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Crítica


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Sinopse

A ex-professora Celeste Garcia ensina sobre as estrelas no Planetário de Havana. Quando um grupo de alienígenas escolhe Cuba para sediar um concurso interplanetário que oportunizará a humanos o intercâmbio num planeta distante ela sente vontade de mudar sua vida modorrenta e repleta de arrependimentos. Celeste está disposta a abraçar o novo a fim de recomeçar longe dos problemas e daquilo que lhe intimida.

Crítica

Celeste (María Isabel Díaz Lago) possui uma rotina simples. Do trabalho, no Planetário de Havana, vai diretamente para a casa, onde convive com o filho adulto e ouve os comentários comezinhos da irmã. Vale mencionar a parada frequente no açougue local para abastecer-se de carne de frango, dado que se desdobra em proposições diversas a partir do instante em que o fantástico surge na narrativa. Em A Viagem Extraordinária de Celeste Garcia a protagonista se vê diante de uma possibilidade insólita tão logo a imprensa anuncie o sorteio público promovido por extraterrestres que intentam levar cubanos para fazer um intercâmbio além dos limites do planeta azul. O cineasta Arturo Infante, desde o começo, se vale das ferramentas da comédia para tratar de uma história repleta de absurdos, ocasionalmente entrecortada por flashbacks que dão conta de um outrora insuspeito. Não há profundidade nas ações e nas decisões, apenas gestos entre o banal e o excepcional.

A câmera que desvela Havana nas idas e vindas de Celeste não está buscando um retrato fidedigno impregnado de veracidade (embora o alcance à sua maneira), tampouco mira uma estilização que porventura descaracteriza. As paredes carcomidas, as sensíveis diferenças entre o centro e a periferia urbana da cidade estão ali, postas como comentários colaterais nas cenas dos deslocamentos da personagem que esbanja carisma. É bonita a sua referência às estrelas como projeções luminosas do passado, assim revestindo o fato de uma poética especial. A Viagem Extraordinária de Celeste Garcia acentua sua estranheza quando o enredo principal se descortina e Celeste – cujo nome descaradamente irônico é uma piscadela desbragada do cineasta ao público – vislumbra uma existência, ainda que parcial, longe da dependência do filho e, principalmente, da culpa que sobreveio a um episódio adiante apresentado. Todavia, como supracitado, não é num possível mergulho vertical nesses sentimentos que o filme se sustenta, mas na sua epidérmica graciosidade.

A Viagem Extraordinária de Celeste Garcia é uma ficção científica genuína. Embora, durante um tempo, seja possível duvidar da existência dos extraterrestres, especialmente por conta da condução com disciplina militar dos processos anteriores ao tão imaginado embarque, a efetividade do contato imediato com alienígenas não deixa dúvidas quanto à filiação ao gênero. Um sci-fi cubano que não esbanja efeitos especiais, recorrente a eles em instantes pontuais. A galinha gigante surge num contexto um tanto tosco, algo entendido como deliberado à frente, sobretudo quando vemos na telona a nave espacial tão prometida. A aparição é bem feita ao nível dos blockbusters. De leve, Arturo oferece o contexto político, com conversas acerca da atuação de Celeste e o testemunho de sua desgraça profissional em virtude dos excessos do marido beberrão. O fato de ela ser escolhida, por ser professora, para ajudar os visitantes a compreenderem melhor nossa cultura é sintomático.

Por vezes, A Viagem Extraordinária de Celeste Garcia fica ancorado em dinâmicas simplórias, ainda que espirituosas, tais como as tentativas de Hector Francisco (Néstor Jiménez) de contar um causo que começou em 1975. A subtrama dos amantes que precisam bolar um estratagema a fim de fugir da pena pelo assassinato de um homem é praticamente descartável, pois não se comunica com a linha principal da narrativa, ganhando relevância somente pelo golpe desferido contra a ingenuidade alheia, isso próximo ao clímax. Há fragilidades, de encenação e roteiro drenando determinados potenciais, como as boas construções dos personagens e o curioso encaixe de suas demandas num gênero associado comumente a grandes produções. Entretanto, apesar dessa debilidade latente e praticamente intermitente, acaba sobrepesando para o lado positivo a doçura das figuras, o empenho para fazer algo com personalidade local e a redenção da segunda chance nele ofertada.

 

(Filme assistido durante a 29ª edição do Cine Ceará)

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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