Crítica
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Sinopse
Sonny Vaccaro liderou a Nike, que no início dos anos 1980 era uma empresa que ainda lutava por conquistar um lugar de destaque em um mercado muito competitivo, numa parceria notável com Michael Jordan, um dos grandes atletas da História. Um negócio que todos acreditavam que daria errado, mas que acabou mudando as bases do marketing esportivo nos EUA e no mundo.
Crítica
Antes de qualquer coisa, vamos tratar de retirar o elefante do meio da sala. Essa mania brasileira de agregar subtítulos aos batismos originais de produções estrangeiras, se na maioria das vezes soa apenas incômoda ou desnecessária, há ocasiões, como essa, que são também falsas e enganadoras. Air: A História por Trás do Logo, ao contrário do que se divulgou por aqui, não aborda, em suas quase duas horas de duração, absolutamente nenhuma discussão a respeito de logotipo algum, quanto mais revelar episódios mirabolantes dos bastidores de alguma marca capaz de mudar conceitos. Pelo contrário, o que se vê em cena neste que é o quinto longa-metragem dirigido (e o quarto também estrelado) por Ben Affleck é uma trajetória das mais convencionais, bem ao estilo “um homem contra o sistema”, sobre um visionário que, a despeito de todas as evidências opostas, tratou de desafiar o modus operandi e – olha que surpresa! – se deu bem. Um filme igual a tantos outros, porém com um diferencial importante: uma gritante ausência de senso crítico a respeito dos fatos que são enumerados. Trata-se, enfim, de um produto vendido como “puro entretenimento”, mas que na verdade esconde uma indisfarçável – e até mesmo perigosa – mensagem de sucesso a qualquer preço, que, em última instância, volta aos ditos maquiavélicos que pregam que “os fins justificam os meios”.
Apesar de também estar em cena, como dito acima, Affleck ao menos acerta em não se colocar como protagonista – como fizera no anterior, e malfadado, A Lei da Noite (2016), sua última incursão por detrás das câmeras até então. Mas também não se compromete, e quem assume essa posição é o seu alardeado parceiro e melhor amigo, Matt Damon. Este é Sonny Vaccaro, um executivo de relativa importância que atuava em uma empresa de sapatos esportivos que, no início dos anos 1980, ainda lutava para mostrar seu valor: a Nike. Como é exposto de maneira bastante didática pelo roteiro – escrito pelo novato Alex Convery, mas reescrito quase que por completo pela dupla Affleck & Damon – a Nike em 1984 era a quarta colocada no seu ramo, distante das líderes Adidas e Converse. Vaccaro era o cara que passava o seu tempo viajando pelos Estados Unidos acompanhando jogos estudantis em busca de novos talentos que justificassem um patrocínio. A estratégia do departamento de marketing era simples: todo ano escolher três ou quatro dessas “promessas” com quem associar seu nome, na esperança que ao menos um despontasse a ponto de chamar atenção do grande público.
Vaccaro, no entanto, não tem nenhuma ideia mirabolante da noite para o dia. Ele segue fazendo o seu trabalho, e Damon é consistente nesse aspecto, pois não há dúvidas quanto ao seu talento em interpretar um homem comum (ainda que, muitas vezes, envolto por situações extraordinárias). Após falar com colegas mais experientes – participações quase desnecessárias de Chris Tucker e Marlon Wayans (curiosamente, ambos negros, como que presentes apenas para justificar uma maior diversidade étnica no elenco) – e se orientar com seu superior imediato (Jason Bateman, também com pouco em mãos para desenvolver, além de resmungar quando contrariado e torcer quando as coisas escapam do seu controle), acaba concluindo que o que precisa ser mudado não são as escolhas, mas a fórmula até então empregada. Ao invés de dispersar recursos e atenções entre vários possíveis candidatos, por que não investir tudo em uma única aposta?
Eis, enfim, que entra em cena Michael Jordan – ou não. A linha de tênis Air, que dá nome ao filme, já existia nessa época. Ou seja, mais apropriado seria chamar esse projeto de Air Jordan, pois é sobre ele em específico que a trama se debruça. E não sobre o logo do jogador no ar prestes a marcar mais uma cesta: essa imagem é mera consequência, lembrada aos 45 do segundo tempo em uma tela informativa, apenas. O cerne da discussão é não tanto o sapato – Peter Moore (Matthew Maher, de Capitã Marvel, 2019, uma figura carismática, ainda que pouco aproveitada), o designer responsável pelo revolucionário calçado esportivo, é visto em cena mais como um daqueles gênios excêntricos e menos como um técnico atento aos detalhes e criativo na forma – e, sim, a lógica por trás do emprego de uma verba publicitária. O que de nada teria adiantado, é importante ter em mente, caso o jogador merecedor de tamanho interesse não fosse ninguém menos do que o maior astro da NBA de todos os tempos. A impressão, portanto, é de que foi preciso que um senhor caucasiano de classe média acostumado a jantares congelados o percebesse para, enfim, conceder a ele a oportunidade necessária para não seguir sendo tratado como apenas mais um jogador, mas assumindo a condição de estrela que hoje, merecidamente, desfruta.
Essa “síndrome do branco salvador” é não o único, mas talvez o maior dos males que Air: A História por trás do Logo tenta disfarçar, sem muito efeito. Affleck, enquanto realizador, se sai melhor nas passagens cômicas – algumas delas estreladas por ele mesmo – ao passo que nos momentos de maior tensão esse sentimento de dúvida ou conflito nunca chega a se instalar, uma vez que o desfecho é mais do que antecipado – e notoriamente conhecido. A decisão de esconder o homem do qual estão todos falando – Michael Jordan, quanto em cena, é visto apenas de costas ou até o pescoço, sem nunca mostrar o rosto (que é do ator Damian Young) também é problemática, e acaba funcionando mais como uma distração do que o acerto que se esperava. Por outro lado, que se faça justiça: Viola Davis, mesmo em duas ou três sequências certeiras, confirma seu status de um dos maiores nomes da Hollywood atual – seu olhar diz mais que muito discurso redundante – enquanto que Chris Messina, como o agente de Jordan, é quem literalmente rouba a cena a cada aparição, indo da selvageria à ganância em instantes, sem nunca perder de vista um carisma superlativo. Enfim, ao invés de investigar decisões questionáveis e as possíveis repercussões de atos controversos, Affleck e seus amigos optaram por fazer uma grande peça publicitária que parece ter como única finalidade render ainda mais dividendos a uma empreitada que há décadas tem se mostrado mais do que acertada. Essa, sim, é a verdadeira história por trás de tamanha encenação.
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Excelente filme