Yakuza deixar a desejar são os momentos de ação. Amorim opta por “picotar” demais as cenas de luta. Mesmo mantendo a intensidade, ele desprivilegia a coreografia e, por conseguinte, a fisicalidade dessas situações importantes para a trama. Geralmente, esse tipo de expediente serve para “maquiar” a inabilidade dos atores com as prerrogativas das artes marciais ou mesmo a pouca disposição da direção pelo ensaio prévio de um bailado mortal. Vicente Amorim, que incursionou pela ação no bom Motorrad (2017) e pela história japonesa em Corações Sujos (2011), erra a mão dessa vez, justamente por não saber se apropriar de um estilo e, a partir disso, inserir marcas próprias para imprimir personalidade. O resultado é uma colagem de cenas, circunstâncias, viradas e personagens antes muito vistos na cinematografia oriental, mas sem o vigor, o senso de tradição, a empolgação das boas batalhas e a forja de novos mitos.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 3 |
Leonardo Ribeiro | 4 |
MÉDIA | 3.5 |
uma merda