Sinopse
Ano de 2008. Os professores sergipanos travam uma luta jurídica com o governo do estado para evitar a perda de direitos já conquistados. O julgamento é adiado duas vezes e a batalha se prolonga por um mês. No meio desta luta, a professora Ana Rosa vive o desafio de ser mãe, mulher e dirigente sindical.
Crítica
Estamos no ano de 2008 – ou seja, mais de uma década atrás. O diretor e roteirista DF Fiuza situa sua trama nesse período exato de tempo, pois a narrativa, apesar de ficcional, está fortemente calcada num episódio real. Em Abraço o foco permanece na luta dos professores sergipanos que precisaram enfrentar o governo do estado e o poder judiciário para garantir uma condição básica da profissão, a progressão vertical da carreira – direito de promoção ao atingir novos níveis de aprimoramento através da graduação ou dos demais cursos válidos. A lei, apesar de clara, abria brechas para interpretações contrárias que, uma vez assumidas como efetivas, imporiam a muitos o adeus a conquistas alcançadas após esforço e dedicação. Ou seja, um novo passo no desmonte da educação nacional. No entanto, por mais justificadas que fossem as razões aqui reunidas, elas parecem nunca suficientes. Assim, ao invés de um relato eficiente e poderoso, há um olhar comprometido e exagerado que, ao invés de aproximar, apenas serve para afastar qualquer um minimamente interessado.
E não se está falando, aqui, de uma produção amadora. Atores do calibre de Flávio Bauraqui estão presentes. No entanto, o intérprete gaúcho é tão eficiente no que se propõe que acaba se tornando uma fonte de ruído, tamanho é o abismo existente entre ele e os seus colegas de elenco. Bauraqui surge como Jorge, o presidente do Sindicato dos Professores, responsável por reunir todas as forças possíveis para que, somente assim, consigam se opor a tal julgamento. Infelizmente, porém, ele não está sozinho nessa batalha – se fosse mais um caso do homem solitário contra o sistema, não apenas a identificação talvez seria mais efetiva, como, tendo todo o percurso sob sua única responsabilidade, a garantia de um resultado mais positivo seria maior. Aliás, bem pelo contrário. Esse é, talvez, um dos personagens mais apáticos de toda a trama, que apenas escapa do obscurantismo total graças ao talento do ator esforçado constantemente para defendê-lo.
Fiuza decide, portanto, oferecer o caráter “humano” da história às figuras mais unidimensionais e menos comprometidas com a realidade. Com isso, abre-se espaço a Ana Rosa (Giuliana Maria, que se revela incapaz de modular o sofrimento de sua personagem, aparecendo constantemente com uma expressão de derrota, apesar do ânimo que deveria suscitar), professora do interior empenhada em garantir que sua profissão não seja desvalorizada. Ela ouve reclamações constantes do marido, não é compreendida pela mãe, e se vira em duas ou mais para lidar com a casa, a escola e também com as obrigações sindicais. Mesmo assim, é uma figura que não chega a ser vista com simpatia, especialmente por causa do roteiro: se o que está fazendo é o certo, por que todos são contra suas atitudes? Por que parece que absolutamente ninguém, a não ser os outros professores, compreendem a importância do que ela – e os demais em condições similares – estão fazendo?
Se o caráter afetivo é importante – afinal, o título não é Abraço por acaso – ele poderia ter sido melhor explorado dramaturgicamente. O governador e outros políticos inexistem – ouve-se falar deles e das suas intenções, mas em nenhum momento o outro lado é oferecido para que tais propostas sejam, ao menos, confrontadas. Quando um ou outro deputado surge, é de forma tão caricatural que não difere em nada das charges vistas nos jornais diários de todo o país. Os professores, portanto, estão isolados. Mas, aqui cabe a questão: sendo esse um filme produzido pelo próprio Sindicato, e uma vez que o único ponto de vista que parece importar é o deles, caberia qualquer outra solução além de um inevitável final feliz? Sendo assim, onde está o conflito? Qual a razão de tanto suspense – a narrativa começa num momento de clímax, para depois retornar algumas semanas e, com isso, explicar como os acontecimentos se desenrolaram até aquele instante – se todos os passos podem ser antecipados com bastante precisão?
E o mais crucial de tudo: qual o interesse desse debate aqui exposto além dos limites de Sergipe? Afinal, está se falando de um estado de pouca – para não dizer inexistente – expressão na cinematografia nacional, e que pelo visto não terá essa condição alterada se depender dos esforços aqui reunidos. É importante – para não dizer necessário – discutir o caos e a pouca atenção que educação tem recebido no Brasil. Mas esse é um problema que vai muito além de pequenos entraves ocasionais – é uma questão estrutural, de cultura, e que diz respeito ao todo, não apenas a algum ou outro afetado. O exemplo de união que DF Fiuza resgata tem valor absoluto, mas a forma pouco habilidosa que ele escolhe para nela se aprofundar se dá por um percurso repleto de diálogos fáceis e expositivos, uma narrativa didática e enfadonha, um elenco irregular e uma estrutura fílmica que investe nos clichês – cantorias, falsas tensões, resoluções banais – que somente deverão ter algum tipo de efeito entre os já convertidos, já propícios a um discurso contaminado. Aos demais, a certeza será a repulsa e o desinteresse. Exatamente o que não poderia acontecer diante de um assunto tão urgente.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Robledo Milani | 4 |
Francisco Carbone | 2 |
MÉDIA | 3 |
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