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Sinopse

Hanna ajuda a cuidar de Josef depois de um terrível acidente numa plataforma de petróleo. Aos poucos eles criam uma mútua e forte ligação, num processo que ensina a ambos o valor de conviver com as pessoas.

Crítica

O que é preciso para descobrir o verdadeiro "eu" de uma pessoa? Até que ponto nos fechamos tão dentro de nós mesmos que acabamos nos afastando não somente dos outros, mas de tudo mais, inclusive das próprias emoções? Incomunicabilidade, repressão, traumas do passado e a descoberta do amor no mais improvável dos lugares são alguns dos temas tratados no sensível e comovente A Vida Secreta das Palavras, segundo longa-metragem internacional dirigido pela impressionante cineasta espanhola Isabel Coixet (o anterior foi o igualmente emocionante Minha Vida Sem Mim, 2003).

Uma mulher solitária vive num universo tão particular que esquece até mesmo de reivindicar suas férias. Obrigada pelo chefe a um mês de descanso, acaba indo parar numa vila afastada e pouco povoada. Lá descobre uma oportunidade de reavivar uma antiga ocupação: enfermagem. Estão precisando de alguém para cuidar de um operário numa plataforma petrolífera no meio do oceano. Ele está cego, vítima de severas queimaduras sofridas durante um acidente. Ao chegar neste lugar ainda mais inóspito, nossa protagonista irá de se deparar com pessoas tão isoladas da vida quando ela mesma. As relações entre os presentes é tão escassa quanto se faz necessária. São como zumbis, abandonados numa terra de ninguém, individualmente ocupados com suas responsabilidades e esquecidos pelo resto da humanidade. Mas o contato está prestes a ganhar um novo valor, alterando toda a ordem até então estabelecida.

Se a princípio a convivência entre paciente e atendente revela-se truncada, os códigos de comunicação aos poucos vão se estabelecendo. Ele não consegue vê-la, ela parece estar pouco interessada, mas um jogo vai surgindo e envolvendo-os. Não tardará para a relação evoluir para uma estranha história de amor que, apesar do diferencial que possui, não deixa de possuir elementos em comum a qualquer outro romance: entrega, cobrança, confiança, insegurança, dor e sinceridade. E neste ponto o filme surpreende o espectador pelos novos rumos tomados, em que gestos até então exóticos adquirem novos significados e todo o entendimento do que estava acontecendo fica não só mais claro, mas também dotado de uma intensidade até então insuspeita.

Muito do bom resultado atingido por A Vida Secreta das Palavras está na sua dupla central de atores, a fenomenal Sarah Polley (que já havia trabalhado com a diretora em Minha Vida...) e o oscarizado Tim Robbins (Sobre Meninos e Lobos, 2003). Os dois fogem do registro óbvio e estereotipado, atuando com o olhar, com pequenos cuidados e tendo completo domínio dos personagens e das emoções que carregam consigo. Você esquece que por trás estão pessoas com outras vidas e histórias: fica-se diante apenas dos protagonistas da trama, como se estivéssemos literalmente dentro do enredo, naquela realidade. Outros bons destaques são alguns coadjuvantes, como o sempre ótimo Javier Cámara (Fale Com Ela, 2003, Má Educação, 2004, Da Cama Para A Fama, 2003), ciente da urgência de um alívio cômico, porém longe do clichê mais fácil, e da igualmente vencedora do Oscar Julie Christie (Darling, a Que Amou Demais, de 1965, vista recentemente em sucessos como Em Busca Da Terra Do Nunca, 2004, Tróia, 2004, e Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban, 2004), numa participação carinhosa e fundamental.

Isabel Coixet é uma súdita exemplar do mestre Pedro Almodóvar, produtor executivo de A Vida Secreta das Palavras, longa que foi o grande vencedor dos Prêmios Goya no ano passado. Sem incorrer no exagero, ela consegue falar muito dizendo pouco. As expressões, as atitudes, cada ação em todo momento são de relevâncias singulares, fazendo a maior diferença possível. Pelo que vemos nestes seus dois últimos trabalhos, estes são filmes para serem vistos com atenção e carinho, pois transmitem mais do que um única experiência possa se encarregar. É preciso reflexão, análise e uma compreensão maior do que somos e buscamos. Seja através das palavras, das ações ou mesmo do que não é feito. Pois aqui até o que não está tem importância. E esta lição é o maior mérito da obra como um todo.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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