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Sinopse

Casada há 40 anos, Sandra Abbott descobre que está sendo traída pelo marido com sua melhor amiga. Decidida a dar a volta por cima, passa a frequentar as aulas de dança comunitária junto da irmã e, com os novos amigos que acaba fazendo, injeta um novo sopro de diversão e romance em sua vida.

Crítica

Em Hollywood, uma das reclamações mais recorrentes das militantes dos movimentos de empoderamento feminino é a discrepância entre as idades dos homens e mulheres quando formam pares românticos: para eles, pouco importa se estão na faixa dos 30 ou até mesmo 60 anos, enquanto que, para elas, passar – ou mesmo se aproximar – dos 40 costuma ser um sinal de alerta. Basta ver no Oscar: enquanto a idade média dos vencedores da categoria de Melhor Ator está acima dos 40, entre as premiadas como Melhor Atriz está se mantém na faixa dos 20, no máximo 30! Por isso, mais do que qualquer outra coisa, é bom quando temos a oportunidade de nos deparar com um longa como Acertando o Passo, em que todos os protagonistas possuem mais de 6 décadas de vida. E ainda que o resultado seja irregular, há esse inegável mérito de oferecer atenção a uma faixa etária tão menosprezada pelas telas de cinema.

A protagonista de Acertando o Passo é Sandra (a ótima Imelda Staunton, que muitos devem lembrar como a dissimulada Dolores Umbridge da saga Harry Potter, mas que para sempre será uma das grandes injustiçadas do Oscar por sua atuação arrebatadora em O Segredo de Vera Drake, 2004, que lhe valeu o Bafta e o troféu do Festival de Veneza), mulher da alta classe londrina que, no dia em que é elevada a condição de Lady pelos serviços prestados pelo marido à sociedade, descobre que ele está lhe traindo com sua melhor amiga. Ao contrário do que aconteceria no Brasil (ou nos Estados Unidos, como estamos mais acostumados a presenciar na ficção), é ela que sai de casa, indo morar com a irmã (Celia Imrie, de O Exótico Hotel Marigold, 2011), que é seu verdadeiro oposto: ao invés de rígida, é leve; prefere se preocupar com os sentimentos do que com as aparências; e valoriza poucos – e fiéis – amigos, ao contrário de uma rede de contatos que, mediante o menor deslize, lhe viram a cara para evitar um novo constrangimento.

As duas, há anos sem se verem, tem muito a ensinar uma a outra. Mais a recém separada tem a aprender, é verdade. E isso se dará, como o cartaz do filme já adianta, na pista de dança. A atividade, antes uma mera recreação, acaba ganhando ares de revolução pessoal. O bom, entretanto, é que o filme não se ocupa em apenas revirar clichês do tipo “aprenda a dançar e mude sua vida”. Sim, isso até está lá. Mas, curiosamente, ocupando um destaque menor da trama. Como é de praxe em produções inglesas – e europeias em geral – o foco está mais nos personagens, nas relações entre eles e no desenvolvimento de suas características. É por isso que um tipo como Charlie (um emagrecido Timothy Spall) acaba ganhando mais espaço. Um tanto bronco, é o melhor amigo de Bif (a irmã) e por quem Sandra começará a vislumbrar nossas possibilidades de futuro, ainda que, no início, os dois se apresentem aos trancos e barrancos. No melhor esquema “os opostos se atraem”. Como se vê, evita-se um estereótipo, apenas para resvalar em outro.

Mas Richard Loncraine não é um cineasta de mão leve, e como já foi visto em trabalhos anteriores do diretor, como o shakespeariano Ricardo III (1995) ou o thriller Firewall: Segurança em Risco (2006), por vezes ele acaba forçando a barra além da conta. Em Acertando o Passo, isso se verifica com a introdução de uma doença incurável e a consequente morte – ou melhor, mortes – em cena. Tais temas, se por um lado evitam uma abordagem frívola, por outro exigiriam reflexões profundas dos diálogos e, principalmente, dos silêncios. Porém, não estamos diante de um 45 Anos (2015) ou de um A Juventude (2015), por exemplo, que discursavam tanto sobre o estar quanto a respeito do partir. As escolhas de uma vida seguem pesando, isto é fato, mas dessa vez são resolvidas num estalar de dedos, como manda a boa e velha cartilha das comédias românticas hollywoodianas – independente da idade dos protagonistas.

Menos um Ou Tudo Ou Nada (1997) e mais um Apenas uma Chance (2013) – há semelhanças entre os títulos, tanto pela formação de um grupo inesperado de perdedores que encontram uns nos outros a oportunidade de darem a volta por cima como pelo uso da arte e até mesmo uma incursão motivacional pela Itália – Acertando o Passo poderia ser mais divertido do que é – como não deram mais espaço para a excepcional Joanna Lumley (Absolutely Fabulous: O Filme, 2016)? – mas, ao menos, dosa bem os momentos dramáticos com aqueles mais pessoais (mais graças ao talento de Celia Imrie, a melhor em cena, do que pelos esforços de Imelda Staunton, meramente competente, pois um tanto presa à persona que o filme lhe oferece). Porém, ainda que o desfecho seja previsível, a jornada até ele é mais válida do que sua inevitável, e até mesmo acomodada, conclusão. Um salto de fé, é fato, mas sabendo exatamente onde pousar.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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