Crítica
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Sinopse
Ao ficar cego, Mateo Blanco se torna Harry Caine. Antes ele era um prestigiado diretor de cinema, cujo grande amigo era Ernesto. Mas, os dois se afastaram quando o amor por uma mesma mulher transformou em guerra a amizade.
Crítica
Em seu décimo sétimo longa-metragem, o cineasta espanhol Pedro Almodóvar mais uma vez surpreende pela criatividade e domínio de uma linguagem muito própria. Mesmo que este Abraços Partidos não seja o seu melhor trabalho, ainda assim é um produto muito acima da média. Talvez o grande problema do realizador seja ele mesmo: depois de ter entregue ao seu público filmes tão impressionantes – como o oscarizado Tudo Sobre Minha Mãe (1999), por exemplo – fica um tanto complicado conseguir manter o mesmo nível a cada novo lançamento. Não que este recente chegue a ser decepcionante. Apenas não é tão revolucionário quanto alguns dos anteriores.
A obra de Almodóvar pode ser vista quase que em conjunto, como se cada novo filme fosse um desdobramento de um quadro maior e mais completo. Encarando-os como sequências uns dos outros, estes 17 filmes compõem, em conjunto, um dos grupos mais relevantes do atual cinema mundial. Estamos falando de um autor, no sentido mais completo do termo. E cada manifestação de sua arte precisa e deve ser encarada com respeito e muita atenção. Pois mesmo aparentando estar aquém dos talentos envolvidos, ela contém elementos suficientes para surpreender até mesmo os mais desavisados. Abraços Partidos é quase que um recomeço para o diretor. E ele não toma uma decisão como esta ignorando seu passado – muito pelo contrário, foi de olho na trajetória pregressa que se preparou para evoluir e crescer. Desde o tema recorrente – o amor como perdição – que utiliza como referência longas como Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos (1989) e Ata-me (1990), até o tom adotado – um suspense crescente, como Matador (1986) – tudo é familiar aos iniciados. O elenco, então, é um deleite à parte – praticamente todos os personagens principais estão nas mãos de intérpretes bem conhecidos, desde a protagonista Penélope Cruz (em seu quarto filme com Almodóvar, após Carne Trêmula, Tudo Sobre Minha Mãe e Volver) até as deliciosas Chus Lampreave (8 vezes ao lado do diretor) e Rossy De Palma (6 vezes com Almodóvar), passando pelos ótimos Lluis Homar (Má Educação), Blanca Portillo (Volver), Ángela Molina (Carne Trêmula) e Lola Dueñas (Fale com Ela). E esta turma, lado a lado, proporciona um prazer à parte, tão grande é a sintonia entre todos e a desenvoltura que assumem para contar mais esta legítima criação almodovariana.
E qual é o enredo de Abraços Partidos? Aí está o ponto fraco. As partes são muito mais interessantes do que o todo, e separadas atraem nossa atenção com muito mais eficiência do que quando colocadas juntas. Senão vejamos: moça que sonha ser atriz casa por necessidade com um homem muito rico, mesmo sem amá-lo. Este, para satisfazê-la, banca a produção de um filme que a tenha como estrela principal. E os problemas começam quando mocinha se torna amante do diretor, enlouquecendo o marido de tanto ciúme. Claro que isso não é narrado de forma simples e direta, mas através de muitas reviravoltas, flashbacks e surpresas. O condutor é este cineasta, hoje cego e dono de uma nova identidade. Quais fatos o levaram até o ponto em que se encontra atualmente? Estes são os enigmas que são desvendados com cuidado e muita precisão, cada um nos levando a um outro, até a conclusão que permite, finalmente, um visão geral de um quadro que desde o início começou a ser pintado.
Mesmo com um argumento que lembra tantos outros sucessos – a estrutura marido, esposa e amante, dentro de um contexto artístico, remete direto ao musical Moulin Rouge: Amor em Vermelho (2001), por exemplo – Abraços Partidos consegue satisfazer por diversos motivos. Desde a interpretação de Cruz, num registro arrebatador, até a fiel certeza do realizador de estar obtendo o máximo da trama que criou, tudo conspira para fazer deste algo diferenciado. E o reconhecimento que vem conquistando, como a seleção para o Festival de Cannes, a indicação ao Globo de Ouro como Melhor Filme Estrangeiro e a premiação da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, é mais do que suficiente para justificar qualquer deslize. Almodóvar continua grande, mesmo diante de um resultado menor.
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