Crítica
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Sinopse
Pierre e Manon produzem documentários de baixo orçamento e vivem de pequenos bicos. Quando Pierre conhece uma jovem estagiária, Elisabeth, ela se torna sua amante. Mas Pierre não quer deixar Manon – ele continua o relacionamento com as duas mulheres. Elisabeth descobre que Manon tem um amante e conta a Pierre. Pierre volta para Manon, a mulher que ama de verdade. Sentindo-se traído, implora por seu amor, deixando Elisabeth de lado.
Crítica
É impressionante a economia narrativa do cineasta Philippe Garrel, especialmente para falar da complexidade dos relacionamentos amorosos. Cada detalhe no quadro é pensado para evitar desperdícios, todo gesto é uma forma de permitir o avanço da trama de acordo com as vicissitudes psicológicas e comportamentais dos personagens. O protagonista de À Sombra de Duas Mulheres é Pierre (Stanislas Merhar), documentarista falido. Ele cola anúncios na rua para tentar arrumar o que lhe ampare financeiramente enquanto trabalha num filme sobre a Resistência francesa à ocupação nazista na Segunda Guerra Mundial. É o arquétipo clássico do criador que não encontra sustento suficiente na arte. Sua esposa, Manon (Clotilde Courau), igualmente padece da falta de dinheiro, sendo-lhe montadora e roteirista, ou seja, colaboradora criativa, mas tendo de manter outro emprego, de meio expediente, para evitar a falência do casal. A frustração profissional e monetária parece lhes tragar para um buraco.
Louis Garrel, filho de Philippe, é a voz que narra as desventuras sentimentais em À Sombra de Duas Mulheres. Pierre passa a ter um caso extraconjugal com Elisabeth (Lena Paugam), jovem estagiária de uma entidade cinematográfica. Ali, em meio a latas de película, há um processo de sedução, engatilhado justamente pelo desgosto do documentarista que não demonstra qualquer traço de vivacidade. Stanislas Merhar encarna um homem aparentemente incapaz de sentir paixão, petrificado por toda sorte de contratempos. No amor, é frio com a esposa e apenas burocrático com a amante. Na arte, sente-se impotente diante do veterano da Resistência que lhe conta histórias de bravura. Sintomática disso é a constatação de que, para ele, falar sobre aquilo tudo é demasiado, embora aparentemente as filmagens ocorram sem problemas visíveis. A luta do sujeito/artista não é contra fatos ou discursos, pois o inimigo é ele próprio, a ausência de tesão que vai lhe deixando à mercê de futilidades e circunstâncias.
Há uma discrepância, muito bem delineada pelo realizador em À Sombra de Duas Mulheres, entre o dizer e o sentir. Mesmo que Elisabeth sustente, num primeiro momento, tranquilidade quanto ao fato de ser “a outra”, logo depois a condição lhe cai nos ombros com peso considerável. Ora, anseios e convicções mudam, se agigantam e arrefecem ao sabor das conjunturas, e o que Philippe Garrel faz é atentar às filigranas, à heterogeneidade dos enredamentos afetivos. Isso se percebe na reação absolutamente hipócrita de Pierre diante da conduta de Manon, uma reprimenda veemente a algo que ele também faz. Aliás, a esposa ganha novas e ricas camadas quando, sutilmente, o filme a tira do lugar de cônjuge enganada e, portanto, fragilizada, para dar-lhe matizes diversos, amplificando sua voz enquanto personagem. Importante ao desenvolvimento dessas idas e vindas é a organicidade com que as condutas são apresentadas e sustentadas pela plausibilidade da aproximação com o real.
À Sombra de Duas Mulheres não precisa diminuir uns para enaltecer os demais. Nele, o jogo é tudo, menos maniqueísta. Pierre realmente demonstra uma quase total desorientação, não somente como companheiro e artista, mas na condição de gente. Elisabeth, por sua vez, é crível, em semelhante medida, ao deslocar-se da euforia hedonista para o sofrimento pela ausência do objeto de desejo. E Manon, por meio da interpretação excepcional de Clotilde Courau, é quem, confrontada, demonstra a coragem de assumir-se, inclusive para salvar o casamento. Enquanto ela cresce, tendo atitudes relacionadas ao amor sentido por Pierre, ele, na direção oposta, vai sendo tomado por incongruências, ficando metaforicamente à sombra dessa disposição feminina de perseverar, para tanto, desde que haja afeto sobrevivente. O diálogo no velório nos faz perceber, ainda mais, que Philippe Garrel realmente não desperdiça elementos. Até a desatenção aparentemente frugal da senhora, numa cena então longínqua em que soa mera coadjuvante, denota verdades inconvenientes. Basta um meneio, nada mais.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Marcelo Müller | 8 |
Leonardo Ribeiro | 8 |
Filipe Pereira | 5 |
MÉDIA | 7 |
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