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Crítica


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1 voto 8

Onde Assistir

Sinopse

Como quase toda boa predestinada, Abigail não tem ciência dos poderes especiais que carrega consigo. Em meio a uma sociedade retofuturista, assolada por uma suposta doença altamente transmissível, ela vai se dar conta de que algumas regras devem ser quebradas para que a verdade venha à tona.

Crítica

O que há de melhor em Abigail e a Cidade Proibida é a sua premissa. A protagonista, Abigail (Tinatin Dalakishvili), é uma jovem em meio à tirania dos que caçam pessoas com poderes extraordinários. Publicamente, os mandatários tratam perseguições como diligência quanto a uma inventada doença letal. A reflexão acerca de governos atuando fundamentalmente a partir do medo é vital, aqui aplicada à seara da fantasia. Mas, infelizmente, as qualidades do longa de Aleksandr Boguslavskiy são exceções. Pode-se, com boa vontade, apontar enquanto positivo, também, o desenho de produção retrofuturista, mas a precariedade dos efeitos digitais mina as potencialidades desse elemento. A trama é confusa, repleta de convencionalismos e conveniências. A garota triste à procura do pai encontra genericamente ímpetos rebeldes aos quais se junta de pronto. A sensação de “já assisti a esse filme um tanto de vezes” atravessa integralmente a sessão.

Abigail e a Cidade Proibida peca na construção desse cenário obscurantista e asfixiante. Os Inspetores, figuras mascaradas encarregadas de diagnosticar infectados e aparta-los dos demais à suposta segurança da coletividade, são personagens mal utilizados, especialmente tendo em vista o anonimato como potencial elemento de surpresa na trama. Isso é aventado quando Abigail descobre a identidade de um deles, perecendo, a partir daí, que os “sem rosto” podem ser pessoas de seu convívio passado. Todavia, o roteiro não se vale desse dado para criar qualquer coisa além de uma facilidade narrativa. Sim, pois o sujeito, chantageado pela protagonista, possui informações privilegiadas que funcionam, no decurso do enredo, como imprescindíveis apontamentos dos caminhos a serem tomados. Trocando em miúdos, ele apenas existe para “mastigar” os pormenores. Aliás, o todo é tão explicado que não há espaço para que o espectador seja menos do que passivo.

Não é exatamente por ser genérico que Abigail e a Cidade Proibida se torna gradativamente desinteressante. Os lugares-comuns, tais como alguém descobrindo sua excepcionalidade num contexto de conflito, a aproximação com um revolucionário que pode guiar rumo ao objetivo, a opressão de um tirano sem espaço para complexidades emocionais e psicológicas, e a abnegação de soldados dispostos a morrer por seus ideais, para citar somente alguns dos muitos presentes, não seriam um problema em si se bem dispostos. Todavia, o roteiro lança esses clichês num amontoado de circunstâncias sem peso dramático, assim chamando atenção à fragilidade de um conjunto ancorado na banalidade. E dá-lhe discursos grandiosos sobre a necessidade de acender a centelha de resistência para devolver a liberdade ao povo. O desenho sócio-político, evidentemente importante à organização dessa redenção garantida pela valentia de um grupo reduzido, tem cores pálidas.

Há um excesso de sequências desmotivadas pela incapacidade diretiva de, minimamente, situar o espectador nos espaços. Missões citadas como árduas, sobretudo em virtude da dificuldade de acesso aos lugares em que artefatos e mistérios estão escondidos, começam, se desenvolvem e terminam sem fundamento numa noção de urgência e/ou numa ideia potente de obstáculo superado. Dessa maneira, Abigail e a Cidade Proibida transcorre sem constituir uma ode à utopia e, tampouco, delineando uma distopia com personalidade. O elenco está no piloto automático, com atuações ora burocráticas, como a de Tinatin Dalakishvili, ora beirando a canastrice, vide a de Gleb Bochkov, intérprete do revoltoso (e vazio) bonitão que está nessa arquitetura narrativa para ser o interesse amoroso da protagonista. Não à toa, o clímax é demarcado desengonçadamente pelo beijo prenunciado numa conjuntura romântica anódina e mal formulada, assim como todo o resto.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
3
Roberto Cunha
4
MÉDIA
3.5

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