Crítica
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Sinopse
Concord, Massachussetts. Com o pai lutando em plena Guerra Civil, as irmãs Jo, Beth, Meg e Amy vivem em harmonia com a mãe, Marmee. Em plena adolescência, elas se divertem criando um clube de teatro, no qual Jo escreve as peças e Meg é a estrela principal. Entretanto, a transição para a vida adulta faz com que a vida de todas mude bastante, assim como a amizade que mantêm com o vizinho Laurie.
Crítica
Após despontar como diretora com o premiado Lady Bird: A Hora de Voar (2017), que lhe rendeu duas indicações ao Oscar, não é de surpreender que Greta Gerwig tenha escolhido Adoráveis Mulheres como seu projeto seguinte. Afinal de contas, o clássico escrito por Louisa May Alcott, já adaptado no cinema em outras seis oportunidades, é também um libelo feminista no sentido de ressaltar que não cabe à mulher apenas o papel subserviente ao marido, presa em uma sociedade que lhe impõe o casamento como meio de sobrevivência. Assim como Elizabeth Bennet em Orgulho e Preconceito, Jo March possui uma admirável e magnética personalidade própria, disposta a correr riscos para dar vazão ao seu amor à literatura e ao teatro. Entretanto, mais que meramente recontar a história clássica, Gerwig com habilidade acrescenta à narrativa uma nuance a mais, através da metalinguagem entre a história das irmãs March e a da própria autora.
Que Jo é a persona de Louisa, não há novidade alguma. O que Gerwig aqui faz é assumir tal faceta de forma escancarada, inserindo uma subtrama na qual a personagem negocia constantemente com um editor a publicação de seus contos e histórias. A partir deste relacionamento, não só a postura da personagem ganha força, no sentido de decidir os rumos de sua própria vida, como abre-se espaço para justificar, de acordo com o contexto da época, o próprio desfecho do livro, de certa forma contraditório ao que vinha sendo pregado até então. Ou seja, Gerwig foi além da história para apresentar também a intenção de sua autora ao escrevê-la, o que demanda não só coragem mas também um impressionante domínio da narrativa, como roteirista. Ponto para ela.
Outro aspecto a ressaltar é que, em Adoráveis Mulheres, Gerwig demonstra bem mais desenvoltura na condução da narrativa como um todo, conjugando com absoluta fluidez o belíssimo figurino bucólico à fotografia solar que quase sempre explora luz natural, aliada a uma direção de arte precisa na reconstrução dos Estados Unidos interiorano do século XIX. Tudo isto para entregar a vivacidade necessária ao convívio das irmãs March, esfuziantes em sua adolescência mesmo tendo que lidar com a constante ausência do pai, em plena Guerra Civil. Com a ajuda de um elenco coeso e muito afinado com a proposta desta história, a diretora/roteirista aos poucos esmiuça a personalidade de cada uma delas ao mesmo tempo em que desnuda as dificuldades das mulheres da época em alçar voo, sem deixar de lado o quão difícil é o ingresso à vida adulta. A partir de mudanças de figurino precisas e essenciais, auxiliadas por uma edição repleta de transições suaves, o filme navega através de duas linhas temporais de forma bastante fluida.
Capitaneada pela ensolarada atuação de Saoirse Ronan, uma vez mais se sobressaindo em um filme de época, Adoráveis Mulheres conta ainda com belos trabalhos de Florence Pugh - especialmente nas diferenças de gestual e comportamento de sua Amy, entre as versões de 13 e 20 anos - e Laura Dern, aqui em uma personagem bem mais afetuosa que em seus recentes trabalhos em Big Little Lies (2017) e História de um Casamento (2019), ressaltando sua pluralidade como atriz. Com o auxílio luxuoso de Chris Cooper e Louis Garrel, em papéis pequenos cuja força no olhar resplandece, o filme ainda conta com um Timothée Chalamet um tanto quanto irregular, alternando ora no clima brincalhão das irmãs March ora com olhares profundos em poses supostamente sedutoras, típicas de galãs sem muitos recursos. Ele é melhor que isto.
Filme visto no Festival do Rio, em dezembro de 2019.
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