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Sinopse

Em 1789, um povo iniciou uma revolução. Ele e seu rei cruzam os destinos de homens e mulheres e figuras históricas. Seu local de encontro é a mais nova Assembléia Nacional. No coração da história, o fim da monarquia e a a ascensão da República.

Crítica

“Em breve terei tamancos”, diz o garoto pobre que tem os pés lavados pelo Rei Luís XVI (Laurent Lafitte), uma tradição repetida toda Quinta-Feira Santa, como elucida a cartela de texto que precede a cena de abertura deste A Revolução em Paris, terceiro longa do francês Pierre Schoeller – de O Exercício do Poder (2011). Tal introdução já deixa claro o ponto de vista adotado pelo cineasta ao retratar o período preambular da Revolução Francesa – entre 1789 e 1793 – se colocando ao lado do povo oprimido. Dos trabalhadores sans-culottes representados por um grupo que vive numa espécie de comunidade parisiense e inclui lavadeiras, artesãos, faxineiras e artistas, dentre os quais ganham um maior destaque, Françoise (Adèle Haenel) e “O Tio” (Olivier Gourmet). São esses personagem que povoam uma trama que os coloca em meio ao turbilhão social da época – a criação da Assembleia Nacional, o início da República – dividindo espaço com figuras históricas reais.

Desde o princípio, Schoeller apresenta uma proposta de ruptura com a solenidade acadêmica que geralmente envolve os dramas históricos, imprimindo tintas experimentais à sua narrativa episódica, marcada pela fragmentação (obtida através de uma montagem em que cortes abruptos interrompem ações e diálogos), e pelos saltos temporais constantes, que tornam o ritmo inicial bastante acelerado – diminuindo apenas levemente ao longo da projeção. Há ainda uma teatralidade com toques de vanguarda na encenação e nas atuações, incluindo diversos momentos musicais que se utilizam de frases de efeito e lugares-comuns do discurso da luta de classes. Mesmo com o talento dos intérpretes, essa encenação termina soando artificial em boa parte do tempo, especialmente nas passagens mais verborrágicas que reimaginam as sessões da Assembleia, e que dominam grande parcela do longa. São justamente esses meandros políticos, os debates – e embates – verbais, porém, que mais interessam a Schoeller, fazendo com que o desenvolvimento de arcos pessoais fique em segundo plano.

Exceção feita ao arco de Françoise – da perda do filho recém-nascido ao envolvimento com Basile (Gaspard Ulliel), ladrão que ganha o perdão e migra do interior para Paris –, poucos esforços são direcionados aos dramas particulares dos personagens ou mesmo a suas construções psicológicas. Essa opção, nos casos das personalidades reais retratadas, acaba demandando certa bagagem histórica do espectador para que este esteja familiarizado com as características pessoais e mesmo com a importância dentro do contexto de nomes como Danton, Marat e Robespierre, que surgem apenas como recortes unidimensionais. Por mais que se compreenda como parte da proposta de desconstrução do épico clássico, sem o estabelecimento de heróis solitários, visando exaltar a força do movimento coletivo, tal escolha gera um distanciamento e, no caso das personalidades históricas citadas, também uma dificuldade de dissociação de imagem, já que, sem a devida construção individual, a figura dos atores – caso de Denis Lavant e Louis Garrel, por exemplo – se impõe sobre seus personagens – Marat e Robespierre, respectivamente.

Não se pode negar, contudo, que a abordagem de Schoeller seja ambiciosa e, aos menos a princípio, salutar, por tentar evitar as convenções desse tipo de longa. Da mesma forma, é notável o apuro estético de A Revolução em Paris – vide sequências como a da decapitação ou o confronto nas escadarias do palácio – bem como a boa concepção de alguns simbolismos – como o paralelo traçado entre a longa votação que acaba decidindo o destino do Rei e a sequência em que o Tio ensina Basile a moldar o vidro, representando a criação lenta, delicada e calcada no aprendizado a partir dos erros de um novo modelo de governo. O protagonismo feminino, com as mulheres reivindicando o seu lugar na Revolução, e se colocando na linha de frente, também é outro ponto positivo da condução de Schoeller.

Ao final, porém, o trabalho do cineasta se vê refém da necessidade de apresentar novos artifícios imagéticos a cada vinheta narrativa para sustentar o seu frescor, além de permanecer preso a um encadeamento de clichês discursivos acerca dos ideais revolucionários de Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Na busca por fugir da sobriedade classicista, através de uma embalagem que se pretende anárquica, Schoeller atinge um resultado oposto ao desejado: soando pouco humano e natural, e deixando a sensação de um estranhamento por demais calculado, sintético.

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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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